CULTURA
Céu viaja em road disco
Cantora Céu, lança seu terceiro disco, e busca traduzir a experiência de uma vida na estrada.
Publicado em 15/02/2012 às 6:30
Céu é uma cantora que trilha seu caminho sem pressa, apreciando a paisagem. Da nova geração de cantoras brasileiras, se consolida, quase que sozinha, em um tipo de som urbano, moderno, que embala, com trip-hop, referências do samba, da ciranda e do reggae, conduzidas por seu canto malemolente.
Sete anos depois de estrear em CD, a cantora paulista chega ao terceiro disco ratificando o caminho que resolveu trilhar com o antecessor, Vagarosa (2009), já que Caravana Sereia Bloom (Universal, R$ 29,90) aponta para uma carreira que não é a da música popular brasileira do samba, do axé ou do forró, mas de uma world music sofisticada e contemporânea, repleta de climas, texturas e um vocal quase sussurrado.
O caminho que Céu toma para esta sonoridade passa aqui pelo Nordeste. O título, diz a cantora, é uma homenagem à Caravana Rolidai, do filme Bye Bye Brasil (1979), quando ela insere o nome ‘Caravana’ junto a títulos de faixas do CD (a vinheta ‘Sereia’ e a canção ‘Streets bloom’, do baiano Lucas Santtana).
“Como esse disco tem o tema da estrada, ele acaba formando muitas imagens, é muito cinematográfico. Tanto é que eu acabei me aproximando dessa estética, que o videoclipe (da música ‘Retrovisor’, primeira faixa de trabalho do CD) foi todo feito em película, com jeito de cinema”, comenta Céu, em entrevista, por telefone.
“Se você começar a observar, todas as faixas têm uma ligação com a estrada”, segue explicando, com exemplos: "‘Contravento’ tem uma letra que fala de poeira batendo na cara, quando a gente pega carona numa caminhonete. Já ‘Asfalto e sol’ fala sobre ir e levar consigo as coisas que te dão combustível...”
No som, predomina a estética kitsch, com teclados e guitarras que evocam a boa música brega dos anos 70 (‘Falta de ar’, ‘Retrovisor’, ‘Baile de ilusão’), azeitada com doses de psicodelia, rock e bases eletrônicas. Mas o repertório também abre espaço para o namoro cada vez mais chegado de Céu pelos ritmos da Jamaica, como o reggae do cover ‘You won't regret it’ (Lloyd & Glen) e o rocksteady de ‘Asfalto e sal’.
Completa o time o trip-hop grudento da citada ‘Streets bloom’ e o som pop-cibernético com cara de Nação Zumbi de ‘Chegar em mim’, de autoria de Jorge DuPeixe.
Céu concorda que, involuntariamente, Caravana Sereia Bloom poderia ser a trilha-sonora do filme Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo (2009), de Marcelo Gomes e Karim Aïnouz. “É uma referência 100%”, confirma. “As pessoas falam que parece O Céu de Suely (também de Karim Aïnouz, lançado três anos antes), mas eu acho que o Viajo... parece muito mais”.
O ‘road disco’, afirma Céu, procura traduzir a experiência de uma vida na estrada, e tem muito do sotaque nordestino em sua sonoridade.
“Eu tenho muita admiração pelo Nordeste. Acho que, musicalmente, é um terreno muito fértil, assim como o Norte", comenta. "Eu tava ouvindo muito essa coisa de como o Brasil assimila e se funde com a música da América Latina, como a origem da lambada, das rumbias", acrescenta.
Essa viagem sonora levou Céu às aparelhagens de Belém do Pará, que segundo ela tem tudo a ver com o som da Jamaica que ela tanto aprecia. "O som foi me levando para esse lugar, que era o que eu estava ouvindo, curtindo, tipo Mestre Vieira, Guitarrada, os bregas... e é tudo admiração mesmo, de ver que o Brasil tem esse outro viés, que é muito fértil!”
Pilotado pelo marido e produtor, Gui Amabis, e na companhia de integrantes da Nação Zumbi (Pupilo, Dengue e Lúcio Maia, com quem Céu tem trabalhado com frequência), Rica Amabis, Thiago França, Fernando Catatau e Curumim, entre outros, Céu compõem um disco de música imagético.
Mas o caronista especial dessa viagem é mesmo o pai da cantora. Quando jovem, o então virtuosi Edgard Poças era um às do violão, mas um acidente o impediu de dar sequência à carreira de violonista. Passou a se dedicar à publicidade, aos jingles e a compor músicas de sucesso para A Turma do Balão Mágico, por exemplo.
Aqui, ele retoma o violão para brindar a filha com um tocante dedilhado na versão de ‘O Palhaço’, famosa na voz de Nelson Cavaquinho (1911-1986). “Foi muito emocionante chamá-lo para tocar violão”, conta Céu. “E ele entendeu completamente quando eu disse que queria um clima felliniano. Daí ele transformou um clássico do samba numa valsa que eu achei super bonita e pontual”.
Com Caravana Sereia Bloom na bagagem, Céu embarca para a Europa, onde se apresenta entre março e abril. Em maio e junho, excursiona pelo Brasil, mas as datas ainda não estão fechadas.
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