Constituição de 1988 acabou com a censura no Brasil

Nos primeiros tempos da TV Cabo Branco (1987/1988), convivíamos com uma visita diária de um funcionário da Polícia Federal.

A programação das emissoras de televisão ainda estava sob censura, e ele cuidava disso.

Promulgada a nova Constituição, em outubro de 1988, recebemos a última visita dele.

Nosso editor chefe, Erialdo Pereira, me chamou à sua sala e, diante do cara da PF, disse:

Hoje é um dia histórico! A censura acabou!

Constituição de 1988 acabou com a censura no Brasil

Vou lembrar de um filme. Nele, Jesus Cristo desce da cruz, abre mão da condição de filho de Deus, casa, tem filhos e envelhece como um homem comum. O diretor é um homem de formação católica. O filme é A Última Tentação de Cristo, de Martin Scorsese.

Lembro de outro filme. A meiga e doce Rosemary está grávida. Coisas estranhas começam a acontecer, envolvendo o marido e os vizinhos, um casal de velhinhos. Eles são de uma seita demoníaca? O bebê será um filho de Satã? O filme é O Bebê de Rosemary, de Roman Polansky.

Em sua nova turnê, os Rolling Stones abrem os shows com Sympathy for the Devil, um dos clássicos do repertório da banda. A música sempre está no repertório deles. Foi composta no Brasil em 1968, durante umas férias de Mick Jagger e Keith Richards, e é considerada um samba.

Esses exemplos estão aqui por causa de um projeto do deputado Marco Feliciano. Diz assim:

2º. Não será permitido que a programação de TV, cinema, DVD, jogos eletrônicos e de interpretação – RPG, exibições ou apresentações ao vivo abertas ao público, tais como as circenses, teatrais e shows musicais, profanem símbolos sagrados.”

Poderemos rever A Última Tentação de Cristo?

Poderemos rever O Bebê de Rosemary?

Poderemos ir ao show dos Rolling Stones?

O projeto do deputado Feliciano é muito amplo. Muito subjetivo. Muitíssimo perigoso. Restaura a censura (ou parte dela). Rasga a nossa Constituição.

Deve ser inserido nessa escalada de obscurantismo que estamos testemunhando no Brasil.

De um lado (e principalmente desse lado), a truculência da direita.

Do outro, o politicamente correto que muitas vezes conduz a esquerda em direção à censura.

Um debate que, certamente, será inserido na campanha eleitoral de 2018. E com chances enormes de conquistar expressivas fatias da população.

Vou fechar recorrendo ao “livrinho” do qual não devemos nos afastar:

“é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”

“é vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística” 

O Brasil não tem censura!

O Brasil tem liberdade de imprensa!

São conquistas fundamentais do nosso processo civilizatório!