COTIDIANO
A esquerda que me perdoe, mas FHC tem minha admiração
Publicado em 17/12/2018 às 7:29 | Atualizado em 30/08/2021 às 23:37
Não se iludam Não me iludo Tudo agora mesmo Pode estar por um segundo
O programa de 25 minutos começa com Gilberto Gil, sozinho ao violão, cantando Tempo Rei.
Sentado à sua frente, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso ouve.
Quando o programa foi gravado, meses atrás, FHC tinha 86 anos. Gil, 75. Agora, têm um ano a mais.
Na série Amigos, Sons e Palavras, realizada pelo Canal Brasil, Gil atuaria como entrevistador, recebendo convidados.
Mas ficou diferente: a rigor, não há entrevistado nem entrevistador. Gil e os convidados conversam.
Vi há pouco a sua conversa com Fernando Henrique.
O ponto de partida é Tempo Rei.
Gil diz, cantando, o que FHC passaria horas para dizer, falando - admite o ex-presidente.
A letra serve de mote.
A conversa tem arte, filosofia, religião, política, avanços tecnológicos, memória, velhice, amor, morte.
Tem um jantar com Sartre, os cuidados de Simone com o marido, marxismo, existencialismo, a França de 68.
Tem tanta coisa!
No final, há a lembrança de Dona Ruth e o comentário (cantado) de Gil:
Até o fim, eu vou te amar Até que a vida em mim resolva se apagar
Cerimonioso, Gil chama Fernando Henrique de professor. O ex-presidente diz que não precisa. E também atribui ao artista os méritos de um professor.
Depois que vi o programa, fiquei pensando em Fernando Henrique, com vontade de escrever algo sobre ele.
Lembro muito bem dele a partir da campanha de 1978. No velho MDB das lutas pela redemocratização. Numa sublegenda do partido, disputando o senado. O eleito seria Franco Montoro.
Um sociólogo de esquerda, um professor de esquerda entrando na política - assim era apresentado.
Sempre teve minha admiração.
Já há muitos anos, me causa espanto a virulência com que amigos de esquerda se referem a ele. Não deixam espaço para um elogio, para um reconhecimento, para uma defesa. Para a admissão das coisas positivas.
O argumento de que FHC direitizou-se tanto quanto o PSDB não me parece justo. Creio que é fruto do atual impasse brasileiro, de polarização e intolerância.
Fernando Henrique Cardoso tem um papel importante na construção da democracia brasileira. Os erros que a ele possam ser atribuídos não tornam menor esse protagonismo.
E, para além do político, há o homem que pensa o Brasil como poucos dos nossos políticos.
É bom ver a sua conversa com Gil. Ela aponta para tudo isso.
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