Os delírios de Nelson

Doroteia do grupo Panaceia Delirante encerra neste sábado (16) o Projeto Teatro Piollin em João Pessoa.

Não foi à toa que o Projeto Teatro Piollin escolheu Doroteia para encerrar sua programação em João Pessoa.

Foi com uma peça de Nelson Rodrigues (A Serpente, da Cia. Dezequilibrados) que o projeto teve início no ano passado, data do centenário do dramaturgo.

Ao longo dos sete meses de agenda, o ‘anjo pornográfico’ teve ainda outro texto adptado: Viúva, Porém Honesta, montagem da Cia. Magiluth que tem uma relação muito próxima com a encenação que as baianas da Panaceia Delirante apresentam ao público hoje e amanhã, a partir das 20h, no Centro Cultural Piollin.

Ambas foram selecionadas no edital da Fundação Nacional de Artes (Funarte) que repassou toda a obra do pernambucano em sua segunda casa: o Rio de Janeiro. Ambas também utilizam um procedimento cênico similar: o rodízio personagens entre o elenco.

Hebe Alves, professora da Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e diretora de Doroteia, explica o procedimento: "O rodízio é fruto de uma pesquisa que eu realizo desde os anos 1990 que envolve a noção de espaço em cena.

Cada atriz tem um roteiro de seu ‘território’ no palco e, quando estes territórios se cruzam, elas trocam de personagem".

Segundo a diretora, que estudou Nelson em seu doutorado e já trabalhou em adaptações de Valsa nº 6 e A Falecida, todo o elenco da Panaceia Delirante é feminino.

O fato de estrear na Paraíba no mês em que se comemora o Dia Internacional da Mulher é, portanto, outra feliz coincidência.

"Contar a história de Doroteia por um grupo tão jovem e formado inteiramente por mulheres é algo especial", afirma Hebe Alves.

"Gosto, particularmente, da maneira distanciada como Nelson coloca a realidade em suas peças, o jeito como vivemos na cidade. Ele faz explodir no público valores que são encobertos pela sociedade", diz ela.

Definida por Nelson Rodrigues como uma "farsa irresponsável em três atos", Doroteia foi escrita em 1949 e debutou no teatro no ano seguinte, sob a direção do polonês Zbigniew Ziembinski (1908-1978).

A história das três viúvas beatas, refratárias ao sexo, que recebem em sua casa a personagem-título, uma ex-prostituta que abandonou as ruas após a morte do filho, pertence à fase da trajetória de Nelson Rodrigues que ele definia como "desagradável".

Precedida por Álbum de Família (1946), Anjo Negro (1947) e Senhora dos Afogados (1947), marca a antecipação de Nelson em relação a liberdades estéticas que iriam nortear o Teatro de Vanguarda e o Teatro do Absurdo.

A abordagem de Hebe Alves é influenciada por investigações paralelas que a pesquisadora conduz na UFBA com as atrizes, centradas, por exemplo, na presença do balé na dramaturgia do espanhol Federico García Lorca (1898-1936).

‘UP LEON’ EM CAMPINA GRANDE

Depois de curta passagem por João Pessoa, a Cia. Up Leon chega hoje a Campina Grande. A trupe circense, que há mais de 20 anos circula por parques europeus, apresenta seus dois espetáculos em turnê nordestina no Teatro Severino Cabral: Os Sete Pecados Capitais e Faroeste Circo Show.

O infantil Faroeste Circo Show terá sessões hoje e amanhã, às 17h, enquanto Os Sete Pecados Capitais, recomendado para maiores de 14 anos, será visto nos mesmos dias, a partir das 20h.

De Campina Grande a Up Leon parte para Natal e Mossoró, no Rio Grande do Norte.

SOUSA RECEBE FESTIVAL DE TEATRO

Outro grupo teatral baiano que desembarca neste fim de semana na Paraíba é a Cia. Ateliê Voador, destaque na abertura do 7º Festival das Artes Cênicas, em Sousa (no Sertão).

O evento, promovido no Centro Cultural Banco do Nordeste (CCBN), estende-se de hoje até o dia 26 com programação diária de espetáculos.

Neste sábado, o festival começa às 17h, com um cortejo que percorrerá as ruas do centro da cidade sertaneja. Às 19h, já no CCBN, o Ateliê Voador sobe ao palco para a apresentação de Salmo 91, adaptação do livro Estação Carandiru (1999), de Dráuzio Varella, escrita por Dib Carneiro Neto e dirigida por Djalma Thürler.

Segundo Duda Woyda, ator e produtor do espetáculo, a adaptação teatral tem alguns pontos de ligação com a adaptação cinematográfica, dirigida por Hector Babenco (Pixote) em 2003.

Woyda, por exemplo, interpreta dois personagens: Charuto, um detento que foi preso por porte de drogas que teme ser picado por um rato, e o evangélico que, no longa-metragem, é vivido por Milhem Cortaz (Assalto do Banco Central).

"O elenco fez um trabalho de criação individual, já que cada ator interpreta dois personagens e o texto está estruturado em dez monólogos", explica o ator, um dos cinco em cena.

Amanhã, as peças em cartaz no festival são Torturas de um Coração, do Grupo Teatro Oficia (de Sousa), às 17h, e Quincas, do Grupo Osfodidário, às 19h.

A agenda segue na segunda-feira, com única apresentação da peça Pela Janela, do Grupo Caixa Cênica, às 19h. A programação completa do 7º Festival de Artes Cênicas, que ocorre simultaneamente no Ceará, pode ser acessada no site.