SILVIO OSIAS
Uma lembrança de 2018: tristeza no dia seguinte à eleição de Jair Bolsonaro
Publicado em 21/09/2022 às 9:32
Faltam 11 dias para o primeiro turno da eleição presidencial. Gosto de vasculhar a memória para pensar melhor no presente. Depois da redemocratização, somente duas disputas para presidente me deixaram verdadeiramente ansioso: a primeira foi a de 1989, aquela em que reconquistamos o direito da escolha pela via direta. A segunda é esta de 2022, quando o Brasil está colocado diante de dois cenários: a democracia e a negação desta.
Em 1989, quando o Brasil optou por Fernando Collor, eu era um jovem brizolista com expectativas que o tempo já desfez. Em 33 anos, de lá para cá, vimos avanços e retrocessos. Vimos as vitórias de um sociólogo de esquerda, um líder operário e uma antiga guerrilheira urbana, bem como a deposição de dois presidentes e a chegada da extrema-direita ao poder. Nesta quarta-feira (21), resgato um texto que escrevi no dia seguinte à eleição de Bolsonaro. Leiam.
Não tenho nenhuma lembrança da aventura chamada Jânio Quadros. Nos poucos meses em que ele governou, eu era um garoto de dois anos. O Jânio presidente era o que vi, durante alguns anos, na parede do meu avô materno. Ele e a vassoura com a qual prometia varrer a bandalheira. Tenho todas as lembranças da aventura chamada Fernando Collor. Eu já era um adulto de 30 anos quando ele se elegeu. A tristeza do dia seguinte à sua eleição dava conta da consciência que tínhamos - os que nele não votaram - do que nos esperava.
Eleição, na minha cabeça, é uma espécie de marcador de tempo. Quatro anos. Mais quatro. Mais quatro. Collor. Fernando Henrique. Lula. E, assim, nosso tempo vai passando. Nossas vidas vão passando. Pensei nisso, nesse marcador de tempo, naquele início de noite, em abril de 1985, quando vi, pela televisão, Dr. Ulysses discursando diante do túmulo de Tancredo. O que teríamos pela frente? Quem seriam os próximos depois de Sarney?
Gosto de antever cenários. A crônica política confunde desejo com realidade e compromete a capacidade da antevisão. As grandes lideranças políticas também cegam diante dos seus sonhos individuais de poder. Esse cenário de agora, de Bolsonaro presidente, era tão claro. Há tanto tempo. Mas, os que podiam fazer alguma coisa, nada fizeram.
A eleição de Bolsonaro lembra muito a de Collor. Pela incapacidade que o campo democrático demonstrou de construir um projeto viável. Pelo fanatismo de uma parcela expressiva dos que votaram no vencedor. Pelo discurso que levou os dois à presidência. O de Bolsonaro, ainda mais à direita do que o de Collor.
Jair Bolsonaro é o presidente eleito. Teve mais votos do que a Dilma de 2014. Fernando Haddad, o segundo colocado, teve menos votos do que o Aécio de 2014. O jogo democrático é assim. A oposição vai ter que se reinventar. Há uma necessária autocrítica a ser feita. Muitos de nós poderemos viver tempos sombrios.
Que Bolsonaro teremos na presidência? O da live que vimos assim que a vitória foi anunciada? Ou o do discurso lido em seguida, diante de um pool de emissoras de televisão? Um era diferente do outro. A soma dos dois sugere muitas interrogações. Os personagens encarnados pelo agora presidente eleito sugerem muitas incertezas. O tempo dirá o que será do Brasil.
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