CULTURA
Três décadas sem o brilho da poeta goiana Cora Coralina
Poemas da autora são centrados nos aspectos geográficos, históricos, morais e psicologicos da própria região em que ela viveu.
Publicado em 10/04/2015 às 6:00 | Atualizado em 15/02/2024 às 12:57
“Não morre aquele que deixou na terra a melodia de seu cântico na música de seus versos”. Ao escrever isto, Cora Coralina (1889-1985) imortalizou sua obra, mesmo tendo partido já há três décadas, pela pneumonia. Hoje, 30 anos depois, o Estado de Goiás exalta sua colaboração na cena da poesia brasileira.
Um grande nome, mas ainda pouco conhecida entre leitores. Inclusive nos meios acadêmicos, a obra de Cora Coralina ainda não foi estudada profundamente.
Aparentemente, isto não acontece no Estado em que nasceu.
De acordo com o escritor Hildeberto Barbosa Filho, poetas de Goiás exaltam sua obra."Gabriel Nascente, por sinal, escreveu um livro de poemas voltados para a obra dela", diz, referindo-se a Cora, a Pitonisa da Ponte (2006).A obra poética dela sempre foi rica em motivos do cotidiano do interior brasileiro, em especial das ruas históricas e dos becos de Goiás.
Segundo Barbosa, a poesia de Cora Coralina é muito centrada nos aspectos geográficos, históricos, morais e psicologicos da própria região em que ela viveu.
"É um sentimento muito goiano. Há também um elo muito forte entre o que ela sente e as experiências de vida como mulher", descreve.
Leitora assídua desde pequena, a família tradicional de Cora Coralina não enxergava a sua atitude com bons olhos. Na época, acreditava-se que mulher das letras, ou melhor, a mulher romântica, não se casava. Desbancando todas as teorias da época em torno do casamento, ela começou a escrever seus pequenos poemas ainda aos 14 anos. Fato este que não a impediu de viver um romance, casar e constituir uma família.
De início, seus textos foram publicados em jornais de Goiânia e de outras cidades, e em periódicos como a revista A Informação Goiana do Rio de Janeiro.
Conforme antologia de Assis Brasil, A Poesia Goiana no Século XX (Imago, 1997),a indicação mais antiga que se tem da vida literária de Cora Coralina é de 1907, pelo semanário A Rosa, dirigido pela própria junto a Leodegária de Jesus, Rosa Godinho e Alice Santana.
Mas o primeiro livro só foi publicado em 1965, quando já tinha quase 76 anos de idade. A obra Poemas dos Becos de Goiás e Estórias Mais (José Olympio, 1965) já contabiliza mais de dez edições. Entre versos imortalizados nas obras publicadas, Cora também foi autora de contos e livros infantis. Mesmo após sua morte, obras inéditas continuaram a ser publicadas, sendo a última datada de 2002.
Ainda sobre a visão do papel da mulher na sociedade, Cora Coralina trouxe um outro viés para a leitura de seus poemas. Hildeberto Barbosa comenta que a poesia dela tem um traço novo, uma "dicção feminina". Segundo o escritor, "a obra poética de Cora incorpora elementos que, tradicionalmente, a poesia feminina não trazia na época". Fato este que a aproxima da obra de Adélia Prado e a afasta de poetas como Cecília Meireles. "Ela traz em sua poesia elementos do cotidiano, da vida doméstica", explica.
Associando a obra de Cora Coralina com a de Mário Quintana, Hildeberto Barbosa traz essa referência devido à singeleza e sutileza da poesia dela. Para a escritora Vitória Lima, os escritos de Coralina são doces e carregados de sabedoria. "Nos conforta o coração lê-la. Com isso não estou querendo dizer que ela escreve uma poesia açucarada. Não, sua poesia é cheia de sabedoria e ilumina qualquer um que entra em contato com ela", afirma.
QUATRO LIVROS PARA CONHECER CORA CORALINA
Cora Coralina - Coleção Melhores Poemas (Denófrio, Darcy França, Global Editora, 2004). A coleção Melhores Poemas reúne alguns dos poemas de Cora Coralina, divididos sob as temáticas 'Nos reinos de Goiás', 'Canto de Aninha', 'Criança no meu tempo', 'Paraíso perdido', 'Entre pedras e flores', 'Canto solidário' e 'Celebrações'.
Poemas dos Becos de Goiás e Estórias Mais (Cora Coralina, Editora José Olympio, 1965). Primeiro livro publicado da poetisa brasileira. Na obra, Cora contas estórias que viveu, observou ou aprendeu de ouvido. O tecido textual é composto por elementos como tempo, espaço, memória, história e geografia numa singela entrega poética.
Cora Coralina - Raízes de Aninha (Britto, Clóvis carvalho; Seda, Rita Elisa, Idéias & Letras,2009).Obra reúne primeiras poesias e textos até então inéditos, depoimento dos familiares e um acervo fotográfico de Cora Coralina. A biografia traz relatos fiéis da vida humana e artística de um dos nomes mais importantes da poesia brasileira.
Vintém de Cobre - Meias Confissões de Aninha (Coralina, Cora, Global Editora, 2007). Terceiro livro da poetisa, publicado primeiramente em 1983. Cora batizou com o nome da antiga moeda as "meias-confissões"de Ana Lins (nome verdadeiro de Cora) redigidas em versos. Os poemas do livro mostram a sua sabedoria , considerada simples, e a sua fibra de guerreira.
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