Conversa Política
27 de janeiro de 2023
11:58

Instituições de ensino, Judiciário e Igreja aproveitam o sol da Paraíba para diminuir gastos com energia elétrica

Na Paraíba, das quase 37 mil casas, edifícios ou galpões que recebem energia solar das quase 21 mil pequenas usinas fotovoltaicas, somente 365 unidades recebedoras sediam algum órgão público. As placas estão instaladas em 110 prédios.

Matéria por Laerte Cerqueira

Uma fonte de energia gratuita e mal aproveitada pelo poder público. Dinheiro do contribuinte que poderia ser economizado e revertido em benefícios. Na Paraíba, das quase 37 mil casas, edifícios ou galpões que recebem energia solar, gerada em quase 21 mil pequenas usinas fotovoltaicas, somente 365 unidades recebedoras sediam algum órgão público. As placas estão instaladas em 110 prédios.

Um deles é o do Instituto Federal da Paraíba de Princesa Isabel, no Sertão, a 440 km de João Pessoa. Apesar de não ter nenhum curso específico na área de energias renováveis, todos os prédios do IFPB de Princesa têm placas fotovoltáicas. O administrativo, o acadêmico, o restaurante e a biblioteca. O potencial do sol é totalmente aproveitado.

IFPB de Princesa Isabel. Foto: Reprodução/TV Cabo Branco.

Os sistemas foram adquiridos com recursos do Ministério da Educação, depois da apresentação do projeto. O investimento foi de mais de R$ 1 milhão, com retorno garantido na conta, que garante energia às atividades acadêmicas.

“A partir do momento que você tem uma redução, uma economia de energia, eu posso potencializar, por exemplo, o consumo, a compra de insumos para aulas práticas no laboratório. Uma melhor manutenção dos nossos veículos, aquisição de combustíveis para os nossos estudantes fazerem visitas técnicas para aulas práticas. É nessa perspectiva que a gente está trabalhando hoje para realocação de recurso, que seria destinado para energia”, explicou Vinícius Campos, diretor-geral do IFPB de Princesa Isabel.

Vinícius Campos, diretor do IFPB, em Princesa Isabel. Foto: Reprodução/Vídeo

Se as placas são tão benéficas, por que elas são pouco usadas? “Eu acredIto que o ponto chave é no sentido de implantação de políticas públicas”, afirmou o diretor do IFPB.

Para Joilson Costa, coordenador da Frente Nacional por uma Nova Política Energética, há algumas iniciativas, mas muito poucas quando se leva em conta o potencial. “Infelizmente, o poder poder público não cumpre seu papel que poderia ser grande incentivador […] A quantidade de experiência ainda é ínfima, considerando o potencial do Brasil”, destacou.

Joilson Costa, coordenador da Frente Nacional por uma Nova Política Energética. Foto: Reprodução/TV Cabo Branco.
IFPB, Princesa Isabel.

UFPB

Em junho do ano passado, a Universidade Federal da Paraíba (UFPB) inaugurou o sistema fotovoltaico da Instituição. O investimento para instalação do sistema fotovoltaico foi de R$ 1,070 milhão. Em operação desde 25 de agosto de 2021, o sistema fotovoltaico inaugurado faz parte da primeira etapa das ações de geração de energia elétrica na UFPB. Segundo a Superintendência de Infraestrutura da UFPB, a usina solar fotovoltaica proporcionou a economia de R$160 mil em 10 meses. A expectativa é de uma economia de R$ 200 mil por ano.

“Essa economia significa que em cinco anos nós teremos pago essas placas e teremos pelo menos mais quinze anos para exploração desse recurso. Há que se dizer que, nesse ato, a UFPB não só economiza energia mas também promove uma ação ambiental importantíssima, que é apostar com energias alternativas, energias renováveis”, afirmou o Reitor Valdiney Gouveia.

O sistema é composto por 672 módulos (placas solares), com potência de 295kWp (quilowatt pico), o sistema fotovoltaico ocupa uma área de cerca de 1.500m² nos blocos de salas de aulas A, C, D e E, do CT, e gera, mensalmente, o equivalente a 4% da energia utilizada pelo Campus I da UFPB.

Foto: Divulgação/UFPB
 Prédios administrativo, acadêmico, o restaurante e a biblioteca do IFPB de Princesa Isabel. Todos com sistema de energia solar. 

TRT13 aposta na economia para melhoria dos serviços 

Nessa mesma lógica de que não tem mais sentido gastar com o que se recebe de graça, o Tribunal Regional do Trabalho da Paraíba passou a integrar um pequeno grupo de instituições públicas que apostaram no sol. Leonardo Videres, ex-presidente do TRT da Paraíba, explica o motivo de apostar no novo modelo de geração de energia.

“Nós ganhamos de um lado de um projeto, entre aspas, verde. E por outro lado, ao longo de tempo, nós vamos ter mais espaço no nosso orçamento para investir em informática, em pessoal. Ou seja, em tudo que traga aprimoramento no serviço do Tribunal”, explicou em entrevista realizada quando ainda e participava diretamente da implantação dos sistemas na Corte.

Leonardo Videres, ex-presidente do TRT13. Foto: Reprodução TV Cabo Branco.
Placas solares que geram energia para os prédios do TRT13. Foto: Divulgação/TRT
Placas solares que geram energia para os prédios do TRT13. Foto: Divulgação/TRT

Quatro prédios, em Patos, Sousa, Santa Rita e João Pessoa já recebem os créditos da geração de energia solar. Já são R$ 120 mil de economia, por ano, com expectativa de dobrar com a implantação de novos conjuntos de placas. “Nós teremos mais quatro usinas, um pouco maiores. E eu penso que essa estimativa de economia vai chegar a 80% do nosso custo com essa energia”, comemora.

Mais fé, conforto, economia e proteção do meio ambiente  

As instituições de Patos, morada do sol, a 300 km de João Pessoa, tem de fato aproveitado os benefícios do seu principal símbolo. A cerca de dois anos a Igreja Católica, por exemplo, resolveu investir. Instalou neste terreno próprio aqui mais de 200 placas que geram energia para todos os prédios da instituição e uma economia de mensal de pelo menos R$ 7 mil.

As placas não foram colocadas no telhado da Catedral porque havia uma preocupação com o espaço, a estrutura e o sombreamento em algumas áreas. Para o padre Joécio Nóbrega, responsável pelo projeto da “igreja solar”, o investimento, bancado pelos fieis, compensa muito.

“Ela gera energia para Catedral, para Igreja da Conceição, Casa Paroquial, Secretaria Paroquial, Casa da Misericórdia, Pastoral da Criança, o Salão Paroquial, tem a própria torre da Igreja Catedral. São 10 pontos onde temos esse investimento. Mas nós temos outras paróquias, como a de Santa Luzia, São Mamede, Várzea , Vista Serrana, Condado, que já têm experiência, não completas como a nossa, mas transformadoras”, detalhou o padre.

Padre Joácio, Diocese de Patos. Foto: Reprodução TV Cabo Branco.
Prédio da Igreja de Patos que recebeu placas. Foto: Reprodução TV Cabo Branco.
Terreno de propriedade da Igreja de Patos onde foram instaladas mais de 200 placas fotovoltaicas. Foto: Reprodução TV Cabo Branco.

Os fiéis aproveitam todo o conforto que o sistema gera e vêem o dinheiro do dízimo e da arrecadação nas festas sendo bem utilizado. “É muito bom, né? Principalmente, pela questão do conforto, porque com o ar condicionado ligado, o calor… o sol é exclusivo de Patos e com isso melhora muito a participação na missa”, Almir Rogério, engenheiro eletricista e frequentador da Igreja.

De acordo com o padre Joécio, há também uma olhar especial com o meio ambiente. “O nosso bispo Dom Heraldo tem incentivado bastante, para que as nossas paroquias façam investimentos como esse. principalmente, por causa do cuidado com a natureza, na geração e na administração dos recursos dos nossos paroquianos”, concluiu o padre.

 

Centro de Educação Popular

Na zona rural de Matureia, as placas instaladas no telhado do Centro de Educação Popular e Formação Social, uma organização sem fins lucrativos, geram diminuição de custos no trabalho de capacitação. “Na medida em que você tem um processo descentralizado de geração e distribuição isso não gera impacto, vamos dizer assim, gritantes para o meio ambiente. Então, barateia a energia e é de uma forma harmoniosa com a própria natureza. É um impacto insignificante”, explicar José Dias, diretor do Centro.

Entrevista com José Dias, diretor do Centro Educacional, na Zona Rural de Matureia. Foto: Reprodução.
Teto com placas solares do Centro de Educação Popular e Formação Social, na Zona Rural de Matureia. Foto: Reprodução.
José Dias, diretor do Centro de Educação Popular e Formação Social, na Zona Rural de Matureia. Foto: Reprodução.

A iniciativa também virou exemplo prático dessa nova relação que o sertanejo deve estabelecer com o sol.  “Quem vem pra aqui visitar, escolas, técnicos, universidades e outras organizações, buscam inspiração para replicar isso, em outras regiões e em outras unidades produtivas”, afirmou Dias.

Trabalho filantrópico

Entrada do Centro das Irmãs Carmelitas, em Princesa Isabel. Foto: Reprodução.

Depois de quase 30 anos de atividades intensas, esse Centro de Educação de Irmãs Carmelitas, em Princesa Isabel, teve que praticamente parar as atividades por causa da pandemia. Era março de 2019. Em alguns meses antes, no entanto, a instituição recebeu uma doação que no retorno efetivo das atividades, permitiu a geração e distribuição de mais conhecimento. O potencial já está sendo experimentado.

A Irma Terezinha explica que todas as atividades do Centro, agora, são feitas em ambientes que tem a energia solar como motor. “São seis placas, toda essa unidade. Não é só essa casa, mas a casa do mel, a gente tem o refeitório, a gente tem a casa lá de cima”, afirmou Terezinha Bezerra, coordenadora.  A conta vinha salgada antes das placas R$ 400. Agora, as irmãs pagam R$ 100.

Irmã Sara, recém chegada ao Centro é que rega os viveiros de plantas. Com água puxada por um motor, alimentado pela luz do sol. “Vem da barragem. É enviada a água para caixa, chega lá na casa de cima e essa água da caixa faz a distribuição para todo o Centro”, destacou.

“Nosso foco principal é a criança e o adolescentes. Porque eles estão crescendo, é (sic) a semente cuidada para produzir. Mas também com a família porque a família é o berço, que fortalece isso tudo. A gente trabalha a questão da dignidade da pessoa, da confiança, o respeito com o diferente, o cuidado com a natureza, os princípios todos que nos faz está em harmonia com o outro, com a natureza. E a gente entende que Deus está presente nisso tudo”, relatou irmã Wilma, que atua no Centro.

Irmã Terezinha, coordenadora do Centro de Educação de Irmãs Carmelitas, em Princesa Isabel. Foto: Reprodução.
Irmã Sara, colaboradora do Centro de Educação de Irmãs Carmelitas, em Princesa Isabel. Foto: Reprodução.
Irmã Wilma Alves, colaboradora do Centro de Educação de Irmãs Carmelitas, em Princesa Isabel. Foto: Reprodução.

Vinícius  Honorato foi um beneficiados pela atividades do Centro ainda quando era criança e adolescente. Agora, na faculdade é monitor voluntário. “Participei de formação de cursos de música, de flauta e foi a partir daí  que comecei a ter mais um envolvimento forte com essa comunidade”, registrou Honorato.

As placas foram doadas pelo Comitê de Energia Renovável do Semiárido. O grupo é formado por entidades que buscam promover a conscientização em torno das mudanças climáticas e do uso descentralizado da energia solar, na região que tem uma das maiores incidências solares do mundo. O coordenador do Comitê de Energia Renovável do Semiárido lembra que o projeto tem como essência que vivemos em uma “casa comum”, que precisa ser protegida.

“O nosso projeto, como te falei, foi inspirado no documento muito importante do Papa que se chama laudato si, que significa louvado seja, louvado seja Deus pela criação, pela mãe terra, pela natureza […] a casa comum é a terra, que é a casa de todos nós. Então, essas coisas boas nós queremos para todas as pessoas que habitam essa casa comum”, relata Anchieta.

“A placa solar vem nos lembrar que a energia está aqui. Nós temos toda essa capacidade energética e com a placa, nós podemos captar essa energia, gerar nova energia  e multiplicar os nossos sonhos”, afirmou com empolgação a Irmã Wilma Alves.

Vinícius  Honorato foi um beneficiados pela atividades do Centro Carmelita. Agora, é monitor. Foto: Reprodução.
José de Anchieta, coordenador do Comitê de Energias Renováveis do Semiárido – Cersa. Foto: Reprodução.
 Centro das Irmãs Carmelitas, em Princesa Isabel. Foto: Reprodução.  

Entrevista 

Por e-mail, conversamos com superintendente do BNB na Paraíba, João Nilton Castro Martins, que falou sobre o papel do banco dentro dessa nova relação do paraibano, das instituições e do poder público com o sol. Ele registrou quais os investimentos que estão sendo feitos pelo banco, perfil de beneficiados, investimentos e projeções. Abaixo, os pontos trazidos pelo gestor. Alguns deles foram destacados em nas duas primeiras matérias dessa série.

Linhas de financiamento

“Desde que passou a operar em 2016 para financiar sistemas de micro e minigeração distribuída de energia através de fontes renováveis, a adesão de empresas de todos os portes tem sido uma crescente em toda a área de atuação do Banco do Nordeste. O FNE SOL é a primeira linha de financiamento do BNB criada com essa finalidade e que também passou a operar para as residências particulares. Para se ter uma ideia, apenas em 2023 estão previstos R$ 186 milhões para financiamentos de projetos residenciais, o que representa um crescimento de 28% em relação ao orçado para 2022. A Paraíba reservou R$ 12 milhões para projetos nessa modalidade. Para empresas no geral, do pequeno projeto ao sistema de grande porte, financiamos R$ 650 milhões com os agentes produtivos, somente em 2022”.

Projetos financiados e recursos 

“No que tange aos financiamentos individuais/isolados, na Paraíba foram financiados, em 2022 (até 30/12), no âmbito das energias renováveis, cerca de r$ 10,5 milhões para PF e r$ 650 milhões para PJ. É importante destacar que muitas operações financiadas pelo BNB, no âmbito das energias renováveis – sob o guarda-chuva de outros programas de crédito, a exemplo do FNE Verde e do FNE Inovação – são realizadas de forma integrada a outros investimentos, de modo que os valores totais aplicados para esse tipo de energia são superiores aos oficialmente divulgados pelo BNB”.

Setores privado, governo, cooperativas, agroindústrias

“O banco atende a todos os segmentos, inclusive o governo, via parcerias público-privadas. no que tange aos financiamentos individuais/isolados, na Paraíba, para o setor privado (PF e PJ), foram financiados em 2022 (até 30/12), no âmbito das energias renováveis, cerca de r$ 660,5 milhões, sendo r$ 10,5 milhões para PF e R$ 650 milhões para PJ, dos quais cerca de R$ 16,5 milhões foram destinados às MPes. Conforme informado na resposta anterior, tendo em vista o fato de muitas operações financiadas pelo BNB, no âmbito das energias renováveis, serem integradas a outros investimentos, os valores efetivamente aplicados nesse segmento são bem superiores aos oficialmente divulgados.

Histórico de aplicações 

Nos últimos 4 anos, para pessoas físicas foram financiados mais de r$ 500 milhões, beneficiando cerca de 15 mil famílias em toda a área de atuação do BNB. Na Paraíba, nos últimos 4 anos, foram financiados cerca de R$ 40 milhões para pessoas físcias e, aproximadamente, R$ 2,35 bilhões para pessoa jurídica, no âmbito das energias renováveis.

Condições de acesso ao financiamento

Para a agricultura familiar, as taxas de juros são pré-fixadas, a partir de 0,5% a.a. para pf, os prazos são de até 08 anos, com até seis meses de carência. Juros pré-fixados a partir de 7,5% a.a. e juros pós-fixados a partir de IPCA + 1,70% a.a. para pessoas jurídicas, os prazos são de até 12 anos, com até seis meses de carência. Juros pré-fixados a partir de 9,5% a.a. e juros pós-fixados a partir de ipca + 3,66% a.a.

João Nilton Castro Martins, superintendente do BNB na Paraíba. Foto: Divulgação
Doutor em Comunicação (UFPE), professor do Mestrado em Jornalismo da UFPB. Autor do livro A Função Pedagógica do Telejornalismo (Insular, 2018). É repórter, editor e comentarista político das TVs Cabo Branco e Paraíba e CBN/PB.