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SAÚDE

Covid-19: Ainda existe grupo de risco?

Falar em população risco para covid-19 hoje em dia no Brasil talvez não faça mais sentido. Cresce o número de pessoas com menos de 60 anos nas UTIs de todo país.

Publicado em 16/03/2021 às 11:47 | Atualizado em 05/02/2024 às 11:45

Abril 2020

Todo dia quando eu entrava para mais um turno exaustivo de trabalho em uma de tantas UTIS, um pensamento que vinha na cabeça: "Não é justo para essas pessoas morrerem assim". Eram senhores e senhoras, na sua imensa maioria  idosos com mais de 80 anos, com uma longa história de vida e que agonizavam por trás de máscaras e tubos, aguardando o êxito quase sempre letal de uma doença até então pouco conhecida. Consigo lembrar com riqueza de detalhes  do orgulho de Dona Joana, 83 anos, merendeira aposentada, de  ter criado sozinha os cinco filhos, um deles professor universitário e que pagava o seu plano de saúde. Ela me dizia que depois de tanta luta, finalmente podia gozar de um pouco de tranquilidade  - em meio a tanta falta de ar, ela mantinha a serenidade, tanto que me chamou a atenção.

Horas depois, estava eu, sendo testemunha de suas ultimas palavras, prestes as ser intubada. A COVID tomara seus pulmões numa proporção que não podia mais respirar. Joana morreu 7 dias depois.

Assim como Joana, 68% de todos que morriam por COVID, 75% tinham mais de 60 anos. Além disso, 74% deles apresentavam pelo menos um fator de risco. Problemas cardíacos foram a principal comorbidade associada, seguida de diabetes, pneumopatia, doença neurológica e doença renal. Obesidade também foi um fator de risco para pessoas de qualquer idade. 

Março 2021

Passado um ano, nem de longe eu poderia imaginar que estaríamos na atual situação (Dados mundiais da COVID).  Dia após dia, cresce o número de novas internações, cresce o número diário de mortes e cresce a desproporção entre pessoas que precisam de internações e o número de leitos disponíveis numa velocidade que o o poder público não consegue se  organizar e mobilizar recursos. (Perfil da Covid-19 no Brasil)

O número de pessoas abaixo de 60 anos tem crescido;  se em janeiro eles representavam 23% das internações, hoje são 30% e com tendência a crescer anda mais. Antes tínhamos pessoas mais idosas, com muitas comorbidades e que morriam rapidamente, hoje temos jovens, saudáveis que superlotam os leitos por mais tempo. Seria essa uma das explicações para o caos que vem se instalando nos últimos dias?

Profissionais de saúde numa uti

Escassez de dados

Os dados consolidados ainda não conseguem explicar o atual perfil dos pacientes que tem chegado aos hospitais. Novas variantes, demora em procurar o hospital ou mesmo exposição a maior carga viral são algumas questões postas pelos cientistas.

Os pesquisadores da Fiocruz encontraram um aumento importante de uma nova variante circulando aqui no Brasil. Eles acreditam que a variante P1 possa ter maior poder de infecção, mas ainda não tem respostas em relação à maior gravidade dos casos da covid-19 em pacientes infectados por outras cepas do vírus. O que se sabe é que cada vez que o vírus se multiplica,  existe oportunidade dele se modificar e conseguir vencer todas as estratégias utilizadas até o momento para lutar contra esse invasor.

Novas variantes podem ameaçar vacinas

A própria  Organização Mundial da Saúde (OMS) informou que as variantes encontradas aqui podem afetar a eficácia das vacinas contra Covid-19 disponíveis até o momento. Segundo a Organização, a variante brasileira (P1) pode reduzir a neutralização de anticorpos.

O Instituto Butantan de São Paulo tem estudado a eficácia de sua vacina contra a Covid-19.

Os dados apontam que ela é eficiente contra as variantes P.1 (também conhecida como amazônica) e P.2 (do Rio de Janeiro). O estudo está sendo realizado em parceria com o Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP), e incluiu as amostras de 35 participantes vacinados na Fase 3 realizada pelo Butantan.

Essa mudança do perfil dos doentes nos faz acreditar numa nova cepa.

Quem é grupo  de risco atualmente?

Portanto, além de hipertensos, diabéticos, idosos e obesos continuam correndo mais risco de morrer pela doença. O que chama atenção é que uma doença se espalhando mais rápido.

Provavelmente eu e você também estamos incluídos no grupo de risco de pegar a doença e ter sintomas graves.

Vacina, vacina e vacina...

Certamente, a única medida realmente eficaz é vacinar rapidamente a população antes que essas variantes estraguem completamente a eficácia da única arma efetiva que temos em mão.

Isolamento ou morte?

No momento, provavelmente falar em isolamento  seja temeroso em um Brasil que a polarização política extrapola os limites da ciência e bom senso, mas alguns países que adotaram essa estratégia curta associada a vacinação em massa já colhem bons frutos.

Portanto, até que 70% da população esteja vacinada, muitas lágrimas rolarão... Resta rezar!

Imagem

André Telis

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