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VIDA URBANA

24 municípios da Paraíba ainda vivem livres de homicídios

Tranquilidade continua no cotidiano dos moradores de 24 municípios. Faz 4 anos que neles não se registram assassinatos.

Publicado em 08/11/2015 às 16:00

Sentado em uma cadeira de balanço, à sombra de uma árvore, seu Samuel ouve rádio enquanto pastora a criação de bodes e conversa com os amigos na rua. Ali ele passa a maior parte do dia, sem preocupações, sem medo. Para seu Samuel, lembrar, por exemplo, do último assassinato que aconteceu na cidade em que mora, é um exercício de memória. “Eu sei que teve, mas faz tanto tempo que não consigo lembrar”, conta o cidadão de Riachão do Bacamarte. O motivo para o esquecimento de seu Samuel, entretanto, não é a pouca memória, e sim o fato de que a cidade, há mais de quatro anos, não registra um único homicídio em seus limites geográficos.

Distante 105 quilômetros de João Pessoa e com uma população de pouco mais de 4.470 habitantes, Riachão do Bacamarte faz parte de uma estatística positiva na Paraíba: é um dos 24 municípios que não tiveram assassinatos nos últimos quatro anos, o que corresponde a apenas 10,7% do total de cidades do Estado. Os dados são do relatório de indicadores criminais do programa Paraíba Unida pela Paz, da Secretaria de Segurança e Defesa Social do Estado (Seds). O principal motivo para essa tranquilidade é o tamanho das cidades. Somada, a população das 24 não chega a 100 mil pessoas. A maior delas é Jericó, que tem 7.717 habitantes. “Eu nasci e me criei aqui, na rua só passa conhecido, gente da família. Quando a gente vê alguém estranho, já avisa logo à polícia”, relatou Samuel Félix da Silva, 37 anos.

"A gente se conhece e sabe quando ocorre alguma coisa"

No Sertão do Estado, Jericó tem a maior população entre as cidades que não registram homicídios. Lá, a renda não é alta, 33% da população vive com rendimento domiciliar per capita inferior a R$ 140, mas todos se conhecem pelo nome. “A cidade é tranquila, a gente ainda vive em paz. A única violência que sabemos é quando tem assalto a banco, casa lotérica, mas isso é gente de fora que vem fazer aqui. Porque a gente conhece todo mundo e sabe logo quando acontece alguma coisa”, afirmou a funcionária pública Joelma Keyla.

“As cidades menores tendem a ter poucos homicídios, há forte correlação entre assassinatos e tamanho da população, e isso pode estar ligado a vários fatores, dentre eles a posição geográfica e a falta de atrativo para o tráfico. Contudo, não ter homicídios não quer dizer que não haja crimes. Podem haver problemas de subnotificação ou registro em local de ocorrência. Em 2013, por exemplo, 22 homicídios tinham município ignorado”, avaliou o cientista político José Maria Nóbrega.

No entanto, o zero índice de homicídios nem sempre é sinônimo de tranquilidade, rebate o prefeito do município de Cabaceiras, Luiz Aires Cavalcante. Desde 2012 não há registro de assassinatos na cidade que tem cerca de 5.500 habitantes, mas o mesmo não se pode dizer das ocorrências de roubos e furtos. “Esses pequenos delitos têm aumentado, sempre acontecem. Apesar de fazermos um trabalho intenso e colaborarmos com a polícia”, afirma.

Na avaliação do delegado geral da Polícia Civil na Paraíba, João Alves, a explicação para a inexistência de homicídios nessas cidades é uma série de fatores, sendo um deles a convivência e interação entre os moradores. Isso aliado ao monitoramento diário das estatísticas dos registros de violência e ao trabalho policial e de inteligência.

“Todo um conjunto de características e fatores podem ser avaliados. A fonte de renda e ocupação das pessoas, a taxa de empregos. Não é o caso somente de posição geográfica, basta observar o exemplo de Riachão do Bacamarte, por onde passa uma BR federal. Eu digo sempre que os locais que diminuíram a criminalidade, ou pelo menos controlaram é porque investiram em educação", detalhou. Já para o coronel Euller Chaves, comandante geral da Polícia Militar da Paraíba é preciso ‘despolicializar’ a problemática da violência. Para ele, a redução dos índices tem ocorrido sem aumento considerável de policiamento, mas sim de estratégias de inteligência. “Não é aumentar efetivo de policiais que reduz a violência. O que reduz a criminalidade é estratégia de combate ao crime”, frisou.

Tacima ficou 3 anos sem assassinatos

Foram três anos de tranquilidade até que, em fevereiro deste ano, os 10.822 habitantes de Tacima, no Curimataú, divisa com Rio Grande do Norte, presenciaram algo que há muito tempo não acontecia na cidade: um assassinato.

O município era um dos 24 em todo o Estado que ainda não havia registrado crimes desse tipo desde 2013. Neste ano, foram dois. “Foram por motivos banais, a cidade é tranquila, esses homicídios não refletem a realidade do local”, defendeu o agente da Polícia Civil de Araruna, Marcelo de Morais, que atende ao município de Tacima.

Ele conta que o primeiro crime foi passional, pois o acusado tinha ciúmes da esposa com a vítima. José Aguiar da Silva Pedro, 47 anos, estava sentado na calçada da sua residência quando o acusado chegou com uma faca em punho perguntando se ele não era “arrochado” e desferiu vários golpes de faca no pescoço da vítima, que veio a óbito no local. A polícia prendeu o autor do delito.

No outro, que aconteceu em abril, Ednaldo Cordeiro, de 33 anos, foi morto por conta de rixas, pois tinha muitos inimigos na região. Segundo o agente, o homicídio na verdade aconteceu na divisa com o estado do Rio Grande do Norte, mas o corpo foi encontrado do lado paraibano.

“Surpreendeu a todos os dois casos em tão pouco tempo, mas a cidade ficou mais curiosa do que assustada”, disse o agente, que costuma registrar apenas pequenos furtos e brigas entre casais.
Mesmo os casos sendo pontuais, a rotina dos moradores tem sido alterada nos últimos anos. “O que acontece é que a droga chegou. É uma peste em todo canto. Isso acaba com as crianças e a juventude”, disse o aposentado Francisco Gomes, 70 anos.

Maria do Carmo, dona de um mercadinho na cidade, tem posicionamento semelhante ao do aposentado: “A gente vive tranquilo aqui, não tem essa violência que a gente vê na televisão, mas também não é mais como antigamente.”

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Jornal da Paraíba

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