A odisseia no Sertão

Sob um calor escaldante, Desportiva encarou o Cruzeiro e expôs a dura realidade de quem busca subir de divisão na Paraíba.

A viagem para Itaporanga aconteceu em um ônibus fabricado em 1986, um dos únicos patrimônios do clube. A delegação deixou Guarabira por volta do meio-dia da terça-feira. Passou a noite no município de Piancó e só chegou à cidade-destino, palco do jogo, por volta das 13h da quarta-feira, a apenas duas horas do pontapé inicial.

O elenco se hospedou num hotel que pouco tinha a oferecer em termos de conforto. Na chegada, se deparou com o problema de falta d’água em alguns dos quartos, fato que dificultou ainda mais a missão da Desportiva.

Resolvido o problema, jogadores, comissão técnica e dirigentes seguiram para o restaurante, dentro do próprio hotel. Refeição simples, sem requinte, muito menos orientação nutricional.

Na quarta-feira pela manhã, veio a preleção do técnico Geraldo Cirino, reservada apenas ao elenco. Com o objetivo já traçado, a Desportiva saiu no início da tarde para enfrentar os últimos 30km de viagem até o Estádio Zezão.

Sem local apropriado dentro do vestiário, que não chegava nem a 10 m², os jogadores tiveram que se sentar no chão para conseguir vestir. Antes de a partida começar, o técnico reuniu o grupo para a última conversa. Mais uma vez a falta de espaço foi um problema. O papo final aconteceu num verdadeiro cubículo, sob calor quase insuportável.

Com temperatura que beirava a casa dos 40º, a Desportiva entrou em campo para enfrentar o time da casa, o Cruzeiro. Bem mais adaptada às condições climáticas, a Raposa do Vale fez valer o mando de campo e aplicou goleada de 4 a 0.

Mesmo com todo esse sofrimento, jovens como o meio-campista Caíque, de apenas 18 anos, acreditam que vale a pena jogar num time como a Desportiva Guarabira. Acham que, a qualquer momento, podem ser “descobertos” por algum olheiro.

“É quase impossível jogarmos 100% tendo que enfrentar um campo ruim e um clima tão quente. Teve um momento nessa partida em que eu tentava respirar e meu nariz doía. Chegou até a sangrar por conta do calor. Mas tenho esperança de conseguir uma chance num time maior”, declarou o camisa 10.

Passada toda essa agonia, de cabeças baixas e decepcionados com o resultado ruim, os jogadores foram entrando um a um no ônibus e se preparando para percorrer mais uma vez o longo caminho, agora de volta para casa.

“É muito difícil fazer futebol aqui na Paraíba. Às vezes sinto que estou roubando a minha família por tirar tanto dinheiro para o clube”, desabafou o presidente Domingos Sávio, já pensando nos R$ 120 que terá que desembolsar para comprar a carne para o almoço dos atletas na semana.