“AINDA SOMOS CATIVOS! AINDA ESTAMOS ENCARCERADOS NA POBREZA”

"AINDA SOMOS CATIVOS! AINDA ESTAMOS ENCARCERADOS NA POBREZA"

Nesta sexta-feira (20), Dia da Consciência Negra, publico texto da professora Nadia Farias dos Santos.

20 DE NOVEMBRO E O CATIVEIRO SOCIAL

Nadia Farias dos Santos

Todos os anos, no dia 20 de novembro, me deparo com uma enxurrada de postagens sobre “Consciência Negra”, o que, particularmente, acho muito positivo, se levarmos em conta as condições da população negra após os 132 anos de abolição. Fora a proibição do cativeiro, ela nos relegou à própria sorte e a uma sociedade que ainda não se desprendeu das ideologias racistas e reinventa as formas de opressão e de nos manter no cativeiro social.

Ainda somos cativos! Ainda estamos encarcerados na pobreza – 70% das pessoas mais pobre são negras; nas desigualdades sociais, econômicas e educacionais; nas violências que circundam diariamente nossas vidas – balas achadas em corpos negros, feminicídios (66% das mulheres são negras). Num clique rápido na internet podemos, infelizmente, ter acesso a estatísticas de diversos órgãos públicos, privados ou organizações não governamentais e comprovar a realidade à qual a população negra está exposta de forma tão naturalizada, que falar sobre ela, para alguns, vai circular na esfera vazia do “mimimi”.

Temos muito a refletir nesse dia da consciência negra e em todos os outros, principalmente, numa sociedade racista como a nossa e que insiste em desconsiderar as contribuições africanas e afro-brasileiras na sua história e cultura, que branqueia, apaga ou silencia nossa intelectualidade, nossa produção de saberes e se esconde sobre o jargão “somos todos iguais”. De que igualdade falam? Para quem?

Somos todos iguais? Sério? Para crer nessa frase, seria necessário ver isso amplamente refletido na sociedade e em suas diversas instâncias, no âmbito público e privado e na realidade da vida de cada pessoa negra desta nação. E as Marieles, Claúdias, Amarildos…E as vítimas de balas perdidas/achadas… E os milhões de desempregados, no subemprego ou nas atividades informais que ralam para sobreviver nesse país que nos nega oportunidades. “Somos todos iguais” é uma saída rápida e fácil para aqueles que não querem pensar ou se aprofundar no debate sobre as desigualdades que nos assolam em todas as áreas. Somos todos iguais? Pergunta aos jovens negros em busca de emprego. Ou aos que são barrados ao entrar em determinados locais pela cor de sua pele. Ou para os que são constrangidos com acusações e olhares de suspeição de marginalidade ou mesmo agredidos, verbal e fisicamente, por serem considerados inadequados para estarem em determinados locais. Todo negro que tem consciência racial sabe que a sociedade não nos trata como iguais. Basta parar e ouvir suas histórias. Somos iguais no discurso, mas, na prática, é outra coisa. E histórias dessa “igualdade” temos muitas para contar.

O dia 20 de novembro foi instituído no calendário escolar como dia nacional da consciência negra pela Lei 10.639, em 9 de janeiro de 2003, e, no calendário civil, pela Lei  Nº 12.519, em 10 de novembro de 2011, respectivamente nos governos Lula e Dilma Roussef. É um dia para intensificarmos a luta por igualdade e equidade de direitos, acessos, oportunidades para o povo preto. Afinal, preciso respirar! precisamos respirar porque todo dia é dia de luta!

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Nadia Farias dos Santos é integrante do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação, Gênero e Diversidade (Negedi) e do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Neabi), ambos do IFRN. Pedagoga, mestre em ensino (UERN), doutoranda em educação (UFPB) e docente do IFRN, campus Apodi.