COTIDIANO
Governo Federal desapropria terras de antigo engenho para regularizar terreno quilombola em Areia
A ministra Anielle Franco (Igualdade Racial) ao lado do presidente Lula: recorde de assinatura de decretos voltados para a questão dos quilombolas.
Publicado em 21/11/2025 às 13:05

O Governo Federal publicou decreto nesta sexta-feira (21) a desapropriação de terras abrangidas por territórios quilombolas do Engenho Mundo Novo, em Areia, no Brejo paraibano. Após a publicação do decreto presidencial, o Incra fica autorizado a realizar vistorias e avaliações de preços para o pagamento prévio à desapropriação em dinheiro aos proprietários, dentro da disponibilidade orçamentária e financeira da União.
A comunidade foi reconhecida oficialmente como remanescente do povo escravo por meio de um Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) emitido em 2015.
De acordo com o último censo do IBGE, de 2022, no local existem 27 famílias, totalizando aproximadamente 170 pessoas, em uma área de cerca de 322 hectares.
Para a cientista social Francimar Fernandes, presidente da Associação de Apoio aos Assentamentos e Comunidades Afrodescendentes da Paraíba (Aacade/PB), o sentimento é de justiça. "Finalmente foi feita justiça a um povo que sofreu com escravização 'recente'", diz.

De acordo com informações do relatório antropológico do RTID da comunidade, ela é formada por descendentes dos primeiros trabalhadores da antiga fazenda Engenho Mundo Novo que, após a morte do proprietário e a desestruturação do imóvel, permaneceram nas terras onde nasceram e nas quais vivem e trabalham há pelo menos quatro gerações.
A fazenda era composta por grande área de plantio de cana-de-açúcar, de pasto para a criação de animais de tração (boi, cavalos e muares), pela casa grande – complexo que contava com diversas edificações –, e pelo engenho propriamente dito, além da área destinada à habitação e subsistência dos trabalhadores.
Alguns moradores se estabeleceram nas terras dos engenhos da família como moradores livres, outros são descendentes de antigos escravos da família e trabalhavam em seus engenhos de rapadura e aguardente, sobrevivendo da agricultura e pecuária de subsistência praticada em pequenos lotes.
A comunidade foi reconhecida como remanescente de quilombo pela Fundação Cultural Palmares em outubro de 2009, quando também foi aberto o processo de regularização fundiária do seu território junto ao Incra.
De acordo com o relatório antropológico, a comunidade foi formada por José Maria da Cunha Lima em parte das terras de seu pai, o major Manoel Gomes da Cunha Lima.
As famílias da comunidade são descendentes dos primeiros trabalhadores do engenho de rapadura e cachaça que, após a morte de Roberto Cunha Lima (herdeiro de Manoel), e a desestruturação da fazenda, permaneceram como moradores e agregados nas terras onde vivem e trabalham há pelo menos sete gerações.
Os relatos feitos pelas famílias da comunidade durante a construção do relatório revelaram que as condições de vida e de trabalho no engenho eram difíceis, repletas de cerceamentos e de obrigações, ou condições. Os mais velhos da comunidade contaram aos antropólogos responsáveis pelo estudo que, na época da escravidão, o trabalho no canavial começava às 6h da manhã e se estendia, às vezes, até a meia-noite.
Ainda segundo o relatório antropológico, atualmente, alguns membros do grupo trabalham na cidade de Areia como empregadas e lavadeiras e realizando pequenas empreitadas, mas a principal atividade econômica da comunidade ainda é o cultivo da terra com a utilização de instrumentos manuais e de tração animal.
As famílias cultivam principalmente macaxeira, mandioca, milho, batata-doce, cana-de-açúcar, jerimum, feijão, maxixe, chuchu e quiabo. Duas famílias cultivam pequenas hortas para venda externa e alguns moradores iniciaram recentemente plantios de laranja, pepino e melão.
A produção excedente segue para a cidade de Areia em carroças ou no lombo de animais para ser vendida diretamente aos consumidores ou a atravessadores

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