ESPORTES
Eleição de Michele Ramalho para a presidência FPF tem suspeita de fraude
'Esporte Espetacular' revelou que eleição de Michele Ramalho teve série de irregularidades.
Publicado em 23/12/2018 às 12:10 | Atualizado em 23/12/2018 às 15:36
Oito meses após a Operação Cartola, que desarticulou um esquema de manipulação de resultados, uma nova denúncia cai sobre o futebol da Paraíba. Uma reportagem do programa 'Esporte Espetacular', da TV Globo, neste domingo (23), revelou suspeitas de fraude na eleição que levou a advogada Michele Ramalho à presidência da Federação Paraibana de Futebol (FPF). Segundo o que foi apurado pelo programa, o processo eleitoral envolveu compra de votos, falsificação de documentos e chantagem.
>>Veja a reportagem do Esporte Espetacular na íntegra
Michele foi eleita presidente da FPF no final de setembro, mas começou a campanha em agosto, após o Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) suspender o então presidente Federação Paraibana, Nosman Barreiro. Ele foi punido após criticar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) durante uma entrevista. No dia seguinte, o Treze, time que Michele Ramalho já foi advogada, entrou com um pedido de intervenção da FPF. Poucas horas depois, o presidente do Tribunal, Paulo César Salomão Filho acatou o pedido. Vale lembrar que Nosman Barreiro era vice-presidente e assumiu o cargo em junho, após o presidente Amadeu Rodrigues ser afastado após os desdobramentos da 'Cartola'. Essa foi a segunda intervenção, a primeira foi logo na sequência da operação.
Fora do cargo, Nosman Barreiro contestou a medida que, em sua opinião, foi tomada em uma velocidade fora do usual para o meio jurídico. Ele fez também uma denúncia. Segundo ele, o pedido do Treze-PB não teria sido assinado pelo então presidente do clube, Juarez Lourenço. A assinatura passou por um exame grafotécnico no Rio de Janeiro. O documento foi analisado pelo perito Marcelo Carneiro que fez avaliações semelhantes para os Tribunais de Justiça do Rio e São Paulo. A conclusão do relatório indica que a assinatura não teria saído das mãos do então presidente do clube. Lourenço, no entanto, garante que foi ele quem assinou.
Outra incoerência no pedido de intervenção é que o pedido foi protocolado no STJD sem a procuração de um advogado, algo anormal em todas as instâncias da justiça brasileira. Ao notar a falha, o auditor do STJD Mauro Marcelo, relator do processo, deu ao Treze-PB prazo de cinco dias para que apresentasse a procuração do advogado. O prazo acabou, mas o clube não atendeu ao pedido do Tribunal.
Em vez de encerrar o processo, Mauro Marcelo deu um novo prazo ao Treze. No dia 14 de setembro, enfim, o clube encaminhou a procuração. De acordo com o advogado Manoel Peixinho, especialista em Direito Civil, a omissão do Treze deveria resultar na anulação do pedido de intervenção. Questionado pela reportagem, o auditor Mauro Marcelo não quis se pronunciar sobre o caso. O presidente do STJD, Paulo César Salomão Filho não quis gravar entrevista, mas informou que desconhece qualquer irregularidade no processo.
Apesar dessa sequência de erros nos documentos, o processo de intervenção avançou. O auditor João Bosco Luz foi escolhido pelo Tribunal para conduzir o processo eleitoral na Federação Paraibana.
Campanha e novas irregularidades
Foi a punição aplicada pelo Tribunal a Nosman Barreiro pelo próprio STJD que abriu caminho para Michele chegar ao comando da Federação. A então auditora do Tribunal, inclusive, foi escalada para participar da intervenção, como assessora do interventor João Bosco, seu colega do STJD. Nos bastidores da campanha, Bosco foi apontado por dirigentes de clubes da Paraíba como cabo eleitoral da atual presidente.
Segundo a reportagem do Esporte Espetacular, João Bosco procurou Ademário Cavalcante, então diretor de registro da Federação, e pediu para ele regularizar ligas e clubes que não poderiam votar porque constavam como inativos no sistema da CBF. O estatuto da entidade diz que apenas ligas com competições reconhecidas nos dois anos anteriores e com a documentação em dia podem votar. Sobre os clubes, eles precisam ter mais de dois anos de filiação. Ademário afirma que não aceitou fazer as inclusões e foi afastado de suas funções.
“A forma com que eles queriam fazer eu não teria condição porque não teria amparo estatutário, amparo legal pra fazer isso e na verdade não fizemos e a partir desse momento aconteceu a perseguição”, disse Ademário ao Esporte Espetacular.
Após o afastamento de Ademário, uma funcionária da CBF assumiu a função e 11 ligas, até então irregulares, foram incluídas no sistema e tiveram permissão de votar.
Pelo menos quatro clubes, também com problemas na documentação, conseguiram votar em Michele. Um deles foi o Diamante Esporte Clube. O time amador de João Pessoa só foi regularizado no sistema da CBF no dia 24 de outubro, ou seja, quase um mês depois das eleições na Federação.
João Bosco Luz afirma que a inserção das ligas e clubes no sistema da CBF foi dentro da legalidade. “Todas as ligas estavam com suas pastas devidamente arquivadas na Federação, com toda documentação, mas sem providências. Então, por isso, a partir daquele momento, eu determinei que se tomassem todas as providências para que no prazo de até setenta e duas horas antes das eleições as ligas pudessem participar do pleito”, diz João Bosco.
O colégio eleitoral passou de 30 clubes e nenhuma liga amadora, para 34 clubes e 11 Ligas. Entre os novos votantes, quatro clubes e oito ligas irregulares declararam voto em Michele Ramalho. Esse apoio de última hora foi fundamental para a vitória dela por dois votos de diferença.
A CBF informou que todo processo eleitoral foi conduzido pelo interventor João Bosco Luz e não irá se manifestar.
Compra de voto
A reportagem do 'Esporte Espetacular' teve acesso a um áudio onde o presidente do Kashima, Marcos Lima, diz que votou em Michele por ter recebido uma promessa de um emprego em troca. “Defendi ela, defendi todo mundo com a promessa de que eu seria o assessor de imprensa da federação. Resultado: me escantearam. Para resumir: estou desempregado”, afirma. Ele não quis dar entrevista.
Essa não teria sido a única tentativa de compra de votos. Ao Femar,da segunda divisão do futebol local, foi prometida uma vaga na Taça São Paulo. É o que admite o presidente do clube, Severino Ferreira
Posicionamento
Michele Ramalho se manifestou sobre a reportagem da Globo por nota. Disse que está à disposição para esclarecimentos e que a eleição foi a mais democrática da história do futebol paraibano. Ela afirmou que as denúncias devem ser recebidas com naturalidade porque "as mudanças em curso no futebol paraibano estão causando enormes desconforto àqueles que estão acostumados com as ilegalidades de antes da minha posse".
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