SILVIO OSIAS
Erasmo Carlos morreu há um ano. O Tremendão era um verdadeiro gigante gentil
Publicado em 22/11/2023 às 8:09 | Atualizado em 22/11/2023 às 8:22
No domingo, 30 de outubro de 2022, enquanto eram apurados os votos da eleição presidencial, a mídia noticiou a morte de Erasmo Carlos. Não era verdade. Ele estava hospitalizado no Rio, mas estava vivo.
Erasmo ainda voltou para casa, foi hospitalizado novamente e morreu no dia 22 de novembro. Tinha 81 anos. Nesta quarta-feira, 22 de novembro de 2023, faz um ano da sua morte.
Não consigo ver/ouvir Erasmo Carlos sem pensar que ele é um dos grandes da música popular do Brasil. Muita gente não pensa assim porque faz, negativamente, associações dele e de sua música com a jovem guarda, o rock brasileiro e a parceria com Roberto Carlos - considerando tudo isso menor. Interessante. Os julgamentos que possam ser feitos, os negativos e os positivos, apontam, na realidade, para um dilema que desde sempre atingiu esse artista.
No começo, o rock, as baladas da virada dos 50 para os 60, soul music - tudo vindo dos Estados Unidos. Erasmo, Roberto, Tim Maia. Garotos pobres sonhando com o estrelato através da música. Tim Maia comeu o pão que o diabo amassou e esperou pelo sucesso por uma década. Roberto virou ídolo da juventude da noite para o dia, e Erasmo foi junto. Jovem guarda. Uma explosão nacional via televisão. Um sonho que parecia ser duradouro, mas foi brevíssimo.
Sim. E o dilema de Erasmo? E agora, fazer o quê? O caminho de Roberto Carlos, ele escolheu e seguiu com êxito absoluto pelas décadas seguintes. A parceria com o Rei garantia a conta bancária do Tremendão, mas não o satisfazia como homem da música. Esse é o cara da Festa de Arromba, do tempo da jovem guarda? Esse é o companheiro de Roberto Carlos, que assina canções numa parceria em que ninguém sabe qual o papel que cada um desempenha?
"Preciso acabar logo com isso/preciso lembrar que eu existo" - um pouco como na letra de Sentado à Beira do Caminho, linda balada que a gente ouvia no rádio ou naquele disco compacto da RGE. O que Erasmo parecia querer mesmo era dizer: eu sou um autor de canções - roqueiro, sim - e quero ser acolhido pela turma da chamada MPB, porque o que eu faço também é MPB.
Isso já está se definindo naquele disco Erasmo Carlos e Os Tremendões, de 1970, e se confirma no álbum seguinte, Carlos, Erasmo, de 1971. Nos anos 1970, há três discos maravilhosos: Sonhos e Memórias, 1990 - Projeto Salva Terra e Banda dos Contentes. Depois vieram os grandes sucessos populares: Mulher, Minha Superstar, Mesmo que Seja Eu e Pega na Mentira. E, o tempo todo, dezenas e dezenas de hits inesquecíveis assinados com Roberto e gravados por este.
É pouco? Claro que não! Sim. Mas, e o dilema? Quem é Erasmo Carlos? A que "igrejinha" da música brasileira ele pertence? É um sobrevivente da jovem guarda que teve a sorte de ser parceiro de Roberto - "seu amigo de fé, irmão, camarada"? É uma das estrelas do rock brasileiro? É um autor de canções em quem também cabe o rótulo de MPB? Erasmo resolveu o seu dilema? Sinceramente, não faço ideia.
Para mim, esse cara é um dos grandes da música popular do Brasil, além de, muito provavelmente, a mais consistente encarnação do rock nacional. É o eterno Tremendão. É o cara que tanto faz um rock incrível como Sou Uma Criança Não Entendo Nada quanto um samba buarqueano como Cachaça Mecânica. Ou um grito ambientalista como Panorama Ecológico.
Há pouco mais de 10 anos, Erasmo Carlos gravou três excelentes discos só com canções inéditas - algo pouco comum na idade que tinha. O primeiro se chama Rock'n' Roll. O segundo, Sexo. Imaginei que o terceiro seria Drogas. Que Nada! É Gigante Gentil.
Estive com o Tremendão três vezes nesses encontros e papos breves de camarim, e ele era um amor de pessoa. Gosto de dizer que ele é um dos grandes da nossa música popular. Erasmo Carlos foi um verdadeiro gigante gentil!
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