Mesmo que Cícero sancione, lei que torna igrejas atividades essenciais é ‘letra morta’ em caso de colapso

Por ANGELICA NUNES

Mesmo que Cícero sancione, lei que torna igrejas atividades essenciais é 'letra morta' em caso de colapso
Foto: João Victor Guedes/TV Anhanguera

O projeto de lei que tornou as igrejas atividades essenciais em João Pessoa, aprovado na Câmara Municipal nesta quinta (4), deve ser analisado pelo prefeito Cícero Lucena (PP) ainda nesta sexta-feira (5). Auxiliares dizem que ele tem sido pressionado por aliados políticos com bases religiosas, em especial os vereadores da ‘bancada da bíblia’, para que a proposta seja sancionada. O prefeito tem 15 dias para vetar ou não a matéria.

Ao Conversa Política, o procurador do município, Bruno Nóbrega disse que vai levar ao gabinete do prefeito pontos de possíveis inconstitucionalidades e a orientação que vem sendo adotada pelo judiciário nestes casos. Segundo ele, a tendência natural é que a matéria seja alvo de embates judiciais, caso Cícero opte por sancionar o projeto.

Bruno Nóbrega explicou que há um entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) de que em caso de crise sanitária, como a pandemia da covid-19, medidas mais restritivas devem prevalecer. Neste pontos, órgãos de controle podem recorrer ao Judiciário para derrubar a lei. “Na prática isso teria que ser levado ao poder judiciário”, pontua.

Decreto estadual

O obstáculo para a lei é o decreto estadual atualmente em vigor, que proíbe a realização de celebrações religiosas presenciais e deve ser renovado devido ao número crescente e contínuo dos casos. Basta dizer que nesta quinta, a Paraíba chegou a 225 mil casos confirmados e 4,6 mil mortos pela covid-19.

O governador João Azevêdo (Cidadania) tem se mantido firme no propósito de reduzir a circulação de pessoas para frear a nova onda da covid-19 e deve manter o endurecimento das regras, incluindo nelas as celebrações religiosas presenciais por entender que elas podem ser realizadas de forma remota sem prejuízo.

O procurador geral do estado, Fábio Andrade, ascendeu a polêmica ao afirmar que:

“o fato de uma lei municipal eleger qualquer atividade como essencial não quer dizer que em um momento de necessidade sanitária essa atividade não possa ter sua atividade regulada por um decreto estadual”, pontua Fábio Andrade.

Segundo Fábio Andrade, mesmo que uma lei estabeleça a igreja como atividade essencial isso não impede que um decreto estadual ou mesmo municipal, se houver necessidade, determinem que missas, cultos e celebrações religiosas sejam realizados apenas de forma online. “Importante destacar também que isso não impede a igreja ou templo de abrir as portas e de funcionar, apenas limita ao ambiente virtual a realização de eventos com aglomerações de pessoas”, explicou o procurador.

Pode limitar

Este também é entendimento pessoal do procurador do município Bruno Nóbrega. Para ele, a decisão sobre atividades essenciais devem ficar a cargo de equipes técnicas e do gestor para edição de decretos temporários. Mesmo no caso das academias, que foi derrubada de veto de Cartaxo e já virou lei, a lógica é a mesma. “O fato de ter se tornado atividade essencial não quer dizer que as academias poderão aglomerar gente e não cumprir as normas sanitárias. Tudo isso pode ser limitado pelo poder público ainda”, explicou.

“Neste ponto, se houver colapso não tem sentido as academias, ginásticas e igrejas serem atividades essenciais e continuarem funcionando. Isso é muito sazonal e depende de políticas públicas”, diz o procurador.

Judiciário em sintonia

O raciocínio do procurador vai ao encontro do entendimento do judiciário paraibano que tem decidido favorável às medidas de enfrentamento adotadas pelo governo do estado. No mais recente, negou o pedido do deputado Cabo Gilberto para derrubar o ‘toque de recolher’ imposto pelo decreto estadual. Em outro momento revogou o projeto de lei aprovado em Bayeux que liberava missas e cultos de forma semipresencial neste período da pandemia.