Mais de 470 paraibanos foram resgatados vítimas de trabalho escravo nos últimos anos

Publicação de portaria mudando a caracterização do trabalho análogo à escravidão pode agravar realidade, revela procurador do MPT-PB.

Pelo menos 478 paraibanos foram resgatados nos últimos anos vítimas do trabalho escravo, segundo dados do Ministério Público do Trabalho (MPT-PB). Essa realidade, no entanto, pode se agravar ainda mais, conforme explica o procurador e representante da Coordenação Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conaete) na Paraíba, Marcos Almeida, com a publicação da portaria nº 1.129/2017 pelo Ministério do Trabalho no Diário Oficial da União.
 
De acordo com a portaria publicada nesta segunda-feira (16), serão consideradas jornadas degradantes como trabalho análogo à escravidão, apenas se houver restrição de locomoção do trabalhador. “A portaria representa um retrocesso, uma violação ao que determina o próprio código penal em seu artigo nº 149, além de outros aspectos assumidos pelo país em tratados internacionais. O trabalho de enfrentamento passa a ser prejudicado diretamente com essa publicação”, ressaltou.  
 
A alteração também gera mudanças na divulgação da “lista suja” do trabalho escravo, que identifica o nome de empresas e pessoas que exploram o trabalho escravo como instrumento de vantagem. Antes, à lista era divulgada sem a necessidade de aprovação pelo ministro, com a nova portaria, a divulgação só pode acontecer mediante autorização. “No conceito contemporâneo da escravidão essa portaria beneficia claramente quem usa da ilegalidade para praticar o trabalho exaustivo. É inadmissível concordar com uma submissão do trabalhador numa condição degradante,  isso fere o direito da dignidade humana. Essa alteração vai reduzir a lista suja de empresas e afetar uma desigualdade social ainda maior”, explicou o procurador Marcos Almeida.
 
Em relação à realidade do trabalho escravo na Paraíba, o procurador disse que historicamente a mão de obra no estado é explorada. “Os trabalhadores paraibanos historicamente são explorados. Isso ocorre porque o próprio estado economicamente não oferece uma condição igual para todos. Se não existe serviço suficiente e igualdade, os trabalhadores acabam se submetendo a condições de exploração. É nesse cenário que ocorre a prática da ilegalidade”, concluiu. 
 
Os números do MPT na Paraíba são referentes ao relatório produzido pelo observatório digital do trabalho escravo no Brasil, divulgado em maio deste ano, em referência ao período dos últimos 14 anos. O relatório revela ainda que a cada seis dias, um paraibano é resgatado do trabalho escravo. Outros 362 trabalhadores residentes no estado também foram resgatados durante o período. No ranking nacional de monitoramento de resgate de trabalhadores em regime de escravidão, a Paraíba ocupa a 16º posição.
 
Presidente admite mudança
 
Diante da repercussão negativa e das pressões de diversos órgãos, o presidente Michel Temer admitiu que deve fazer modificações na portaria. Devem ser incorporadas sugestões feitas pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge.
 
“Ele [o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira] já esteve duas vezes com a doutora Raquel Dodge. Recebeu sugestões. É muito provável que incorpore várias”, relatou o presidente ao portal ‘Poder360’
 
Temer adiantou uma possível mudança. “Estabelecer no Ministério da Justiça- onde há uma delegacia da PF para crimes previdenciários e trabalhistas- uma delegacia de crimes do trabalho escravo”.