SILVIO OSIAS
Jair Bolsonaro encarna um dos momentos mais baixos da história do Estado nacional brasileiro
Publicado em 29/06/2021 às 6:46 | Atualizado em 30/08/2021 às 20:51
Uma conversa com o primo Petrônio Osias resultou nesse artigo que posto nessa terça-feira (28).
Professor de História, ele se debruça sobre um tema muito atraente: de que modo o Estado brasileiro está chegando aos 200 anos da independência.
Hoje, a coluna é dele.
2022 E O FRACASSO DO ESTADO NACIONAL BRASILEIRO
Petrônio Osias
Nasci no ano do sesquicentenário da independência do Brasil, quando os brasileiros lotavam as salas de cinema para aplaudir, de pé, Tarcísio Meira, interpretando D. Pedro I, ao gritar “independência ou morte” no filme homônimo de Carlos Coimbra. Aos 150 anos, o Estado brasileiro era governado por ditadores militares, vestidos como civis, que favoreciam a concentração de riquezas nas elites de sempre no período do “milagre brasileiro”.
Chegarei, quem sabe, aos 50 anos em 2022, quando o Estado brasileiro celebrará 200 anos sob o governo do autoritário Jair Bolsonaro, já em campanha por mais quatro anos de mandato. A julgar pelo momento atual, a opção que terão os que não compactuam com os delírios e desmandos do presidente da República, além da abstenção, será a recondução do ex-presidente Lula da Silva, homem que conseguiu a proeza de se ver livre de quatro condenações, em três tribunais diferentes, por dois crimes diferentes! Se a democracia se sustenta, dentre outros pressupostos, na confiança entre governante e governados, Lula da Silva não tem mais condições de governar.
Sílvio Osias lamenta o fato de Lula, principal nome da oposição a Jair Bolsonaro, significar que a esquerda brasileira não produziu nenhuma outra liderança plausível para se contrapor à direita, mais ou menos equilibrada, nos últimos 20 anos. Este historiador enxerga um problema maior: o Estado nacional, enquanto instituição responsável pela promoção do desenvolvimento e bem-comum do povo brasileiro, fracassa lamentavelmente há 200 anos!
Pedro I governou o Brasil entre 1822 e 1831. Abdicou por não ter apoio dos latifundiários do centro-sul, dentre outros fatores. Seguiram-se nove anos de regências, quando as elites locais se engalfinharam pelo poder e sufocaram rebeliões de miseráveis livres e escravizados. O governo de D. Pedro II estabilizou as elites agrárias no comando do Estado, donde sua longevidade: 49 anos. As mesmas elites voltaram-se contra a monarquia a partir do último quarto do século XIX, apoiando o Exército no golpe que inaugurou a república em 15 de novembro de 1889. À independência e à proclamação da República, o povo assistiu “bestializado”, na célebre definição do paraibano Aristides Lobo.
O Estado republicano conservou a vocação de estar a serviço das elites nacionais, obrigando uma parcela crescente da população a participar, ao longo do século XX, de eleições nas quais os interesses pessoais e de grupos de poder prevalecem sobre os coletivos. Quando a esquerda finalmente chegou ao comando do Estado nacional, no século XXI, empreiteiras e grupos políticos de todos os matizes mantiveram o loteamento estatal, a despeito de uma melhor distribuição de riqueza e oportunidades favorecidas, sobretudo, por uma conjuntura econômica internacional favorável.
Jair Bolsonaro encarna um dos momentos mais baixos da história do Estado nacional brasileiro. Escolher entre ele ou um líder de esquerda curvado ante as necessidades do único partido que sempre existiu no Brasil – o das classes proprietárias, na observação precisa de José Honório Rodrigues – e ainda emaranhado no cipoal jurídico brasileiro, sinaliza, para mim, que aprendemos pouco em 200 anos.
Não tenho dúvida: vivo, em 7 de setembro de 2022, meu sentimento será de tristeza.
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Petrônio Osias, graduado em História pela Universidade Federal da Paraíba, é professor há 26 anos.
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