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SILVIO OSIAS

Se tivesse abandonado a música na juventude, Chico Buarque já seria um gigante da MPB

Cancioneiro produzido nos anos 1960 coloca o compositor ao lado dos maiores.

Publicado em 05/06/2024 às 8:34


				
					Se tivesse abandonado a música na juventude, Chico Buarque já seria um gigante da MPB
Foto/Reprodução.

Chico Buarque vai fazer 80 anos no dia 19 de junho. Na coluna desta quarta-feira (05), escrevo sobre a sua discografia, destacando as músicas compostas na década de 1960 pelo jovem Chico.

Em 1968, aos 24 anos, Chico Buarque gravou uma música chamada O Velho. “O que é que tem de novo pra deixar/nada/só a caminhada longa/pra nenhum lugar”. Ou: “eu vejo a triste estrada/onde um dia eu vou parar”. Um jovem escrevendo sobre a velhice. Versos belos e surpreendentes que nos ocorrem agora. Junto a lembrança a uma outra do jovem Chico: a quantidade de grandes músicas que ele gravou entre os 22 e os 24 anos, em apenas três discos.

Naquela época, era muito comum o disco ter o nome do artista. Chico Buarque de Hollanda volume 1 (1966), Chico Buarque de Hollanda volume 2 (1967) e Chico Buarque de Hollanda volume 3 (1968). Os três, lançados pela RGE em plena era dos festivais, a partir do sucesso que alcançou ao vencer um deles com A Banda.

Vale a pena enumerar, recorrendo exclusivamente ao que está arquivado na memória afetiva, sem qualquer consulta: A Banda, Tem Mais Samba, A Rita, Madalena Foi pro Mar, Pedro Pedreiro, Olê, Olá, Meu Refrão, Sonho de um Carnaval, Noite dos Mascarados, Com Açucar, com Afeto, Quem te Viu, Quem te Vê, Morena dos Olhos D’Água, Ela Desatinou, Retrato em Branco e Preto, Januária, Carolina, Roda Viva, Até Pensei, Sem Fantasia, Até Segunda-Feira, Funeral de um Lavrador.

Somemos a estas Sabiá, que é de 1968, mas não está no disco daquele ano. São 22 músicas. Todas gravadas entre os 22 e os 24 anos. Se Chico Buarque tivesse se aposentado em 1968, seu legado seria um songbook extraordinário. À altura dos maiores clássicos do nosso cancioneiro popular.

Se estendermos a lista até 1970, quando troca a RGE pela Philips e grava o último disco usando o “ de Hollanda” no nome artístico (Chico Buarque de Hollanda volume 4), acrescentaremos, então, Essa Moça Tá Diferente, Agora Falando Sério, Gente Humilde, Rosa dos Ventos, Samba e Amor, Pois É.

E, claro, há o single de 1969, ainda pela RGE, com Umas e Outras. Entre 1966 e 1970, dos 22 aos 26 anos, em quatro discos, 29 músicas absolutamente antológicas.

Em 1971, passa a assinar apenas Chico Buarque. O bigode na capa do disco tira um pouco o ar de bom moço. Os sons o aproximam da linha evolutiva proposta pelos tropicalistas. Ao seu modo. Sobretudo na faixa Construção, arranjada pelo mesmo Rogério Duprat dos discos de Caetano, Gil, Gal e Mutantes.

Construção é uma obra-prima. Um samba lento que vai crescendo até o desfecho. Os versos finalizados sempre com proparoxítonas que, na segunda e na última parte, são trocadas de lugar, gerando imagens absurdas, delirantes, inacreditáveis.

O disco Construção pode ser o melhor de Chico. Deus lhe Pague, Cotidiano, Desalento, Cordão, Olha Maria, Samba de Orly, Valsinha, Minha História. Parece uma coletânea.

Os anos 1970 foram os mais produtivos. Apesar da censura. Construção (1971), Quando o Carnaval Chegar (1972), Calabar (1973), Sinal Fechado (1974), Meus Caros Amigos (1976), Chico Buarque (1978), Ópera do Malandro (1979), Vida (1980). Mais dois discos ao vivo. Um com Caetano Veloso, outro com Maria Bethânia.

Os anos 1980 são menos produtivos. O artista compõe e grava menos. Trabalha muito com Edu Lobo, o novo parceiro. Fica mais sofisticado. As canções continuam belas. O Grande Circo Místico é uma estupenda coleção de canções. Anos 1990 e além. Um livro, um disco, uma turnê. Nesta ordem. A morte da canção? Tese dele.

Na maturidade e já na velhice, Chico fez discos refinadíssimos, de assimilação mais lenta. E não compôs tantos clássicos instantâneos como os da juventude.

Foto/Reprodução

Silvio Osias

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