CULTURA
Jornal da Paraíba confere despedida da turnê do U2 na América do Sul
Editor André Cananéa escreve sobre a experiência do último show da turnê 360º em São Paulo, ocorrido na última quarta-feira (13) no estádio do Morumbi.
Publicado em 15/04/2011 às 10:29
André Cananéa
De São Paulo
Quem foi ao estádio do Morumbi na noite da última quarta-feira, assistiu ao maior espetáculo da Terra! Hoje, a turnê ‘U2 360º’ é a mais lucrativa de todos os tempos, recorde estabelecido pela banda irlandesa com a apresentação de domingo passado. Passa do meio bilhão de dólares, faturados com uma estrutura de cair o queixo, na qual se sobressaem uma nave de 50 metros de altura, a fantástica iluminação e um telão retrátil de 360º.
A despedida da turnê mais sofisticada do U2 não só do Brasil, como da América do Sul (o grupo também passou pelo Chile e Argentina), acabou sendo transmitida para todo o continente, via web radio. Portanto, naquela noite, Bono não se dirigiu somente ao Brasil, mas a toda América do Sul.
Mestre na arte de fazer o social, o vocalista fez o afago: “América do Sul, esta grande mãe”, e emendou brincando: “Esta noite estamos ao vivo para toda América do Sul via rádio e internet. Esse show ficará para sempre. Façam download, mas não digam ao nosso empresário”.
Essa foi a senha para dizer que a apresentação daquela noite seria especial. Especial, mas dentro do roteiro. Em, aproximadamente, 2h30 de show, o grupo manteve praticamente o repertório das apresentações anteriores. Tudo é muito ensaiadinho: os movimentos de Bono, as troca de olhares entre The Edge, Adam Clayton e Larry Mullen Jr., os passeios pela passarela circular, os discursos, a menina que sobe ao palco para ler um poema...
A exceção ficou por conta de um convidado especial – concessão raramente dada pelo grupo. “Com vocês, ‘São’ Jorge’”, anuncia Bono, e entra no palco Seu Jorge. Junto com o U2, o carioca improvisou uma versão acústica para ‘The model’, da lendária Kraftwerk.
O U2 que se vê atualmente, por mais deslumbrante que seja – e o é – é o do show business. O U2 da contestação, que se deixava levar pela emoção, ficou para trás. Hoje, o discurso de Bono é político e quase mecânico. Ao voltar a homenagear as crianças mortas em Realengo, o vocalista só parece estar sensível porque assim pede o roteiro. É diferente do Bono indignado, explodindo contra o apartheid em Rattle and Hum (1988). Esse U2 ficou para trás.
Mas, claro, como espetáculo, ‘360º’ é sensacional. Primeiro, pela banda. O U2 goza hoje de uma popularidade mundial que só faz páreo a Paul McCartney, Rolling Stones e Madonna. Segundo, eles são ótimos músicos. E você não ouviu U2 até ir ao show deles. Com som impecável, os arranjos das canções que a banda coleciona há três décadas ganham uma vibração do outro mundo.
Aliás, um dos melhores dons do U2 é o de compor hinos instantâneos. No show, isso é muito nítido. ‘I will follow’ e ‘Sunday bloody sunday’, canções com 31 e 33 anos, respectivamente, têm o mesmo impacto de composições recentes, como ‘Beaultiful day’ (2000) e ‘Magnificent’ (2009).
Esses números vêm numa embalagem que emociona, que empolga, e que impressiona. Cada número é um ato, onde a música, a luz, os efeitos e o discurso se combinam com o propósito de cativar o espectador (ao final, Bono grita em portugês: “Sou brasileiro, e não desisto nunca!”). Se você não tem intimidade com o repertório, fica impressionado com um show de rock cinematográfico. Se você é fã, vê o grande show da sua vida.
Da pista, a 20 metros da passarela onde os integrantes do U2 circularam, dava para ver os ídolos de perto, compartilhar a energia dos fãs e acompanhar detalhes da estrutura de 50 metros que comporta o show. Mas da pista, não dava para ter a visão geral do pessoal das cadeiras e arquibancada: a “nave”, em sua plenitude, completamente iluminada, um jogo de luzes verdes e azuis (predominante na primeira metade) e vermelha (na segunda metade) que dão a cara da turnê e impressionam como nenhum outro espetáculo.
Na verdade, ‘360º’ se tornou o melhor show de U2 até agora. Chega quando o grupo está no auge da popularidade, capitaneado pela campanha de um cinquentão Bono rumo ao Prêmio Nobel. Aliado a isso, os irlandeses chegaram a um número de hits tão grande que não cabem em 2h30 de show.
E mais: o ‘360º’ mostrado em São Paulo, embora siga o roteiro do DVD lançado no ano passado (tem passarelas móveis, o telão que sobe, desce e se expande, a jaqueta com lasers vermelhos...), vai muito além.
O U2 preferiu sacrificar algumas músicas do último álbum (No Line on the Horizon, 2009) em detrimento dos antigos hits que a maior parte dos fãs querem ouvir. Assim, entram no set list ‘Even better than the real thing’, a citada ‘I will follow’ e ‘Pride’. É o filé do repertório de 13 álbuns que faz o repertório desse show.
Para a música, o melhor da tecnologia. O conceito vendido pela ‘360º Tour’ é o de uma viagem especial com toques de ficção científica. Da entrada do quarteto no palco, embalado por ‘Space Oddity’, de David Bowie, à combinação de gelo seco, luzes e a expansão do telão retrátil, que lembra Contatos Imediatos do Terceiro Grau, o show conduz o espectador a uma viagem de outro mundo. É por isso que aqueles seus amigos que foram ao show ainda nem botaram o pé no chão. E não vão botar por muito tempo. U2 partiu. E deixou saudade.
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