Historiador revela “erro histórico” e diz que JP nasceu em novembro

Historiador diz que comemoração do aniversário da cidade de João Pessoa acontece em agosto apenas por causa de um “absurdo histórico".

Phelipe Caldas

A população paraibana comemora nesta quarta-feira, 5 de agosto, o aniversário de 424 anos de fundação de João Pessoa, a terceira cidade mais antiga do Brasil. Mas para o médico e historiador Guilherme D’ávila Lins, imortal da Academia Paraibana de Letras e sócio do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano, a comemoração do aniversário da cidade acontece em agosto apenas por causa de um “absurdo histórico”. Ele defende que a data correta da fundação de João Pessoa seria 4 de novembro e critica o fato de todos os anos as autoridades e o povo baterem palma para uma “decisão política equivocada”.

Classificando-se como um “apaixonado pela verdade histórica”, ele lamenta que nos primeiros anos do século 20 as autoridades da Paraíba tenham deturpado a verdade e que até hoje ninguém tenha feito nada para restabelecer o que de fato aconteceu no curso da história paraibana. Segundo Guilherme, 5 de agosto tem sim sua importância e não pode perder sua grandeza, mas jamais poderia ter o status de “data suprema” da fundação pessoense.

Ainda de acordo com ele, o 5 de agosto foi “apenas” o Dia da Paz entre os portugueses e os índios Tabajaras, que abriu caminho para a criação de João Pessoa, mas que não representou a fundação em si. “O rei de Portugal tinha dado a ordem para que os portugueses no Brasil expulsassem os franceses do Rio Paraíba, submetessem os Potiguaras e construíssem uma fortificação para dar início à nova cidade. A paz com os Tabajaras (inimigos dos Potiguaras), portanto, foi um importantíssimo passo para a missão, mas não foi jamais a conclusão dela”, destacou, lembrando ainda que 5 de agosto é o dia de Nossa Senhora das Neves e por isso ela virou a padroeira da cidade.

Guilherme explica como se deu aqueles momentos históricos em pleno século 16. A fim de conquistar a Paraíba, o ouvidor-geral da Capitania de Pernambuco, Martim Leitão, percebeu a sinalização de paz feita pelos Tabajaras e enviou uma caravela para dialogar com o líder indígena Piragibe. O comandante da missão era João Tavares, que liderava um grupo formado por oito portugueses e vinte soldados.

“A comitiva chegou na Paraíba e no dia 5 de agosto selou a paz com os Tabajaras. Estava formada a aliança que poderia fazer frente aos franceses e aos Potiguaras”, destaca, lembrando que Tavares tinha a missão secreta de, após selar a paz, analisar possíveis locais para a construção de uma fortificação militar.

Martim Leitão, que segundo Guilherme D’ávila era o único que em nome do rei poderia decretar a fundação da nova cidade, só saiu de Pernambuco para a Paraíba no dia 15 de outubro, chegando à margem direita do Rio Paraíba apenas em 29 de outubro. “A partir da chegada do ouvidor-geral à região é que a cidade poderia ser fundada”, destacou Guilherme, dizendo que isto aconteceu apenas poucos dias depois.

Ele cita inclusive um relatório de 24 capítulos escrito por um jesuíta anônimo, que é classificado por ele como sendo “o documento primordial da conquista da Paraíba” e a “prova cabal” de que João Pessoa foi fundada em 4 de novembro. Eis um trecho do documento: “Com ter visto tudo muito bem e buscando o mato daquele sítio e tudo roçado e limpo, a 4 de novembro de 1585 se marcou o forte de 150 palmos de vão e quadra, com duas guaritas que jogam oito peças grossas uma a revés da outra e alicerces de pedra e cal para cujo princípio se fez de ostra e pedra”.

Guilherme D’ávila completa: “Aquela construção foi fincada no que hoje é o bairro do Varadouro e a partir dali foram se instalando os moradores que deram origem a cidade”.

A paz, contudo, só chegaria 14 anos depois, quando finalmente os portugueses conseguiriam “praticamente dizimar” os Potiguaras. “A conquista e fundação da Paraíba não foi algo simples e pacífico como alguns podem pensar. A situação era tão complicada que, em épocas de guerra contra os índios e já depois da fundação da cidade, ir à margem esquerda do rio era algo impossível”, revela D’ávila. E quando a guerra acabou e a primeira expedição cruzou o rio, em 1599, Frutuoso Batista, segundo governador da capitania da Paraíba, desabafou aliviado: “passamos por terras onde nunca um homem branco pisou antes”.