Polícia indicia três pessoas envolvidas na colisão entre trem e ônibus

Foram indiciados o motorista do ônibus, o maquinista e o assistente de maquinista. Investigações seguem por mais 30 dias.

O maquinista, o assistente de maquinista e o motorista, que conduziam o trem e o ônibus envolvidos na tragédia que matou quatro pessoas e deixou 30 feridos na última segunda-feira, foram indiciados por homicídio culposo (quando não há intenção de matar). Segundo o delegado responsável pelo caso, Antônio Farias, esse foi o entendimento policial, mas apesar disso as investigações prosseguirão durante aproximadamente 30 dias, período em que o laudo ficará pronto e será anexado aos autos do inquérito.

“Eles foram ouvidos ontem e negaram ter responsabilidade no acidente. O motorista disse que o ônibus estava interditado por uma moto e dois carros, já o maquinista disse que não tinha condições de frear. Eu os ouvi e indiciei os três por homicídio culposo. Agora é esperar o laudo, que será feito por um engenheiro. Também deveremos conversar com o chefe de manutenção da CBTU (Companhia Brasileira de Trens Urbanos) para discutir a situação, visto que tenho 30 dias para concluir o inquérito. Mas eles já foram indiciados”, explicou o delegado.

Na manhã de ontem, dia seguinte à trágedia, na passagem de nível de Várzea Nova, distrito de Santa Rita, na Região Metropolitana de João Pessoa, os sinais do acidente ainda eram visíveis. Objetos pessoais, calçados, tufos de cabelo e manchas de sangue no chão e próximo aos trilhos representavam as vidas e as histórias deixadas para trás no momento da colisão. Mães, donas de casa, maridos, trabalhadores. Famílias que nunca mais serão as mesmas após esse 29 de fevereiro de 2016.

Apesar de toda repercussão do caso e suas consequências, a reportagem também flagrou crianças sendo deixadas pelos pais ou responsáveis brincando sobre os trilhos que em menos de 24h haviam sido palco de dor e lamentações. Condutores de veículos foram flagrados fazendo manobras arriscadas e parando os carros sobre o mesmo local, menosprezando o risco iminente de um novo acidente.

O acidente da última segunda-feira, entre um ônibus e um trem, foi o mais trágico registrado desde 2012 pela Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU). De acordo com a empresa, entre 2012 e 2015, houve 51 colisões envolvendo trens, mas somente em 2014, quando ocorreram 12 colisões, teve o registro de uma morte.

Segundo a CBTU, o setor jurídico está acompanhando as investigações, aguardando o resultado da perícia feita no local e abriu sindicância para apurar os fatos, mas informou que a área do acidente em Várzea Nova é dotada de sinalização padrão: Cruz de Santandré e as mensagens ‘pare, olhe, escute’, além de sinalização luminosa e sonora, conforme prevê a legislação de trânsito. Contudo, a reportagem do JORNAL DA PARAÍBA esteve no local na manhã de ontem e observou que tal sinalização encontra-se precária, inclusive com alguns sinais luminosos apagados e sem a sinalização sonora, apenas o apito do trem ao se aproximar da passagem de nível.

A CBTU ainda informou que em todos os anos são realizadas várias ações educativas nas passagens de nível, inclusive onde ocorreu a colisão, com a finalidade de prevenir acidentes e alertar aos motoristas para os perigos em desobedecer a sinalização de cruzamento com a via férrea. (Colaborou Othacya Lopes)

NA BR-230 PRIMEIRA TRAGÉDIA

O acidente da tarde de última segunda-feira foi o segundo de grande proporção envolvendo um ônibus da empresa Santa Rita. O primeiro ocorreu no dia 28 de setembro de 2013, quando, segundo a polícia, o motorista do coletivo perdeu o controle da direção, bateu em um poste e capotou às margens da rodovia federal BR-230, próximo às Três Lagoas, quando seguia no sentido Santa Rita/João Pessoa. À época, havia cerca de 50 passageiros no veículo, dos quais 39 ficaram feridos e três morreram. Uma das vítimas que foi a óbito estava grávida e com o forte impacto o bebê saiu da barriga, também morto.

O laudo do Instituto de Polícia Científica (IPC), divulgado no dia 8 de janeiro de 2014, concluiu que o acidente aconteceu por falha mecânica. O laudo também apontou que não existia manutenção preventiva no veículo, apenas a corretiva, realizada de forma precária. De acordo com o perito do IPC Robson Félix, o veículo possuía três abalos mecânicos importantes e excesso de desgaste em vários componentes. Ele explicou que a análise foi realizada nas peças do ônibus e de vestígios no local.

Empresa nega falha

O gerente operacional da empresa de ônibus Santa Rita, Luiz Carlos, pronunciou-se em nome do motorista e da empresa. Ele descartou a hipótese de possível falha mecânica, impedindo que o motorista saísse da linha férrea. “Ao ver o vídeo das câmeras de segurança que registraram o acidente, com atenção, é possível perceber que o ônibus fez a mudança de marcha para a primeira, de partida, mas por milésimos de segundos não deu mais tempo. O fato é que dois carros estavam parados na frente do ônibus. O trem também não reduziu, se o tivesse feito, talvez, a tragédia tivesse sido menor”, afirmou.

Além disso, Luiz Carlos ressaltou que “a velocidade do trem no momento do acidente era incompatível para o trecho”. “Em outros casos, o trem arrasta veículos de pequenos porte para poucos metros, causando apenas um dano no carro. Não tem o impacto de jogar um veículo, como fez com o ônibus de 17 toneladas (afora o peso dos passageiros). O trem só parou 50 metros depois. Ele poderia não evitar o acidente, mas conseguiria evitar a gravidade do acidente, movido pela força por conta da alta velocidade”, observou.

O gerente operacional ainda denunciou que todas as passagens de nível da Região Metropolitana de João Pessoa infringem a lei, pois não possuem cancelas. “Essa, de Várzea, além de não ter a cancela, a sinalização é inadequada, como o sonorizador que não tem, e apenas uma luz da sinalização luminosa funciona. Ela pisca o dia todo, e não somente quando o trem se aproxima. É preciso que a CBTU reveja os conceitos de segurança, já que vários outros acidentes já aconteceram, embora esse tenha sido de grande proporção”, pontuou.

De acordo com Luiz Carlos, após o acidente, o motorista do ônibus acionou o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e foi levado por alguns amigos para a sede da empresa, onde chegou nervoso e temendo represálias da população. “O setor jurídico foi acionado e o motorista depôs à polícia durante a tarde. Ele relatou o mesmo que pôde ser visto no vídeo. Agora estamos prestando todo o apoio à família e lamentamos profundamente tamanha tragédia”, disse.