No município de Teixeira, no Sertão paraibano, poucos moradores sabem que há uma escola sendo construída há quase uma década no fim de uma rua afastada do centro. “Sei não”, respondeu a feirante Maria José ao ser perguntada sobre a obra.
O ambulante José Orlando disse apenas que “ouve falar”, mas não sabe quanto já foi investido. Josefa, outra moradora, resumiu o sentimento geral: “Faz muitos anos... não sei quanto gastaram, mas foi muito dinheiro”.
A escola começou a ser construída em 2015 e, segundo dados do Tribunal de Contas da União (TCU), já consumiu quase R$ 3 milhões sem que nenhum estudante tenha sido atendido. A estrutura, projetada para 12 salas em uma área de 3 mil metros quadrados, hoje está tomada pelo mato e pela deterioração.
Ao entrar no espaço, vê-se um pátio amplo que nunca recebeu alunos, bancos que jamais foram usados e salas comprometidas por infiltrações e falhas estruturais. A situação é tão grave que técnicos do Ministério da Educação condenaram toda a construção após uma tentativa de retomada.
“Infelizmente, corre o risco de desabar”, afirmou o secretário de Finanças do município, Renato Marques. Segundo ele, a perícia do FNDE identificou “vício construtivo de engenharia”.
O laudo técnico, emitido em 2021, apontou fundações e pilares com dimensões e ferragens incorretas, ausência de vigas e passarelas previstas no projeto, a construção em local diferente do planejado e falhas graves de concretagem.
Parte do que foi pago, como muretas, alvenarias e janelas, sequer chegou a ser executado. Mesmo assim, conforme os auditores, a prefeitura pagou R$ 2,9 milhões, cerca de 85% do valor total, embora apenas 45% da obra tenha sido realizada.

A Justiça Federal condenou o ex-prefeito Edmilson Alves dos Reis, conhecido como Nego de Guri, por improbidade administrativa. A decisão afirma que ele autorizou pagamentos indevidos, sabia que a obra era executada por terceiros e não pela empresa contratada, e participou de um esquema de fraude e desvio de recursos públicos.
O rombo chegou a R$ 1,4 milhão. O ex-gestor e a empresa envolvida — também condenada — negam as acusações e recorrem.
Para a secretária de Educação de Teixeira, Marileide Justino, o prejuízo maior é social. “Isso nos traz uma tristeza danada. São várias crianças que deixaram de estar ali, tendo um direito que é delas, perdido.”
Belém do Brejo do Cruz: creche parada há anos deve custar quase o dobro

Depois de duas horas de viagem saindo de Sousa, a reportagem chegou a Belém do Brejo do Cruz para verificar a situação de uma creche iniciada em 2021 com recursos federais. O local está abandonado: o portão quebrado, mato alto e aparência de obra largada. A placa informa que a construção deveria ter sido concluída em dezembro de 2021, o que não aconteceu.
A obra foi orçada em R$ 1,5 milhão, mas nem a gestão atual nem a anterior informaram quanto já foi gasto. O ex-prefeito Evandro Maia, ao saber da presença da reportagem, foi até o local. Ao ser questionado sobre o motivo da paralisação, respondeu: “Foi um problema com a empresa”. Perguntado se sabia exatamente o que ocorreu, afirmou apenas: “Parou porque a empresa falou que não dava”.
Moradores lamentam a demora. Joaquim Leite da Silva destacou que a creche faria diferença para muitas famílias: “Aqui ia deixar mais de 200 mães de família procurando serviço e as crianças aí. A gente é quem paga, né? E não sou só eu, é todo mundo. Uma obra dessa era pra tá funcionando”.

A prefeitura afirma que a obra finalmente será retomada ainda este ano. Segundo o prefeito Leomar Maia, após a repactuação com o governo federal, uma nova empresa venceu a licitação. “Nos próximos dez dias a obra será retomada”, disse. O valor atualizado é de R$ 1,117 milhão, e o prazo estimado para conclusão varia de dez meses a um ano.
Para muitos moradores, isso representa esperança. A dona de casa Ana Francisca explica que as crianças do bairro precisam ser levadas para outra região da cidade. “O ônibus vem pegar e deixar... mas se tiver aqui vai andando. Para as mães que não têm com quem deixar, uma creche facilita tudo.”
Bayeux: creche vira ruína após mais de dez anos de abandono

No Conjunto Mariz, em Bayeux, a tranquilidade de ter uma creche perto de casa se transformou em ruína. Tomada pelo mato e pela ação do tempo, a estrutura inacabada revela o abandono de um convênio firmado em 2014 entre a prefeitura e o governo do estado, no valor de R$ 646 mil. Em 2017, o acordo foi encerrado sem que a obra tivesse sido concluída.
Desde então, todo o telhado desapareceu e a degradação se intensificou.
De acordo com dados da Controladoria-Geral do Estado, já foram gastos R$ 194 mil na construção da creche. A atual gestão avalia se há condições técnicas para retomar a obra ou se será necessário demolir a estrutura existente e iniciar um novo projeto no local.
A única certeza é que centenas de crianças deixaram de ser atendidas.
Maria Clara, dona de casa, diz que a filha de quatro anos não conseguiu estudar na creche e precisou ser matriculada no bairro Mutirão, a 20 minutos a pé. A balconista Amanda Laureano reforça o sentimento de frustração: “Todo mundo aqui desse bairro tem que ir para o Mutirão, tendo essa estrutura aí que poderia ajudar. A gente fica muito triste, porque quer o melhor para os filhos. Poderia tá cheio de criança, a gente trabalhando…”

O que dizem os citados
A Secretaria de Estado da Educação informou que não dispõe de detalhes sobre a obra da creche em Bayeux, por se tratar de um convênio firmado em gestões anteriores, o que impossibilita esclarecer a situação atual do projeto.
Um levantamento realizado pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) em 2018 identificou irregularidades na licitação e pagamentos indevidos superiores a R$ 84 mil. No relatório, o TCE apontou que gestores municipais e estaduais deveriam ser responsabilizados pelas falhas constatadas.
Até o fechamento desta reportagem, o Ministério Público da Paraíba (MPPB) não tinha informações sobre procedimentos instaurados para apurar responsabilidades ou investigar as irregularidades relacionadas à obra.
No caso da escola que será demolida em Teixeira, a defesa do ex-prefeito Nego de Guri informou que ajuizou uma ação contra a empresa responsável pela obra, em razão das irregularidades identificadas. A empresa M&M Construções, condenada junto com o ex-gestor, não foi localizada pela reportagem para comentar o assunto.
Já a Prefeitura de Belém do Brejo do Cruz informou que a obra da creche deve começar na segunda quinzena de janeiro.”






















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