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CULTURA

Se o apartamento falasse

Transformado em estúdio, o aparatamento do cantor e compositor Cícero foi o cenário das gravações do seu disco solo.

Publicado em 23/06/2012 às 6:00


A 'mitologia' que há em torno de Canções de Apartamento (Deckdisc, R$ 19,90), disco de estreia de Cícero, todo mundo mais ou menos conhece.

Em 2008, então vocalista da banda Alice, o jovem viajou para Nova York com o baixista Rodrigo Abud e a missão de dar um upgrade nos equipamentos da turma, que acabara de gravar seu segundo CD, Ruído (2007).

Ao voltarem, em 2009, já não existia mais banda e tudo o que sobrava da viagem eram caixas, ainda empacotadas, com instrumentos e mesas de som.

Estocada no apartamento de Cícero no bairro de Santa Cruz (zona oeste do Rio de Janeiro), a parafernália teve um destino feliz quando o compositor montou um estúdio debaixo do seu próprio teto e começou a gravar as canções deste disco solo.

Elas foram parar na internet, uma república de onde Cícero, recuperando a ancestralidade de seu sobrenome, dificilmente será expulso pela apologia que faz ao que poderia ser chamada de 'self made music'.

"Sou um entusiasta da música feita fora do estúdio", conta Cícero, que não pretende gravar longe do seu apartamento (agora no bairro do Botafogo) tão cedo. "Se o escritor escreve seu livro na mesa de casa e o artista plástico pinta seu quadro no ateliê na varanda, por que que eu haveria de me mudar?", indaga o rapaz.

Uma espécie de meca ou museu de suas influências, o apartamento foi o cenário não apenas para as gravações das 10 faixas do CD como também inspirou a atmosfera de suas composições, que dialogam com referências como Tom Jobim, homenageado no repertório e no projeto gráfico da capa (Tom aparece no LP com o nome de Cícero).

"Não consigo me lembrar da primeira vez que ouvi Tom Jobim. A bossa nova está na essência do Rio de Janeiro.Foi a cidade que me colocou no caminho e me fez esbarrar com ele", explica o letrista que, na balada 'Pelo interfone', faz um interlúdio com 'Dindi', um dos mais famosos standarts do maestro.

'BICÃO'
Músico que se arrisca nas cordas, sopros e até no fole da sanfona, Cícero não se considera um profissional de nenhum instrumento: "Não me dedico a estudar profundamente nenhum instrumento. Isso é importante dizer porque tem gente que faz isso e muito bem. Eles merecem este crédito, eu não. Eu sou um bicão".

O trânsito entre violões, guitarras, flautas, clarinetes e acordeon se dá, segundo ele, por uma vontade de entender o 'sentimento' que há por trás da melodia de cada um dos instrumentos.

"Eu conheço as notas musicais e vou tentando encontrá-las.

Gosto de sacar qual é o sentimento particular de cada coisa que estou tocando".

O garoto que tentava fazer o mundo caber dentro do seu apartamento com uma pilha de quadros, vinis e livros de poesia, emerge dele agora como uma figura meio kitsch, devolvendo ao mundo um talento promissor.

Imagem

Jornal da Paraíba

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