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CULTURA

'As Aventuras do Flama' faz 60 anos com pioneirismo nos quadrinhos do país

Publicado em: 30/01/2023 às 13:32 Atualizada em 30/01/2023 às 16:18

Na década de 60, no Brasil, quem tinha televisão era considerado rico. Não existiam celulares, muito menos redes sociais. A grande maioria das famílias se divertiam e se informavam pelo jornais impressos e rádios locais. Em um tempo que as tardes e noites eram embaladas por novelas de rádio, há 60 anos o Flama salvava vidas na Northwest Bay – Baía do Nordeste, na tradução livre – e encantava quem ouvisse suas histórias, de segunda a sexta-feira, às 13h, na Rádio Borborema, em Campina Grande.

A legião de fãs cresceu e o pai de Flama, o jornalista, radialista e quadrinista Deodato Borges, resolveu inovar. O programa A Hora do Flama se transformou em As Aventuras do Flama no impresso, revista publicada pela primeira vez em março de 1963, no Diário da Borborema. Nascia então, não só o primeiro super-herói paraibano, mas também a primeira história em quadrinhos do estado.

A obra marca um pioneirismo extraordinário de um empreendedor e artista independente do interior do Nordeste. Até hoje, o Flama arrasta uma legião de fãs e é uma inspiração para outros apaixonados pela arte do desenho, das letras e das aventuras.

No Dia do Quadrinho Nacional, o Jornal da Paraíba conversa com especialistas em HQ's e comemora os 60 anos de história de uma das mais importantes publicações da literatura moderna paraibana. 


				
					'As Aventuras do Flama' faz 60 anos com pioneirismo nos quadrinhos do país
As Aventuras do Flama. (Foto: Mike Deodato Jr./Arquivo Pessoal).

Um exército de um homem só

Natural de Campina Grande, Deodato Borges foi um dos pioneiros das histórias em quadrinhos na Paraíba e o seu personagem, Flama, foi um dos primeiros heróis dos quadrinhos brasileiros, segundo a Brasil Comic Con.

"Não conheço, na Paraíba, no Nordeste e mesmo no Brasil, algo que tenha sido tão inovador", disse o professor e pesquisador em quadrinhos brasileiros, Henrique Magalhães.

Antes da publicação impressa, Deodato já tinha uma legião de admiradores com A Hora do Flama e foi justamente para presentear aos adeptos de seu fã-clube que ele criou a revista – reproduzindo no papel a novela radiofônica. "O sucesso foi imediato e estrondoso, pois significava a materialização das aventuras que os leitores escutavam no rádio", explica Henrique.

Com inspiração em "The Spirit", de Will Eisner, o pesquisador destaca que As Aventuras do Flama trazia o melhor que se fazia em aventura, com os clichês típicos da época, mas com o diferencial de um super-herói com caráter mais policial do que de heroísmo exagerado. E para fidelizar ainda mais os fãs, Deodato criou uma carteirinha de agente secreto para quem acompanhava – e ainda fazia distribuição de brindes.

A ideia de transformar ouvintes em leitores foi uma sacada de gênio, no ponto de vista de Manassés Filho, criador da Comic House, uma livraria de HQs genuinamente paraibana. Só na rádio, o Flama garantia 100% de audiência e a história foi para as bancas no momento certo – na sua primeira publicação o sucesso já foi carimbado.

“O Flama construiu talvez um dos feitos mais extraordinários. A rádio novela deu um sucesso estrondoso ao personagem que garantia pessoas totalmente entretidas porque se encaixava perfeitamente aos elementos que eram de interesse do público da época. Logo em seguida, Deodato transporta toda essa legião de ouvintes para o impresso. E ele não só forma leitores, mas uma legião de pessoas que começam a acompanhar todas as Aventuras do Flama", pontua Manassés.

Deodato fazia tudo sozinho: escrevia os roteiros, desenhava as arte, produzia, publicava, narrava a rádio-novela e também procurava e negociava com os anunciantes. A publicação dos quadrinhos, totalmente independente, fez com que o próprio artista se tornasse um herói da vanguarda literária paraibana. Era um exército de um homem só, como explica Manassés.

Com a empreitada, Deodato não só criou o primeiro quadrinho paraibano, mas também formou leitores e inspirou uma geração que viu novas possibilidades nascerem no estado.

“Viram no Flama uma forma de também galgar ou até mesmo de publicar seus próprios personagens porque agora tinham um referencial de alguém da própria região que alcançou sucesso. E ainda resiste ao tempo se colocando como um personagem que passa de geração a geração e continua nos encantando com aquele feito realizado há mais de 50 anos, mas que se imortaliza na arte”, pontua o especialista.

E para todos os feitos, Henrique e Manassés apontam outra grande empreitada de Deodato: inspirar seu filho, uma das maiores referências em HQs no Brasil, o quadrinista Mike Deodato Jr.

  • 'As Aventuras do Flama' faz 60 anos com pioneirismo nos quadrinhos do país
    | Foto: As Aventuras do Flama. (Foto: Mike Deodato Jr./Arquivo Pessoal).
  • 'As Aventuras do Flama' faz 60 anos com pioneirismo nos quadrinhos do país
    | Foto: As Aventuras do Flama. (Foto: Mike Deodato Jr./Arquivo Pessoal).
  • 'As Aventuras do Flama' faz 60 anos com pioneirismo nos quadrinhos do país
    | Foto: As Aventuras do Flama. (Foto: Mike Deodato Jr./Arquivo Pessoal).
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    | Foto: As Aventuras do Flama. (Foto: Mike Deodato Jr./Arquivo Pessoal).
  • 'As Aventuras do Flama' faz 60 anos com pioneirismo nos quadrinhos do país
    | Foto: As Aventuras do Flama. (Foto: Mike Deodato Jr./Arquivo Pessoal).
  • 'As Aventuras do Flama' faz 60 anos com pioneirismo nos quadrinhos do país
    | Foto: As Aventuras do Flama. (Foto: Mike Deodato Jr./Arquivo Pessoal).

O começo de tudo

A jornada épica do Deodato Borges como criador de um personagem de sucesso estrondoso durou três edições de As Aventuras do Flama. E, conforme Manassés, é de se admirar que alguém tenha feito tanto sozinho.

Por ser um trabalho que o artista fazia com pouquissímos patrocinadores, logo a vida de Deodato tomou outros rumos. Ele seguiu nos jornais e nas rádios. Porém nos quadrinhos, viveu o sucesso mundial através de uma parceria com seu filho.

Deodato Borges e Mike Deodato Jr. publicaram juntos 3000 anos Depois e Ramthar, na década de 80, duas histórias de ficção científica pós-apocalípticas. 3000 Anos Depois virou, inclusive, Fallout 3000 nos anos 90 – quando foi lançada no mercado norte-americano.

Para o filho, se pai tivesse nascido nos Estados Unidos e publicado As Aventuras do Flama durante o boom dos quadrinhos na década de 50 e 60 lá fora, certamente não estaríamos falando de uma referência nos quadrinhos nacionais, mas de uma influência internacionalmente reconhecida.

“Papai era muito jovem, mas muito experiente; já era diretor de uma de uma estação de rádio muito jovem. E aquilo era só o começo daquilo que ele podia fazer”, pontua Mike.

A parceria com o pai não foi apenas de publicações conjuntas, mas também de troca de ideias e principalmente de apoio na carreira – um incentivo que Mike teve desde menino e precisou até alcançar o mercado americano, chegando na DC e Marvel Comics.

Mike Deodato já assinou edições da Mulher-Maravilha, Thor, Hulk, Elektra, Os Vingadores, além de muitos outros quadrinhos mundialmente conhecidos. Mas As Aventuras do Flama foi o começo de todo esse potencial.

“Marcou não só pela qualidade pra época, mas pela singularidade. É uma uma revista, um produto que não existia na época. Não existia outro tipo de publicação na região até então. Meu pai criou, foi um marco e foi só o começo. Então, a influência e a importância da obra do pai é que com certeza ele inspirou uma geração inteira, eu inclusive, a fazer quadrinhos. As Aventuras do Flama foi o começo de tudo para os quadrinistas do Nordeste”, ressalta Mike Deodato.

				
					'As Aventuras do Flama' faz 60 anos com pioneirismo nos quadrinhos do país
As Aventuras do Flama. (Foto: Mike Deodato Jr./Arquivo Pessoal).

A aventura continua

No começo de 2010 houve uma tentativa de trazer o Flama de volta para as bancas, com um roteiro atualizado e desenhos de Mike Deodato. Contudo Deodato Borges adoeceu e seus problemas de saúde infelizmente levaram ao seu falecimento em 2014, aos 80 anos.

Um ano após a morte do mestre, a Fundação Espaço Cultural (Funesc) fez uma republicação das histórias clássicas do Flama em João Pessoa – e a nova aventura do herói foi engavetada.

Em 2018, durante um painel da CCXP, Mike Deodato afirmou que não conseguia mais desenhar o personagem após a morte do pai. Por isso, estaria pensando em um novo projeto para o Flama.

Mike, licenciador da marca, autorizou a Memy Media para produzir O Flama & a Bússola do Destino,  com roteiro de MJ Macedo e ilustrações de Débora Caritá. “É um desenho charmoso, bonito, bem diferente do que a gente tem de referenciais mais recentes. Os elementos noir, policial, continuam vivos", disse Manassés sobre os novos desenhos.

O especialista afirma que as expectativas sobre a nova HQ estão altas, já que uma das lacunas do personagem é não ter uma história de origem. Por isso, uma das vertentes interessantes que O Flama & a Bússola do Destino pode explorar é expandir a mitologia do universo e do personagem.

A HQ está em pré-venda no Catarse desde agosto de 2022 e a ideia do projeto é uma nova visão do Flama, apresentando personagens inéditos e uma linguagem mais contemporânea, só que tudo ainda dentro do universo original, com muita ação, mistério e suspense. As sequências O Flama & o Número Fantasma e O Flama & as Três Mãos do Terror, já estão sendo produzidas.

Para o pesquisador e amante de quadrinhos, Henrique Magalhães, é essencial manter viva essa memória do primórdio de nossos quadrinhos. "Que ele continue como inspiração para os novos autores, não só paraibanos", pontua. Já o filho destaca que a obra e legado do pai estão vivos e em grande estilo. “Eles estão dando a versão deles, com uma roupagem diferente. A visão deles para o mundo atual do que seria o Flama. Eu fico feliz demais que tenham dado continuidade a obra de meu pai”, finaliza Mike Deodato Jr.

				
					'As Aventuras do Flama' faz 60 anos com pioneirismo nos quadrinhos do país
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Lara Brito

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