A Trinca de Ases “invade” a cidade com música e amor no coração

Tem um momento em que o público da casa de shows grita:

Fora, Temer!

Eu também acho um horror esse governo, mas o brado me pareceu tão fora de contexto!

O que temos no palco é uma outra coisa.

Naquelas duas horas, estamos diante de um grande artista brasileiro, agora com 75 anos, voltando aos palcos após uma série de problemas de saúde. Ao lado dele, uma mulher de 72 anos, uma das maiores cantoras da música brasileira. Completando o trio, um jovem impetuoso e viril, que veio de uma banda de rock e se afirmou, sozinho, com suas belas canções.

Gilberto Gil, Gal Costa e Nando Reis. A Trinca de Ases do título do show.

Eles se reuniram originalmente para homenagear o Dr. Ulysses Guimarães, um dos artífices da nossa jovem democracia. Depois, decidiram montar o show e a turnê.

Foi o que vimos nesta sexta-feira (13) em João Pessoa.

Trinca de Ases tem algo dos Doces Bárbaros de 41 anos atrás.

Eles “invadem” a cidade cheios de amor no coração. Alegres, felizes, esfuziantes.

E dizem assim:

É isso. Vamos cantar e tocar. Vamos celebrar a deusa música. A musa única do samba de Gil que está no set list.

Aí alguém pergunta (e eu ouvi):

E vai dar certo Gil e Gal com Nando?

Claro que sim!

Gil é de 1942. Gal é de 1945. Nando é de 1963. Agora que Gil celebra os 40 anos de Refavela, Nando lembra que viu a Refavela original, de 1977, quando tinha apenas 14 anos.

Ou seja: ele é um fã que se junta aos ídolos.

Gil e Gal acolhem o jovem impetuoso e viril, e tudo dá certo.

Lembram daquela “pegada” rock que nunca abandonou os tropicalistas?

Nando traz Gil e Gal para junto dela de novo. O encontro dos dois violões (o de Gil com o de Nando) confirma. Tão diferentes e tão eficazes no diálogo que vemos no palco.

Trinca de Ases é quase um show de rock. Nando tem papel fundamental com o violão que troca a cada número. Gil é um velho rocker. Com o violão em forma de guitarra, cheio de movimentos de corpo que lembram um velho homem do rock, Keith Richards. Entre eles, Gal, Fa-tal, evocando Melodia: tente esquecer em que anos estamos!

Fiquei vendo de longe. Essas belezas, a gente contempla em silêncio.

Os Beatles que há em Dois Rios. A força poética de Refavela. Stevie Wonder no dueto de Gal com Nando. A incômoda atualidade de Nos Barracos da Cidade. O Barato Total que eu vi ao vivo jovem, quase um garoto, com Gal e Donato no palco do Santa Roza.

Trinca de Ases é uma reunião de grandes afetos e muitas belezas.

Na minha idade, vejo essas coisas contemplando-as.

Os mil significados de um show assim, em sua permanência, são infinitamente maiores do que o grito da plateia, circunscrito a um momento que logo vai passar.

A força é bruta e a fonte da força é neutra e de repente a gente poderá!

Está lá, na letra da canção de Gil!