EDUCAÇÃO
Crianças chegam até o 5º ano sem saber ler e escrever
Segundo os dados dos Indicadores do Censo Escolar do Ministério da Educação (MEC), em 2007, a Paraíba possui pelo menos 85 mil estudantes sem saber ler nem escrever.
Publicado em 20/09/2009 às 8:26
André Gomes
“Eu tenho vergonha dos meus amigos porque não sei ler direito. As vezes eles ficam rindo de mim”. O relato é do estudante Alison Silva Santos, de 15 anos, que estuda na Escola Municipal Augusto dos Anjos, no bairro do Cristo, em João Pessoa. Ele vive uma realidade comum a muitas crianças e adolescentes que chegam a até o 5º ano do ensino fundamental I com sérios problemas na leitura e na escrita. Segundo os dados dos Indicadores do Censo Escolar do Ministério da Educação (MEC), em 2007, a Paraíba possui pelo menos 85 mil estudantes sem saber ler nem escrever.
O levantamento mostra que o analfabetismo atinge um em cada quatro paraibanos com mais de 15 anos. Hoje na Paraíba, segundo dados parciais da Secretaria Estadual de Educação, existem 588.361 alunos divididos nas redes estadual e municipais dos 223 municípios, sendo 73.776 matriculados do primeiro ao quinto ano do ensino fundamental I e 113.295 do sexto ao nono ano do ensino fundamental II, na rede estadual. Já na rede municipal estão matriculados 254.863 do primeiro ao quinto ano e 146.385 do sexto ao nono ano.
Para se ter ideia da situação do sistema educacional, 31,2% dos estudantes nos anos finais do ensino fundamental, segundo dados do Ministério da Educação, são reprovados justamente porque chegam ao quinto ano do ensino fundamental I sem saber ler nem escrever, mas as novas formas de avaliação baseadas na Lei de Diretrizes e Bases (LDB) da Educação Nacional possibilitam que, mesmo sem uma formação adequada, os alunos sejam aprovados e passados para a próxima turma. Além disso, 48,8% das crianças e adolescentes matriculados no ensino fundamental I e II da rede pública da Paraíba cursam a série inadequada para sua idade, números que chegam a superar a média do País, estipulada em 31,2% e a do Nordeste, 44,7%.
A realidade vivenciada por Antônio, em João Pessoa, pode ser facilmente encontrada em qualquer parte do Estado. Aparecida Macêdo é professora em um colégio estadual há 25 anos no município de Princesa Isabel, localizado na região do Sertão paraibano. Segundo ela, é comum alunos no município chegarem a séries mais avançadas enfrentando dificuldades de leitura e escrita. Ela contou que um de seus alunos abandonou a escola por vergonha de não saber ler e escrever. “Uma certa vez eu fiz um ditado e ele escreveu de uma forma totalmente incompreensível que depois ele mesmo não soube ler o que escreveu”, disse, revelando que os novos métodos de avaliação dos alunos é preocupante uma vez que fica na responsabilidade dos professores alfabetizar um estudante em séries em que ele já deveria dominar a leitura e a escrita.
Para atenuar esse quadro, a LDB, de 1996, instituiu a chamada progressão continuada, hoje implantada em grande parte do País. A lei diz que o aluno deve ser avaliado ao final de um primeiro ciclo (do primeiro ao sexto ano) e num segundo (do sexto ao nono ano). A avaliação deve ser feita sem prejuízos ao aprendizado e levando-se em conta a frequência escolar. Quem repetir num dos dois ciclos, por exemplo, pode passar de ano pelo processo de “aceleração” (ou recuperação).
A psicóloga e especialista em educação Cenise Monte Vicente, ex-coordenadora do programa de combate à repetência escolar Acelera Brasil, do Instituto Ayrton Senna, também não poupa os professores. “Mesmo na quinta série, eles têm que saber alfabetizar. Não podem colocar a culpa só no sistema de avaliação, na família, no governo. O problema não está no sistema”. Para ela, o professor se encontra num estágio de “solidariedade inoperante”. “Eles se sentem impotentes para resolver o problema e acham que a solução está fora de seu âmbito. Não se sentem responsáveis”.
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