‘Renúncia seria admitir culpa; se quiserem me derrubem’, diz Temer

Presidente disse que não sabia que Joesley era investigado e negou prática de prevaricação.

O presidente Michel Temer afirmou que seria "admissão de culpa" renunciar ao mandato. "Se quiserem, me derrubem", disse o peemedebista em entrevista ao jornal ‘Folha de S.Paulo’ publicada nesta segunda-feira (22).

“Agora, mantenho a serenidade, especialmente na medida em que eu disse: eu não vou renunciar. Se quiserem, me derrubem, porque, se eu renuncio, é uma declaração de culpa”, afirmou.

Alvo de um inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF) por suspeita de corrupção passiva, obstrução à Justiça e organização criminosa, Temer enfrenta a maior crise política de seu mandato. Neste fim de semana, a Ordem dos Advogados do Brasil decidiu apresentar pedido de impeachment ao Congresso, onde a oposição já lidera um movimento pela saída do presidente.

A investigação é fundamentada nas delações dos donos da JBS. Joesley Batista gravou uma conversa com Temer, onde o presidente dá aval ao pagamento de propina para comprar o silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e também escuta um relato do empresário sobre obstrução de Justiça.

O presidente afirmou que a regra que ele próprio estabeleceu, de afastar ministro que virar réu, não vale para ele. “Não, porque eu sou chefe do Executivo. Os ministros são agentes do Executivo, de modo que a linha de corte que eu estabeleci para os ministros não será a linha de corte para o presidente”.

Temer afirmou que "num primeiro momento" não sabia que Joesley Batista era investigado, embora a JBS tenha sido alvo de três operações recentes do Ministério Público Federal e da Polícia Federal – a Cui Bono, a Sespis e a Greenfield.

Para Temer, a gravação de Joesley foi uma tentativa de induzir uma conversa. “Tenho demonstrado com relativo sucesso que o que o empresário fez foi induzir uma conversa. Insistem sempre no ponto que avalizei um pagamento para o ex-deputado Eduardo Cunha, quando não querem tomar como resposta o que dei a uma frase dele em que ele dizia: ‘olhe, tenho mantido boa relação com o Cunha’. [Eu disse] ‘mantenha isso’”, disse referindo-se a parte da ‘boa relação’.

O presidente negou que tenha prevaricado [deixado de agir] ao ouvir um empresário dentro de casa relatando crimes – no encontro, Joesley disse que vinha usando juízes e um procurador da República em seu benefício. “Eu ouço muita gente, e muita gente me diz as maiores bobagens que eu não levo em conta. Muita gente me diz as maiores bobagens que eu não levo em conta. Ele foi levando a conversa para um ponto, as minhas respostas eram monossilábicas”.

Sobre o encontro ter ocorrido fora da agenda oficial, à noite, o presidente afirmou ser tratar um hábito que não é ilegal. “Não é ilegal porque não é da minha postura ao longo do tempo. Talvez eu tenha de tomar mais cuidado. Bastava ter um detector de metal para saber se ele tinha alguma coisa ou não, e não me gravaria."

Perguntado sobre qual era sua culpa no caso, Temer respondeu ser a "ingenuidade". "Fui ingênuo ao receber uma pessoa naquele momento."

Durante a entrevista, Temer também foi perguntado sobre o fato de seu assessor, Rodrigo Rocha Loures, ter sido filmado com uma mala com R$ 500 mil entregue por um executivo da JBS. No encontro no Alvorada, dias antes, Temer havia dito que Joesley podia tratar de "tudo" com Rocha Loures.

O presidente alega que houve uma montagem desses fatos. "Vou esclarecer direitinho. Primeiro, tudo foi montado. Ele [Joesley] teve treinamento de 15 dias [para fazer a delação], vocês que deram [refere-se à Folha], para gravar, fazer a delação, como encaminhar a conversa", disse Temer. "O que [Joesley] fez? A primeira coisa, orientaram ou ele tomou a deliberação ‘Grave alguém graúdo’. Depois, como foi mencionado o nome do Rodrigo, certamente disseram: ‘Vá atrás do Rodrigo’. E aí o Rodrigo certamente foi induzido, foi seduzido por ofertas milaborantes e irreais".

Temer admitiu que Rocha Loures "errou, evidentemente" e que receber R$ 500 mil não é um gesto "aprovável", mas disse não se sentir traído, e considerou o o assessor como alguém "de muito boa índole".

OAB vai pedir impeachment

O conselho pleno da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) aprovou, na madrugada do domingo (21), por 25 votos a 1, entrar na Câmara dos Deputados com pedido de impeachment do presidente Michel Temer. A comissão especial da entidade disse que ele deve ser afastado por ter cometido crime de responsabilidade.

Em nota, o presidente da OAB, Carlos Lamachia, lembra que a instituição cumpre seu papel, "mesmo que com tristeza, porque atua em defesa do cidadão”.

Para os membros da comissão especial da OAB, Temer incorreu em crime de responsabilidade ao não informar às autoridades competentes o teor de parte da conversa que teve com o empresário Joesley Batista, dono da JBS, no Palácio do Jaburu. Joesley gravou a conversa e entregou cópias do áudio à Procuradoria-Geral da República, com quem firmou acordo de delação premiada, já homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Suspensão do inquérito no STF

Em um segundo pronunciamento desde o começo da crise, na tarde do sábado (20), Michel Temer anunciou que estava pedindo ao STF que o inquérito contra ele fosse suspenso até que a veracidade da gravação de Joesley Batista fosse confirmada. O ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato, autorizou perícia solicitada pelo presidente e decidiu levar o pedido de suspensão ao plenário. O julgamento acontece na quarta-feira (24).