COTIDIANO
Antes de falar mal do funk, é preciso ouvir algumas coisas
Publicado em 23/10/2017 às 5:57 | Atualizado em 31/08/2021 às 7:44
"Funk-se quem puder É imperativo dançar Sentir o ímpeto Jogar as nádegas Na degustação do ritmo" (Gilberto Gil, Funk-se Quem Puder)
Num desses concursos para escolher fãs que seriam recebidos por Paul McCartney, um dos vencedores foi um rapaz que gravou uma versão totalmente funk de A Hard Day's Night.
Olhem ele aí, o de camisa branca.
McCartney postou o vídeo nas redes sociais.
Chamou sua atenção?
A minha, não!
O beatle Paul tem muita coisa funkeada nos seus discos.
Exemplos? Coming Up e Dress Me Up As a Robber. A primeira, de 1980. A segunda, de 1982. Ele sabe o que é funk.
Não só ele.
O maestro Leonardo Bernstein, grande músico erudito, fã do jazz e dos Beatles, também sabia.
Isto é funkeado!
É o que ele, ao piano, diz às cantoras líricas com quem aparece, num documentário, ensaiando, no seu apartamento no Dakota, em Nova York, para a gravação de West Side Story.
O vídeo é de meados dos anos 1980.
Miles Davis, um dos gênios consumados do jazz, era outro que sabia. Basta ouvir On The Corner, de 1972.
Vejam a capa.
Foi nesse disco que Gilberto Gil se inspirou para compor Essa É Pra Tocar no Rádio, gravada com Dominguinhos e o baixo estupendo de Rubão Sabino no nordestiníssimo Refazenda.
Tem muito funk em Quincy Jones, Stevie Wonder e Michael Jackson!
Tem também nos Rolling Stones! Black and Blue.
Tem no nosso inigualável Jorge Ben!
No Herbie Hancock de Head Hunters, notável demarcador de territórios.
E no bossanovista João Donato!
A Bad Donato, sua pshycodelicfunkyexperience.
Ah! Tem funk em tanta gente!
Por que, então, depreciamos o povo do Rio de Janeiro que releu o funk e, ao seu modo, fez deste uma das suas legítimas expressões?
Eu não deprecio!
Começo a semana com essas pequenas anotações estimulado pelo gesto de Paul McCartney.
Para ele, por muitos motivos, a versão funk de A Hard Day's Night feita por aquele rapaz é criativa, inteligente, tem conteúdo social, liberdade - vai muito além dos vídeos (mesmo os melhores) com covers dos Beatles fiéis aos originais.
Paul é um extraordinário músico popular do seu tempo e compreende bem todas essas coisas.
Por que nós, seus ouvintes, não podemos compreender?
Salve o funk!
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