COTIDIANO
Justiça decide que bebês têm direitos antes mesmo de nascer
Para beneficiar mulheres que são abandonadas pelos companheiros durante a gestação, foi criada uma lei, que disciplina o direito da mulher grávida.
Publicado em 05/04/2009 às 8:44 | Atualizado em 26/08/2021 às 23:40
Jacqueline Santos
Do Jornal da Paraíba
A vendedora Niédja Caroline Silva soube que estava grávida quando namorava o ex-companheiro. Na época ela tinha apenas 18 anos, não tinha emprego e era sustentada pelo salário da mãe, com quem mora até hoje. A notícia foi recebida com surpresa pelo pai da criança que teve que ser pressionado para cobrir as despesas do pequeno Gabriel, mesmo sem o bebê ter nascido. Há três anos, idade do menino, a jovem não tinha ideia que surgiria uma legislação para garantir uma pensão para o filho ainda na barriga da mãe. Nesse período, são muitas as despesas com enxoval, berço e alimentação para a mãe, para que a criança nasça saudável. Também são elevados os custos com exames médicos.
Para beneficiar as mulheres que são abandonadas pelos companheiros durante a gestação, foi criada uma lei, sancionada pelo presidente da República em novembro do ano passado, que disciplina o direito da mulher grávida. A Paraíba já conta com o primeiro caso de uma mãe contemplada com a chamada lei dos alimentos gravídicos. Segundo o juiz da 2ª Vara da Família de João Pessoa, Sivanildo Torres Ferreira, que concedeu liminar garantindo o direito de pensão alimentícia para o feto, a recente legislação prevê que a gestante, desde que comprove a paternidade, passe a receber valores suficientes para cobrir despesas adicionais no período da gravidez e que sejam decorrentes da gestação, da concepção ao parto.
Conforme o texto da lei, a mãe tem direito à alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais procedimentos preventivos e terapêuticos de acordo com orientação médica. O segundo artigo da Lei diz que o juiz pode adicionar outros ítens, caso seja necessário de acordo com o caso. “O pai de Gabriel, só veio aceitar a gravidez após quatro meses, quando a barriga estava crescendo. Mas ele acabou ajudando financeiramente e até hoje, mesmo sem pagar pensão, o meu filho recebe alimentação, roupa e remédio dele”, diz a jovem de 22 anos.
De acordo com a lei, a gestante que comprovar a gravidez através de laudo médico e provar, mesmo que apenas com indícios, a paternidade da criança, indicando as condições nas quais se deu a concepção, poderá receber pensão alimentícia para que o provável pai contribua com suas necessidades, de acordo com as possibilidades dele. “Como prova são aceitas correspondências virtuais, cartas e outros meios que comprovem que o homem apontado pela requerente é mesmo o genitor da criança. No caso dessa mãe, que acreditamos ser o primeira da Paraíba, foi atestado até com e-mail, onde a mulher dizia que estava grávida e em nenhum momento o pai se recusou ou negou a possibilidade”, detalha o juiz.
Sivanildo analisa a decisão como uma importante conquista para as mulheres e avisa que o benefício tem o objetivo de promover a saúde do bebê. Ele acredita que a lei vai inibir a atitude de muitos jovens, que tendem a abandonar as namoradas quando sabem da gravidez. Muitas mulheres são abandonadas antes ou até mesmo com a constatação da gravidez e precisam assumir todas as despesas para manter uma gestação saudável para a criança.
Cartas e fotos podem ser usadas como provas
O juiz da 2ª Vara da Família de João Pessoa, Sivanildo Torres Ferreira, disse que o processo pode durar até 60 dias e a gestante passa a receber o benefício, a partir do resultado da ação, caso seja favorável. A mulher grávida é ouvida, juntamente com testemunhas e o suposto pai, no entanto, as provas consideradas como fortes indícios pelo jurista são documentos escritos, como cartas, bilhetes e até mesmo fotos. Até agora, o processo judicial impetrado na Paraíba não foi contestado pelo pai da criança e o genitor já está pagando a pensão do filho. O valor do auxílio varia de acordo com as condições do pai, sendo levada em consideração também as necessidades alegadas pela mãe.
O advogado Alexandre Soares de Melo explicou que a obrigação de prestar alimentos significa cobrir as despesas não apenas com alimentação, mas também com vestuário, habitação, educação, assistência médica e de todos os itens necessários “para atender às necessidades da vida”. “Em se tratando de criança, abrange também o que for preciso para sua instrução. Os alimentos são prestações para satisfação das necessidades vitais de quem não pode provê-las por si só. É portanto nesse contexto que os chamados alimentos gravídicos estão inseridos”, detalha.
Para o especialista, a lei 11.804/08, dos Alimentos Gravídicos, vai dirimir as dúvidas quanto aos direitos da mãe gestante, já que os alimentos gravídicos já vinham sendo concedidos por alguns juízes do país, que entendiam ser necessária a concessão de alimentos ao nascituro. A partir da vigência da nova legislação, a mãe gestante que sentir necessário pode ajuizar uma ação judicial reivindicando alimentos (sentido amplo) para o período gestacional. O benefício, após o nascimento do bebê, pode ser convertido na forma de alimentos provisórios. “A regra era de que os alimentos devidos pelos pais em favor dos filhos só podiam ser cobrados após o nascimento da criança. Com o advento da lei, a cobrança pode ser feita durante a gestação”, lembra.
Quanto à possibilidade de pedidos infundados, o juiz Sivanildo Torres garante que a liminar pode ser cancelada caso o homem acusado conseguir comprovar a não paternidade da criança, solicitando inclusive o ressarcimento das quantias pagas durante a vigência da medida.
Leia mais na edição deste domingo do Jornal da Paraíba.
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