Incêndio na Cinemateca Brasileira é mais uma tragédia nacional. Momento é de luto para quem respeita a preservação da memória

Assista a uma cópia restaurada de um filme brasileiro. Um desses mais importantes.

Um Vidas Secas, de Nelson Pereira dos Santos, ou um Deus e o Diabo na Terra do Sol, de Glauber Rocha.

Vá em busca do trabalho de restauração e verifique o quanto foi difícil. Não teria sido possível não fosse uma cópia que estava na Europa, sei lá onde, etc.

Ao final de tudo, constate que o resultado é insatisfatório. E ainda dê graças a todos os santos.

Agora, faça uma outra experiência.

Assista a uma cópia restaurada de um filme americano. Não precisa ser um Cidadão Kane, não. Pode ser um noir B.

Parece que foi realizado ontem.

Sabem a diferença, não sabem?

Memória.

Memória nacional.

Não temos. Não estamos interessados nela. Não investimos nela. Não é importante para quem nos governa.

Não dá votos – costumo dizer.

O incêndio num dos prédios da Cinemateca Brasileira, nesta quinta-feira (29), em São Paulo, já era esperado, digamos que estava no roteiro da instituição.

Não pegou ninguém de surpresa.

Faz parte do elenco de tragédias brasileiras, embora poucos deem essa dimensão ao fato.

Ora, é parte da memória nacional o que virou cinzas.

Mas, na figura do secretário Mário Frias, o governo Bolsonaro, responsável pela instituição, está preocupado com outras coisas.

Há o golpe que não vai dar certo. Há o Centrão que vai fazer com o presidente o que fez com todos os outros. Há as “provas” da fraude que não houve nas eleições de 2018.

Há tanta coisa, que pouco importa o fogo em velhos documentos da Embrafilme ou em imagens do passado.

Para os que têm respeito pela memória nacional, no entanto, o momento é de luto.