Geraldo Vandré, aniversariante do dia, está “morto” há mais de 40 anos!

O compositor Geraldo Vandré faz 81 anos nesta segunda-feira (12). Resgato aqui parte de um texto que escrevi nos 80 anos dele. É um pouco do que penso sobre o autor de “Caminhando”.

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O advogado Geraldo Pedrosa de Araújo Dias vive em São Paulo, longe do ambiente em que se projetou nacionalmente na década de 1960. Por trás do advogado, há um artista: o compositor Geraldo Vandré. Este, está “morto” desde o lançamento de “Das Terras do Benvirá”, de 1973.

Ou desde aquela noite em 1968, quando conquistou o segundo lugar da etapa nacional do Festival Internacional da Canção com “Caminhando (Pra Não Dizer que Não Falei de Flores)”. Ali, a poucas semanas da edição do AI-5 e do endurecimento do regime militar, Vandré viveu o ponto alto de sua carreira. E a sua despedida.

O episódio que mais marcou o festival foi a disputa entre “Caminhando”, de Geraldo Vandré, e “Sabiá”, de Antônio Carlos Jobim e Chico Buarque. Tom e Chico compuseram uma bela canção de exílio, mas o público queria a urgência dos versos de Vandré: “Vem vamos embora, que esperar não é saber/quem sabe faz a hora, não espera acontecer”.

O “pra não dizer que não falei de flores” do título remete aos versos que chamam de “indecisos” os cordões da não violência. A crítica a eles é tão inequívoca quanto a descrença (do autor) na vitória das flores sobre o canhão. Alguns ouvintes podem até se enganar, mas a letra não comporta dúvidas.

“Sabiá” foi defendida pelas irmãs Cynara e Cybele, do Quarteto em Cy. “Caminhando”, pelo próprio autor.

Voz e violão, dois acordes (um menor, outro maior) que se repetiam e uma letra que fazia a conclamação à luta armada. O suficiente para arrebatar a plateia, que não aceitou o segundo lugar conquistado por Vandré, muito menos o primeiro conferido a “Sabiá”. Ele tentou conter os que receberam a vencedora com uma vaia monumental. Disse que Tom e Chico mereciam respeito e pronunciou uma frase de efeito: “a vida não se resume em festivais”.

Era Geraldo Vandré, compositor notabilizado na era dos festivais, em sua última performance pública em terras brasileiras.

Vandré foi parceiro de Carlos Lyra, Gilberto Gil, Théo de Barros, Geraldo Azevedo, e tem, entre suas canções mais conhecidas, “Quem Quiser Encontrar o Amor”, “Fica Mal com Deus” e “Porta Estandarte”.

No festival da MPB de 1966, numa interpretação arrebatadora de Jair Rodrigues, sua “Disparada” (parceria com Théo) dividiu o primeiro lugar com “A Banda”, de Chico Buarque.

Em “A Canção no Tempo”, Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello comentam apenas duas músicas de Vandré: “Disparada” e “Caminhando”, o que sugere, talvez, que, nele, o mito se sobrepõe mesmo aos méritos.

Com o endurecimento do regime, Vandré deixou o Brasil. Quando voltou, muitos diziam que fora preso e que a tortura o deixara louco – uma lenda que convinha a setores da esquerda. Mas não era verdade. Ele não foi preso, nem torturado.

No retorno, negou o mito ao ponto de não querer ser reconhecido pelo nome que lhe deu dimensão nacional. E foi ainda mais longe ao compor “Fabiana” em homenagem à Força Aérea Brasileira. Mas seguiu cultuado pela esquerda.

Em 2014, subiu ao palco no show de Joan Baez em São Paulo, mas não cantou “Caminhando” com a musa da canção de protesto dos anos 1960. O silêncio de Vandré confirmava a “morte” do artista e a vida do advogado Geraldo Pedrosa de Araújo Dias.