Aliança da esquerda com sociedade se diluiu

Cientista sustenta que partidos esquerdistas correm para o centro político.

O cientista político Jaldes Menezes lembra que as lideranças sociais e os partidos de esquerda sempre andaram de mãos dadas, especialmente depois da luta pelo fim da Ditadura Militar.

“Os sindicatos e as ONGs encontraram representação através dos partidos de esquerda. Essa aliança se diluiu um pouco, mas não foi totalmente trincada”, afirma. Com o “escasseamento” das lideranças, o que dizer da esquerda?
Para o cientista político Jaldes Menezes, a política brasileira se institucionalizou de tal forma que todos os partidos – tanto os de esquerda como os de direita – correram para o centro político.

“Você tem um quadro político atual de unicidade programática.

No fundo, as diferenças são mais no modo de gerir do que nos princípios. Afinal, qual é a diferença entre Veneziano (PMDB) e Ricardo Coutinho (PSB)?”, comparou.

O quadro, segundo Jaldes, não é diferente no cenário nacional.

“Se você observar, Eduardo Campos (PSB), Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB) não são tão diferentes. O que está em disputa, de fato, é o modo de gerir e não os princípios programáticos”, disse. De acordo com o especialista, essa mudança começou a se desenhar em 1994, a partir do Plano Real. “Nas eleições de 1989, a política era bem polarizada. As diferenças estavam muito claras e definidas. Hoje, a política está muito parecida”, ressaltou.

Jaldes acredita que esse fenômeno acontece de forma ainda mais grave nos parlamentos. “A partir de certo momento se consolidou no Brasil o presidencialismo de coalizão, ou seja, a realização de grandes alianças partidárias coordenadas pelo prefeito, pelo governador e pelo presidente. Os apoios são firmados em troca da liberação de emendas. Não existe mais um embate político, mas de aparato. A relação do prefeito com os vereadores, por exemplo, não é mais de fidelidade programática, mas de coisas pontuais, como um recurso ou empregos”, disse.

Segundo o especialista, os partidos antagônicos da atualidade não são mais tão representativos. “O PT era um partido de antagonismo nas primeiras décadas de existência, fazia denúncias, mas desde que chegou ao poder, em 2003, incorporou a metodologia de centro”, disse.

SOCIALISTA
Para a militante petista Zezé Béchade, a vitória do PT e de Luiz Inácio Lula da Silva descentralizou o poder no país, ao ponto de eleger uma figura como Dilma Rousseff, que não tinha um perfil conhecido. “O Brasil vive um momento diferente. Antes, não havia políticas sociais que atendiam às demandas. Hoje temos um governo socialista, preocupado com a população carente. Com isso, o papel do movimento social mudou", assinalou a petista.

Radical questiona movimento social

O presidente do PSTU na capital, Antônio Radical, discorda e critica o principal partido socialista do país. “O que existe atualmente entre o governo e os movimentos sociais não é uma parceria, mas uma cooptação. A CUT ocupa mais de mil cargos na estrutura do governo federal. Uma cooptação que não gera avanço nas conquistas, mas um freio nas mobilizações”, disse. O socialista cita como exemplo o acordo coletivo especial proposto pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC Paulista. “O sindicato, que é berço da CUT, apresenta agora uma proposta que visa acabar com vários direitos da classe trabalhadora”, afirma.

Para Radical, enquanto uma parte da esquerda realiza alianças amplas para conquistar terreno eleitoral, outro setor continua empunhando bandeiras socialistas.

“Apesar do PT e do PCdoB manterem essas siglas, os partidos não representam mais nada do que dizem seus nomes. Mas existe um setor da esquerda – e o PSTU faz parte desse grupo – que continua ao lado dos trabalhadores, mantendo e defendendo os ideais da classe trabalhadora. Hoje existe uma disputa dentro do movimento sindical popular entre aqueles que lutavam mas se venderam aos ideiais neoliberais e aqueles que defendem a classe, mas estes, infelizmente, são minorias”, disse.

Onde foram parar as lideranças inflamadas?

A VOZ DO MEIO AMBIENTE – PAULA FRASSINETE

Precursora na luta pelo meio ambiente na Paraíba, a ex-vereadora Paula Frassinete (PSB) já não é mais vista à frente dessa discussão como antigamente. A ativista se afastou da direção da Associação Paraibana dos Amigos da Natureza (Apan) desde que se candidatou a uma vaga para a Câmara de Vereadores de João Pessoa. Ela afirma que embora a sua participação esteja ofuscada, nunca esteve fora da luta.
“Como candidata e vereadora, fizemos as discussões em torno do assunto e dos projetos, depois fui trabalhar com os idosos, à frente do Clube da Pessoa Idosa, o que me afastou um pouco, mas eu nunca estive fora da luta. Não estou mais na diretoria da Apan, mas sou tesoureira da entidade. Inclusive, recomeçamos a discussão em torno dos espigões na cidade e já conclamamos a população com relação à modificação do plano diretor da cidade”, ressaltou Paula Frassinete.
A ativista lembra que outros interlocutores foram surgindo e que a legislação também ficou mais forte. “A gente percebe que os órgãos começaram a atuar mais fortemente. O Ministério Público Federal, em especial Eitel Santiago, foi um baluarte nessa discussão”, afirma Paula.
Aos 70 anos, a ativista ambiental concorda que o Estado carece de novas lideranças. “Os sindicatos perderam a essência, estão anestesiados. Antes, nós tínhamos um Netovitch (Maia, atual diretor comercial da Cagepa), a Aduf (Associação dos Docentes da Universidade Federal da Paraíba) era muito forte. É preciso que a juventude busque novas vozes e entenda que a força está nela. Nos encontros religiosos, por exemplo, é preciso que as políticas públicas sejam discutidas. Contudo, acredito que o momento de lideranças inflamadíssimas e de um ideal já passou”, afirmou.
Atualmente, Paula Frassinete coordena um projeto do governo do Estado de recuperação da mata ciliar do Rio Paraíba.

A VOZ DOS BANCÁRIOS – LUCIUS FABIANI

Antes de assumir a Secretaria de Trabalho, Produção e Renda da Prefeitura de João Pessoa, em 2008, o petista Lucius Fabiani esteve à frente do Sindicato dos Bancários da Paraíba e da Federação dos Bancários do Nordeste, além de dirigente da CUT. Enquanto esteve à frente da classe bancária, Lucius participou de greves e lutou por melhores condições de trabalho da categoria. Depois de passar pela Secretaria de Trabalho e Renda, Lucius assumiu a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e depois a Emlur.
O gestor explica que teve que se afastar da presidência do sindicado em função dos cargos públicos, mas que nunca abandonou a categoria. “Faço parte da diretoria do Sindicato dos Bancários como suplente e continuo participando das grandes discussões da categoria e das principais assembleias. Também mantenho uma excelente relação com a minha categoria, mesmo com eventuais divergências, que são normais em qualquer lugar”, disse. Este ano, Lucius voltou à pasta de Trabalho e Renda como secretário adjunto. Ele lembra que é formado em economia e contabilidade e diz que trabalha com o que gosta. “Faço isso com muita garra e disposição e tenho orgulho de participar de uma secretaria que comanda um programa que é referência mundial de geração e renda. Temos muito o que fazer”, disse.


A VOZ DAS MULHERES – VALKíRIA ALENCAR

Durante 21 anos, Valkíria Alencar respondeu pelo Centro da Mulher 8 de Março, onde combateu ativamente a violência doméstica contra a mulher. Há dois anos, passou a coordenar o Centro de Apoio à Criança e ao Adolescente (Cendac), uma ONG que funciona com o apoio do Governo do Estado.
Valkíria afirma que não deixou de lutar pelas mulheres, mas que atualmente faz um trabalho complementar. “Hoje, o nosso foco é na capacitação de jovens adolescentes e mulheres que são chefes de família. Sabemos que para sair de uma situação de violência a mulher precisa de autonomia econômica para não depender do parceiro. Portanto, a autonomia da mulher é o primeiro passo. Assim, o nosso trabalho junto ao Cendac complementa aquilo que a gente vem dizendo há bastante tempo. A luta não parou”, afirma Valkíria.


A VOZ DA IGREJA – PADRE ADELINO

Ao denunciar a atuação de grupos de extermínio no Brejo paraibano, Padre Adelino dos Santos logo se tornou uma liderança respeitada no Estado. Foi eleito deputado estadual em 1993 pelo PT e duas vezes vereador de João Pessoa (de 2000 a 2008). Nas últimas eleições municipais, disputou mais uma vaga na Câmara de João Pessoa pelo PMDB, mas não conseguiu se eleger com 2,4 mil votos.
Com a derrota, o padre disse que resolveu se aposentar da política partidária seguindo a orientação do povo. “Desisti da política partidária de vez. Se o povo não quis, eu tenho que seguir a voz do povo. Mas a política do bem comum é o nosso dia a dia. Diante das injustiças não fico calado”, disse Padre Adelino, que é auxiliar das paróquias do bairro Valentina de Figueiredo e de Intermares.

AS VOZES DO MOVIMENTO SINDICAL – CHICO LOPES & ARIMATÉIA FRANÇA

Nos anos 80 e 90, Chico Lopes e Arimatéia França se tornaram lideranças no Estado, participando da reestruturação dos movimentos sindicais pós Ditadura Militar. Chico Lopes foi um dos fundadores da Ampep (Associação do Magistério Público da Paraíba), hoje Sintep, da Central Única de Trabalhadores (CUT) e do Partido dos Trabalhadores (PT) na Paraíba. Foi eleito deputado estadual no início dos anos 90 e candidato a prefeito de João Pessoa, em 1992, levando o PT pela primeira vez ao segundo turno na capital. Ainda foi candidato à eleição em 1998, mas não conseguiu se eleger deputado.
Em 2005, Chico Lopes participou de um movimento pela criação do Comitê Paraibano de Defesa da Transposição de Águas do Rio São Francisco, que ficou ativo até 2009. Em 2011, já no PSB, foi convidado pelo governador Ricardo Coutinho para assumir uma diretoria da Agência Executiva de Gestão das Águas (Aesa), onde permanece até hoje. “Na Aesa, estou à frente de uma diretoria que trata das águas do rio São Francisco, portanto continuo trabalhando com o São Francisco, agora na parte de apoio estratégico. É um trabalho de organização e bastidores”, disse.
Arimatéia França (PT) também fez história na CUT. Foi o fundador e presidiu por duas vezes a regional de Campina Grande. Também esteve à frente da CUT estadual, onde hoje responde pela Secretaria de Comunicação, e militou nas últimas décadas em vários conselhos de políticas públicas e de emprego e renda. Atualmente, Arimatéia é coordenador de Articulação Política da Prefeitura de João Pessoa.
O petista concorda que a postura das lideranças mudou, mas que isso está ligado aos avanços já conquistados pelo país. “Aquelas lutas que a gente fazia tinha mais enfrentamento devido à conjuntura que estávamos vivendo. Os direitos básicos eram mais grosseiramente atingidos. Naquele tempo, a gente via pessoas trabalhando para ter direito exclusivamente a uma cesta básica. A exploração era maior. Hoje vivemos um período onde há o reconhecimento das trabalhadoras domésticas. Existe uma política nacional de salário mínimo. O salário mínimo antes era menor que uma cesta básica. A regulamentação de políticas públicas minimizou o confronto direto, por outro lado, as lideranças tiveram que se qualificar para fazer colocações importantes”, analisou.