A jornalista Glória Maria morreu no Rio de Janeiro, na manhã desta quinta-feira (2). Ela lutava contra um câncer no cérebro e estava internada no Hospital Copa Star, na Zona Sul do Rio, desde dezembro de 2022.
Em 2019, Glória Maria começou a batalha contra o câncer. Inicialmente, foi diagnosticada com um câncer de pulmão e tratou a doença com cirurgia e com imunoterapia, tendo êxito. No final do ano passado foi internada de novo para combater novas metástases cerebrais.
“Em meados do ano passado, Glória Maria começou uma nova fase do tratamento para combater novas metástases cerebrais que, infelizmente, deixou de fazer efeito nos últimos dias, e Glória morreu esta manhã, no Hospital Copa Star, na Zona Sul do Rio", informou a TV Globo, em nota.
Pioneirismo
Conhecida por seu espírito de aventura atrelado a um profissionalismo de alto nível, Glória Maria criou uma nova forma de fazer jornalismo no país.
Foi uma das primeiras repórteres negras a parecer na televisão. Além disso, foi a primeira jornalista do Brasil a entrar ao vivo e em cores, no Jornal Nacional, em 1977.
Seu estilo de fazer reportagens mudou a linguagem do telejornalismo brasileiro — antes de Glória Maria, os jornalistas ainda não apareciam no vídeo e se comunicavam de maneira totalmente formal. Ela escolheu ficar na frente das câmeras, interagir com as fontes entrevistas e transformar com uma maestria coloquial fatos em informações.
Atuou durante a Ditadura Militar, defendendo a democracia em uma época de bastante repressão, e se tornou um símbolo da luta contra o racismo e o machismo. A jornalista foi uma das primeiras pessoas a usar a Lei Afonso Arinos, a primeira norma contra o racismo no Brasil.
No Memória Globo, ela falou sobre um episódio que sofreu ao entrevistar o ex-presidente João Baptista Figueiredo:
“Foi quando ele [João Figueiredo] fez aquele discurso ‘eu prendo e arrebento’ – para defender a abertura (1979). Na hora, o filme acabou e não tínhamos conseguido gravar. Aí eu pedi: ‘Presidente, é a TV Globo, o Jornal Nacional, será que o senhor poderia repetir? Problema seu, eu não vou repetir’, disse Figueiredo. Onde ela chegava, o ex-presidente dizia para a segurança: ‘Não deixa aquela neguinha chegar perto de mim", relembra.
Décadas depois, Glória Maria inaugurou uma nova era do jornalismo, protagonizando também a primeira transmissão em HD da televisão brasileira no Fantástico.
Glória Maria nasceu em Vila Isabel, bairro da Zona Norte do Rio de Janeiro, filha de um alfaiate e de uma dona de casa. Sempre estudou em colégios públicos e graduou-se em jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), na década de 1960. Nos estudos, sempre se destacou: “aprendi inglês, francês, latim e vencia todos os concursos de redação da escola”, lembrou no Memória Globo.
Após um estágio na Rede Globo, foi efetivada no departamento de jornalismo e sua primeira reportagem foi sobre a queda do Elevado Paulo de Frontin, em 1971. Com o tempo, tornou-se uma âncora importante da emissora, apresentando programas como o RJTV e o Jornal Hoje.
Sua carreira foi marcada de grandes reportagens, muitas vezes em lugares inusitados e exóticos, como o deserto do Saara e a Palestina. Cobriu momentos históricos, como a Guerra das Malvinas, em 1982, e entrevistou diversas celebridades, como Michael Jackson, Harrison Ford, Nicole Kidman e Madonna.
Ficou bastante conhecida pelo seu tempo na frente do Fantástico, de 1998 a 2007. Para o programa a jornalista viajou por mais de 100 países.
Depois de 10 anos de apresentação, tirou dois anos de licença e trabalhou como voluntária na Índia e na Nigéria. Nesse período, adotou sua filhas Maria e Laura, em Salvador.
De volta às telas, integrou a partir de 2010 a equipe do Globo Repórter, programa do qual fazia parte até hoje.
Legado
Ícone da televisão brasileira, Glória Maria deixa de herança sua essência de curiosidade, luta e inovação. O jornalista e apresentador do Jornal Nacional, William Bonner, em depoimento à GloboNews, enfatizou a carreira da colega como um grande símbolo do jornalismo brasileiro.
Assim como outros telespectadores, Bonner relata que aprendeu a gostar de telejornalismo vendo reportagens da Glória Maria.
"Ela criou trilhas na nossa profissão, ela inventou formas de fazer. Enfim, como brasileiro telespectador, tenho a compartilhar com cada um, claro, a tristeza, mas também esta certeza de que o trabalho dela permanece, de aquela memória que a gente vai ter dela é daquelas aventuras incríveis que ela fez, daqueles lugares fantásticos que ela trouxe para a gente, daquelas histórias que ela contou com o talento incrível que tinha para contar, com aquela espontaneidade, com aquela naturalidade. Um descanso para Glória, um carinho para as filhas, e a gente, a gente se consola com isso", pontuou Bonner.
O presidente Lula manifestou suas condolências nas redes sociais e prestou solidariedade aos familiares, amigos, colegas e admiradores da carreira de Glória. "Foi a primeira repórter a fazer uma entrada ao vivo no Jornal Nacional e se tornou eterna nos programas Fantástico e Globo Repórter", escreveu.
Recebo com muita tristeza a notícia da morte de Glória Maria, uma das maiores jornalistas da história da nossa televisão. Glória foi repórter em momentos marcantes do Brasil e do mundo, entrevistou grandes nomes e deixou sua marca na memória de brasileiros e brasileiras.
— Lula (@LulaOficial) February 2, 2023
Jornalista, pesquisadoras e influenciadoras também reforçaram a importância da carreira de Glória Maria e seu pioneirismo reconhecido como inspiração para todas as mulheres negras. Nomes como Flávia Oliveira, Ana Paula Santos e Eliana Cruz reforçaram seu legado.
https://www.instagram.com/p/CoKOWsiulx4/
