Tom Jobim encontra Moacir Santos nos arranjos afro-jazz de Mário Adnet

O bem-sucedido experimento resultou em dois discos de estúdio e em uma série de shows que rodaram o país em 2013.

Do encontro de dois grandes nomes da música brasileira, Antonio Carlos Jobim (1927-1994) e Moacir Santos (1926-2006), nasceu o projeto Jobim Jazz, que acaba de ganhar registro ao vivo, com lançamento em CD e DVD pela Biscoito Fino.

A cola que une essas duas instituições é o maestro, compositor e arranjador carioca Mario Adnet, que enxergou na música de Tom, a possibilidade de inserir a musicalidade afro de Moacir, registrando o bem-sucedido experimento em dois discos de estúdio (lançados entre 2007 e 2011).

Essa foi a base para a apresentação de uma série de shows que rodaram o país em 2013, flagrada pelas câmeras em São Paulo, onde o maestro Adnet conduziu a banda Ouro Negro (formatada para gravar Ouro Negro, de 2001) por 17 composições do Maestro Soberano (no CD, 14).

Para trazer a rica música de Jobim para o jazz, a formação que subiu ao palco do Auditório do Ibirapuera contou com 13 músicos. É bem próxima do que se conhece por uma big band, com um violão e uma percussão infiltradas em meio a guitarra, contrabaixo, bateria, piano e sopros.
“Depois que eu conheci a música do Moacir, isso mudou a minha vida, e muito. Eu vi um jeito de trabalhar diferente ali”, admite Mário Adnet, em entrevista, por telefone.

Com régua e esquadro na mão, o músico se debruçou sobre um universo que conhece bem. “Eu que já gostava demais do Jobim, já tinha trabalhado com ele, tinha feito o Jobim Sinfônico (2004), vi uma possibilidade de reconstruir a obra dele dessa maneira”, confidencia.

Adnet foi em busca das músicas que transitassem no universo afro-samba-jazz de Moacir. Acabou por extrair muito do que Jobim fez nos Estados Unidos, como ‘Antigua’, ‘Wave’, ‘Tema jazz’, construindo um repertório longe do óbvio, de hits fáceis (‘Só danço samba’ é a mais “pop” do repertório).

Pescou até canções obscuras, como ‘Polo Pony’ (originalmente, ‘Polo game’), composição que Jobim fez para a trilha sonora do filme O Mundo dos Aventureiros (1970), estrelado por Charles Aznavou. Na versão do Adnet, é a música do carioca que mais se aproxima da sonoridade do pernambucano, com uma forte semelhança com ‘Nanã’, o grande clássicos de Moacir Santos.

O projeto empregou, com desenvoltura, um naipe de saxofone, instrumento que, por razões que Adnet não soube responder, Jobim abandonou ainda nos primeiros anos de carreira, preferindo instrumentos mais doces, como trompa, trombone, flugelhorne e flauta.

“Eu fiz questão (de utilizar o saxofone) porque, na sonoridade do Moacir, a gente já ouve uma mistura muito doce, muito diferente através das somas do sax com os outros instrumentos, que dão resultados muito marcantes, doces”.

Convidada especial

O show é coroado com a participação da cantora Nana Caymmi. Ela sobe ao palco para cantar uma versão arrebatadora de ‘Derradeira primavera’, ‘Por causa de você’ e ‘Estrada do sol’. “Eu sabia disso”, devolve o maestro ao ouvir do repórter elogios a interpretação da cantora sobre a parceria de Jobim com Vinicius, já gravada por Nara Leão, Gal Costa e pela própria Nana. “Foi a primeira vez que ela cantou essa música com uma orquestra de sopros. Ela tava morrendo de medo”, revela.

Tom Jobim e Moacir Santos não esgotam nos projetos de Mário Adnet. “Inclusive, a gente viaja com esses shows, ‘Jobim Jazz’ e ‘Ouro Negro’, avisa, deixando escapar que ano que vem, vai comemorar os 90 anos do músico pernambucano com o lançamento de um novo disco com obras dele.