‘A freira’ promete horror e entrega uma série de pequenos sustos

Spin-off de ‘Invocação do mal’ que se vendeu como ‘o mais assustador da franquia’ decepciona.

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Taissa Farmiga e a dita-cuja ‘religiosa’ em A freira.

RESENHA DA REDAÇÃOA FREIRA (EUA, 2018, 96 min.)
Direção: Corin Hardy
Elenco: Demián Bichir, Taissa Farmiga, Jonas Bloquet
★★☆☆☆

Chega aos cinemas da Paraíba nesta quinta-feira (6) o terror sobrenatural A freira. O longa, que faz parte do ‘universo compartilhado’ composto pelos quatro filmes de Invocação do Mal e Anabelle, foi divulgado pelos produtores como o episódio ‘mais assustador’ da franquia. Uma grande promessa – mas, quando a promessa é grande, até santo desconfia.

O filme se passa em um convento na Romênia, no ano de 1952. O suicídio de uma das freiras leva o Vaticano a enviar o padre Burke (Demián Bichir), especialista em fenômenos sobrenaturais, para investigar uma suposta ação de forças paranormais no local. Burke é acompanhado pela noviça Irene (Taissa Farmiga), que teve uma série de visões do além quando criança e por algum motivo não explicado é considerada importante para a missão.

A freira consegue consegue, de fato, assustar no seu primeiro ato; isso se deve principalmente à aura de mistério que cerca a vila nas proximidades do convento e o convento em si. Ambos os locais são filmados pelo diretor, Corin Hardy, em tons de preto e cinza, e há uma aproximação com filmes de horror mais antigos devido à utilização frequente de uma névoa que paira sobre o solo e à exploração de efeitos de sombra (aqui, merece palmas também a direção de fotografia de Maxime Alexandre). Os poucos moradores da vila que conhecemos são frígidos e assustados e, por identificação, começamos a temer a suposta entidade que habita o convento.

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A construção do espaço do convento em si também é efetiva em provocar incômodo. Assim que chegam ao castelo, padre Burke e irmã Irene se deparam com uma poça de sangue que indica o local onde foi encontrado o corpo da freira morta; o suicídio ocorrera dias atrás, mas o sangue ainda estava fresco e parecia jorrar do chão. A madre superiora do convento é igualmente sinistra: coberta por um hábito negro da cabeça aos pés, ela fala pausada e roucamente.

São esses pequenos indícios de anormalidade, esses signos de estranhamento, que efetivamente constroem a atmosfera sinistra e arrepiante que prevalece no primeiro terço de A freira. Acertada, também, é a decisão de, em certas cenas, retratar o espírito maligno de forma silenciosa e sem alardes: em um movimento panorâmico, a câmera engloba outra parte do cenário – e lá está a figura espectral estacionada. A ótima atuação dos protagonistas e a trilha sonora de Abel Korzeniowski contribuem para o primor que é o início da projeção. É este o horror que se esperava: o que provoca desconfiança e desconforto no espectador, e não aquelas estratégias fáceis de sustos, gritos repentinos e imagens escatológicas.

É uma pena, então, que essas virtudes logo sejam completamente descartadas em favor dos mesmos jump scares de sempre e de figuras monstruosas que nada assustam. A imagem da freira delineada na periferia da tela é extremamente efetiva em gerar arrepios e fazer o público dar uma espiada amedrontada por sobre o ombro; entretanto, quando o demônio se revela um ser feioso de boca escancarada repleta de dentes e de uma língua avantajada à la Venom, a aura de horror que permeava a exibição se perde.

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Cena de A freira.

Esse declínio imagético é acompanhado, também, por um descontrole narrativo do roteiro escrito por Gary Dauberman. A partir do momento em que os protagonistas entram no convento, começa uma série de eventos que culminam sempre com uma aparição grotesca do demônio. É possível até esquematizar: o padre lê sobre o espírito/A Feira aparece com algum susto; Irene escuta um barulho/a Freira aparece mostrando os dentes; Irene reza no santuário/a imagem da Freira no espelho grita e quebra o vidro, etc. O filme logo cai num ciclo repetitivo de eventos irrelevantes/aparições escandalosas, tornando-se chato e previsível.

Quando a narrativa finalmente avança (já no final), Padre Burke e irmã Irene descobrem que o demônio da Freira só pode ser derrotado por uma certa relíquia que está escondida no convento, e o tom de horror sobrenatural é totalmente abandonado quando o longa assume ares totalmente fantasiosos e destoantes de sua premissa. Pra quem pretendia aterrorizar o público, A freira se torna um ótimo Tomb Raider.

É, assim, de se lamentar um início tão promissor culminar em um desfecho tão esquecível e clichê. A resolução do conflito com o espírito antagonista é rápido, fácil demais e anticlimático. A promessa de A freira não se cumpre: se quiser se assustar, é melhor ir rever Invocação do mal.