Aqui estamos todos nus

Projeto Vértice traz à João Pessoa o espetáculo ‘Amour, Acide et Noix’ com única apresentação gratuita nesta quarta-feira (18).

O imponente Teatro Santa Isabel reviveu seus tempos de glória sábado passado, quando lotou para ver a estreia de Amour, Acide et Noix na capital pernambucana.

Sem lugar na plateia, o público se acotovelava nos três andares dos camarotes, debruçando-se sobre os parapeitos prestes a despancar dos 12 metros de altura de um espaço com capacidade para 700 lugares.

A razão para tamanho alvoroço era um tanto ambígua. No palco, ao som de Vivaldi (1678-1741), quatro bailarinos desnudavam-se (no sentido menos metafórico da palavra) seguindo os movimentos musicais de um compositor que, além de ser reconhecido como o autor de ‘As quatro estações’, foi ordenado sacerdote aos 25 anos e deixou um pequeno número de obras sacras para a posteridade.

Os bailarinos eram da companhia de Daniel Léveillé, canadense considerado um dos profissionais da dança mais respeitados da atualidade.

Um gênio intransigente, Léveillé nunca abdicou da exploração coreográfica do nu, arte da qual Isadora Duncan (1877-1927) foi uma das grandes precursoras, rompendo com o dogmatismo do balé clássico trajando túnicas e tecidos transparentes que deixavam seus seios à mostra.

Espetáculo trazido à Paraíba pelo projeto ‘Vértice’, Amour, Acide et Noix (‘Amor, Ácido e Nozes’, em tradução livre) tem única apresentação hoje em João Pessoa, às 19h, com entrada gratuita.

A expectativa é que também o Teatro Santa Roza reviva seus áureos tempos com a nova temporada do projeto promovido pela Funjope, que entrou o mês de janeiro incluindo em sua programação atrações internacionais como Tercer Cuerpo, peça dos argentinos do Timbre4 que, segundo Nanego Lira, coordenador do ‘Vértice’, atraiu uma quantidade considerável de espectadores para sua única sessão, na semana passada.

Com a classificação etária de 18 anos, Amour, Acide et Noix tem como tema a solidão humana abordada sob a estética predominante da nudez que, para o crítico espanhol Francisco Calvo Serraller, "não é somente uma forma de arte, mas é a explicação ou a razão mesma de ser da arte ocidental: esse ponto ou intersecção dramática entre o natural e o celeste, entre o ideal e o real, entre o carnal e o espiritual, entre o corpo e a alma".

Recorrente na pintura, escultura e, mais recentemente, no cinema e nas artes performáticas, o nu tem subvertido paradigmas estéticos e morais desde a pré-história.

"Durante séculos o nu foi a forma artística por excelência no Ocidente, aquela capaz de expressar melhor os valores da cor e da matéria pictórica", assinala Javier Portús, outro estudioso do assunto em seu ensaio ‘Pasión por los desnudos’.