Todo último domingo do mês, no amanhecer, um grande número de fiéis passa pela PB-383, na região de Sousa, no Sertão da Paraíba, rumo à estátua de Frei Damião, localizada a cerca de 7 quilômetros da zona urbana. A devoção ao frade italiano é compartilhada por muitos nordestinos, como Erivan Ferreira da Silva, um dos devotos que segue de bicicleta.
Todo domingo nós estamos aqui. É que hoje eu acordei tarde e nós viemos de bicicleta, mas só vem a pé. É que o sono hoje pegou, aí a cachacinha, né? Mas nós estamos chegando lá, se Deus quiser".
Sem parar de pedalar, o auxiliar geral conta que vai à missa todos os domingos por causa de uma promessa que fez para a sua esposa que morreu de câncer. Mesmo após ela ter morrido, o homem não abandonou o compromisso com Frei Damião.
“Foi uma promessa que eu fiz para minha esposa, mas ela faleceu, mas eu estou cumprindo ainda. Faleceu de câncer”.
O cabeleireiro Francisco Fernandes também atravessa o amanhecer do Sertão da Paraíba para a missa de Frei Damião, no último domingo de cada mês. Ele que vai muitas vezes a pé diz que a distância não é um empecilho.
Mesmo a distancia não atrapalha. Acordo de manhã cedo, venho na caminhada como muitos devotos vêm".
O homem segue a devoção a Frei Damião desde criança, quando acompanhava os pais nas missões do religioso. Até hoje acredita nos milagres e diz que teve uma graça alcançada.
É um santo, muito poderoso na face da terra, obrou muito milagre, como muitos devotos por aí que fazem promessa e alcançam, como eu, graças a Deus, hoje sou livre de muitas coisas erradas que eu fazia no mundo".
No local da missa, a dona de casa Vera Lúcia Gomes da Silva acendeu velas para Frei Damião. Segundo ela, a devoção vem desde a infância. “Sou devota desde quando eu era criança que sempre acompanha as missões. Eu e minha família. Meus pais me ensinaram, minha mãe, meu pai sempre acompanharam. É muito bonito”.
Recentemente, Vera Lúcia precisou se agarrar ainda mais à fé em Frei Damião: a morte de um filho.
Todo final do mês eu venho pra missa que esse ano passado eu tive uma perda muito grande, meu filho. Não é fácil não. Cada um tem que ter sua fé. A pessoa perdeu a fé, perdeu tudo na vida”.
O mais nordestino de todos os capuchinhos
O italiano Frei Damião, nascido Pio Giannotti, veio para o Brasil em 1931 onde dedicou sua vida sacerdotal no interior do Nordeste. Influenciado por seu tempo, uma vez que chegou a participar da Primeira Guerra Mundial pela Itália, tinha posicionamentos conservadores, como aponta o pesquisador José Honório das Flores em sua dissertação de mestrado. Contudo, foi o seu jeito simples de caminhar entre os pobres que o tornou considerado um santo pelos nordestinos, caminhando para o processo de beatificação, após a sua morte em 1997.
Para o Padre José Wandenberg Ferreira da Silva, o Padre Dedé, que celebra as missas de Frei Damião na estátua, em Sousa, a simplicidade e o carisma do capuchinho conquistou o nordestino.
Pela sua humildade e simplicidade em assumir a nossa cultura com suas realidades e circunstâncias, foi o mais nordestino de todos os capuchinhos. O fato da simplicidade dele entre os pobres gerou uma identificação. Ele encarnou a pobreza evangélica, vivendo pobre no meio dos pobres".
Além de Sousa, a devoção a Frei Damião é forte em outras cidades da Paraíba. Um dos pontos mais tradicionais é o Memorial Frei Damião, em Guarabira, inaugurado em 2004, com uma estátua do religioso de 34 metros de altura, que relembra a última visita do religioso à cidade. O memorial é nacionalmente conhecido e está na rota do turismo religioso.
Com imagens e sonoras de Beto Silva/TV Paraíba.