SILVIO OSIAS
Chico Maria, do entrevistador que não poupava os entrevistados ao adorável companheiro de redação
Publicado em 14/02/2022 às 9:10 | Atualizado em 15/02/2022 às 9:22
Chico Maria perguntou a Luís Carlos Prestes como ele apertara a mão do homem - Getúlio Vargas - que entregara a sua mulher grávida aos nazistas para extermínio num campo de concentração. Prestes, claro, explicou a reconciliação à luz da política, como costumam fazer os líderes políticos.
Ao final da entrevista, Chico Maria perguntou se Prestes, um ateu, aceitaria um "vá com Deus" como despedida. O líder comunista disse que sim porque sabia que, para um homem que não era ateu, como Chico, a expressão tinha um caráter positivo.
Chico Maria morreu neste domingo (13) aos 92 anos. As primeiras lembranças que tenho dele são das grandes entrevistas que fez no Confidencial, na velha TV Borborema, de Campina Grande. Chico se revelou um entrevistador incrível - direto, forte, contundente quando necessário, corajoso. Seu programa fez história, é um marco da televisão paraibana.
Advogado, muitos anos antes, na condição de Chefe de Polícia (era a expressão da época), teve participação decisiva nas investigações do assassinato do líder camponês João Pedro Teixeira. Sempre achei que o entrevistador incisivo herdara algo do homem que atuara na segurança pública.
Convivi com Chico Maria a partir do momento em que veio para a TV Cabo Branco, em 1990. Foram quase 15 anos de convivência. Todos os dias, de segunda a sexta, ele estava ao vivo no Paraíba Meio-Dia. Chico e Nonato Guedes, formando uma dupla imbatível de entrevistadores.
No Paraíba Meio-Dia (ao vivo), mais tarde sozinho no Bom Dia Paraíba (em entrevistas gravadas), vi de perto Chico entrevistar grandes nomes. Um Ulysses Guimarães, um Leonardo Boff, um Antônio Houaiss, um Ariano Suassuna, um Zé Celso. Já vira, antes, ainda em Campina Grande, Pelé, Dom Hélder Câmara, Frei Damião.
Um fato notável é que havia uma diferença entre o entrevistador que, se fosse preciso, não poupava o entrevistado e o companheiro de redação. Nos bastidores, Chico era um doce de pessoa, uma figura adorável, papo excepcional, cheio de histórias para contar.
Sabedor do meu amor pela música, de vez em quando chegava na minha mesa e, baixinho, cantava um velho samba de Orlando Silva. Um dia, já entrou cantando: "Estrelas mudam de lugar/chegam mais perto só pra ver". Olhou pra mim e exclamou: "O Rei merece a Majestade!". Este era Chico Maria.
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