Embora haja divergências, Brasil comemora cem anos de Grande Otelo

Proprio ator não sabia direito a data em que veio ao mundo. Daqui a dois anos deve acontecer a segunda comemoração de centenário.

Neste domingo é comemorado o primeiro centenário de nascimento de Grande Otelo. Independente de ter sido concebido pela segunda vez no final dos anos 1960 pelo ventre do clássico cinematográfico Macunaíma, com a paternidade dupla do diretor Joaquim Pedro de Andrade (1932-1988) e do escritor modernista Mário de Andrade (1893-1945), o próprio ator não sabia a data em que veio ao mundo.
Sua segunda comemoração de centenário acontecerá daqui a 2 anos, segundo o livro Grande Otelo – Uma Biografia (Editora 34), de Sérgio Cabral. Inclusive o autor revela os números do livro de registo de batismo da paróquia Nossa Senhora do Carmo, em Uberlândia (MG), onde inclui a data de nascimento: 18 de outubro de 1917.

Seria uma conjectura vinda da imaginação do artista ou – como teoriza o biógrafo – o aumento da sua idade seria para obter trabalho reservado apenas para maiores de idade?

O engraçado – assim como a trajetória do ator nos filmes estrelados com Oscarito (1906-1970), nos palcos do Teatro de Revista e nos programas humorísticos – é que até seu nome na pia batismal sofreu alterações: nasceu Sebastião Bernardo Silva, mas trocou para Sebastião Bernardes de Souza Prata. Virou Bernardes em homenagem ao ex-presidente Artur Bernardes (1875-1955); o Souza pegou do sobrenome da mãe, Maria Abadia; e o Prata veio em virtude da família dos patrões do pai.

Inventado ou não, haverá uma série de homenagens ao artista no país por causa do centenário ‘incompleto’. Dentre eles, o Canal Brasil está exibindo desde a semana passada longas-metragens protagonizados por Grande Otelo, sempre às 19h. É de Chuá (1958) será apresentado amanhã; Pé na Tábua (1958), Um Candango na Belacap (1961), Vai Que É Mole (1960) e Os Cosmonautas (1962) completam a semana.

Já em São Paulo acontece até o dia 21 a mostra O Maior Ator do Brasil – 100 Anos de Grande Othelo, no Caixa Belas Artes, onde serão exibidos filmes como O Assalto ao Trem Pagador (1962), o já citado Macunaíma (1969) e Nem Tudo É Verdade (1985), este último sobre a visita do cineasta Orson Welles (1915-1985) ao Brasil em 1942, para rodar o inacabado It’s All True.

No começo do ano, a Escola de Samba Acadêmicos de Santa Cruz desfilou no Grupo de Acesso carioca homenageando o mineirinho com o samba-enredo ‘O pequeno menino que se tornou um Grande Otelo’.

Em João Pessoa, dentro do projeto mensal Clássica do CinEspaço, entrará em cartaz no mês de dezembro a cópia restaurada de Fitzcarraldo (1982), filme do alemão Werner Herzog sobre o transporte de um enorme barco a vapor por terra, em uma região montanhosa da floresta amazônica para desbravar uma nova rota de extração de borracha.

Encabeçado por Klaus Kinski (Nosferatu – O Vampiro da Noite) e Claudia Cardinale (Era uma Vez no Oeste), o longa conta com os brasileiros José Lewgoy, Milton Nascimento e Grande Otelo, que descreveu sua experiência com o diretor como “horrível”. Durante as filmagens, Otelo resolveu que iria fazer a cena falando espanhol, mesmo depois de ter recebido o script em inglês. Isso irritou o protagonista Klaus Kinski, que desconhecia o idioma e terminou se retirando do set.

Até o "próximo centenário", daqui a exatos dois anos, uma única certeza que dificilmente poderia ser inventada: Grande Otelo morreu no dia 26 de novembro de 1993. Se foi aos 78 anos ou aos 76? Isso não tira o brilho da sua estrela.

Meia dúzia de pequenas curiosidades sobre o Grande Otelo.

Sebastião Bernardes de Souza Prata nasceu em Uberlândia, Minas Gerais, mas na época a cidade ainda se chamava São Pedro de Uberabinha;  

Com 1,50 metros de altura, o ator recebeu o apelido de "The Great Othelo" pelo amigo Jardel Jércolis (1894-1944), um dos pioneiros do Teatro de Revista no Brasil.;

Marcado por tragédias, Grande Otelo perdeu o pai, Francisco Bernardo da Costa, assassinado a facadas, além da sua mãe, Maria Abadia de Souza, ser alcoólatra. Sua primeira mulher assassinou com veneno o filho adotivo de 6 anos de idade e se suicidou;

"Eu tinha uns 7 anos. Era o ’Bastiãozinho’, usando um vestido comprido e com um travesseiro no bumbum, e rebolando de braços com o palhaço. Aí todo mundo riu, todo mundo achou graça", chegou a descrever o próprio artista na sua estreia nos picadeiros de circo;

Foi adotado em duas ocasiões: a primeira pela diretora de companhia de teatro Abigail Parecis, mas, insatisfeito, passou um período sob a tutela do Juizado de Menores. Em seguida, foi adotado pela família de Antônio de Queiroz, um político influente da época;

Grande Otelo participou de 118 filmes, onde 17 deles foram ao lado de Oscarito. Seu último longa foi Boca de Ouro (1990), de Walter Avancini.