Cometa Neowise pode nos decepcionar. É hora de vê-lo

Cometa Neowise pode nos decepcionar. É hora de vê-lo

Chegou a hora de ver o cometa Neowise.

É nesta quinta-feira (23), leio nos jornais.

No Hemisfério Norte, ele proporcionou um belo espetáculo.

Repetirá o show para nós, os do Hemisfério Sul?

Tenho grandes dúvidas – digo baseado em um ou outro conhecimento que herdei do meu pai, que dedicou muito da vida dele à astronomia.

Aos seis anos, meu primeiro cometa foi o Ikeya-Seki.

Outubro de 1965, se não estou enganado.

Primeiro e mais belo.

Aliás, o único que realmente tinha cara de cometa.

Acordamos de madrugada, e lá estava aquele objeto deslumbrante no céu. Tal como vemos nas fotografias em livros e revistas.

O frio da madrugada me deixou com gripe. Foi o preço pago para ver o Ikeya-Seki. Mas valeu a pena. 55 anos se passaram, e estou eu aqui contando.

Em 1973, houve o Kohoutek.

Era uma promessa para o Natal daquele ano.

Diziam que ia desbancar o Halley, que passara em 1910 e voltaria em 1986.

Com suas cartas celestes (modelo BDCD, usadas para rastrear satélites artificiais nos anos 1960), meu pai acompanhou o Kohoutek usando seu modesto telescópio, na fase em que ainda não estaria visível com a vista desarmada.

Eu tinha 14 anos. Foram madrugadas inesquecíveis no fundo do quintal da nossa casa em Jaguaribe.

As observações, no entanto, logo mostraram o que sugeria a evolução do brilho do cometa: que ele não iluminaria as nossas noites natalinas, como de fato aconteceu.

Mas haveria 1986, desde sempre no nosso radar.

Era o ano da volta do Halley, o mais célebre dos cometas.

Ouvíamos os relatos impressionantes de 1910.

Minha avó materna, nascida em 1899, viu aos 11 anos em Bananeiras, quando a ausência de iluminação nas cidades ainda permitia ao homem ver o céu como ele de fato é.

O poeta Drummond, que era de 1902, viu aos oito anos e – claro – transformou a lembrança em poesia.

1986 chegou, e lá foi meu pai para o fundo do quintal, com seu pequeno telescópio e suas cartas BDCD.

Eu já tinha 27 anos. Fui junto.

O Halley ainda era aquele pontinho que se deslocava entre as estrelas.

Quando o brilho foi aumentando, chegaram as pessoas amigas, que nos visitavam na madrugada querendo ver o cometa.

Em sua fase de maior brilho, o Halley decepcionou.

Em 1986, ficou longe de repetir 1910 – me assegurou Dona Elvira, que testemunhou as duas vezes e iluminou nossa casa com a sua presença.

E chegamos ao Neowise.

É hoje. No máximo amanhã. Ou sábado.

Está mais perto da Terra, é verdade, mas está indo embora.

Parece não ter brilho suficiente para nos encantar.

Não é o único problema para os que querem vê-lo. Está muito próximo ao horizonte, logo depois que o Sol se põe.

E ainda há as nuvens do nosso inverno.

De todo modo, arrisquemos.

Os cometas são visitantes incríveis, vêm de muito longe e merecem a nossa reverência.