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CULTURA

Ecos da Revolução de 30 - História da Paraíba

Revolução de 1930 não aconteceu assim que João Pessoa foi assassinado, de modo imediato, em julho daquele ano. A tomada de poder só veio acontecer em outubro.

Publicado em 25/07/2010 às 16:02

Astier Basílio
Do Jornal da Paraíba


Ao contrário do que possa parecer, a Revolução de 1930 não aconteceu assim que João Pessoa foi assassinado, de modo imediato, em julho daquele ano. A tomada de poder só veio acontecer em outubro, com as tropas dos revolucionários promovendo a deposição do presidente Washington Luís e garantindo a ascensão ao poder de Getúlio Vargas, candidato a presidente na Aliança Liberal, em cuja chapa - que havia sido derrotada nas urnas - João Pessoa figurava como vice-presidente.

Na Paraíba, após o assassinato do presidente (era assim chamado o governador naquele tempo), o comando da Revolução ficou nas mãos de José Américo de Almeida. Sedições, tramas para tomada de poder, laços de família e intrigas, eis os ingredientes históricos palpáveis à vista de qualquer um. Quem percebeu o potencial trágico e, mais do que isso, enxergou uma ligação dos acontecimentos de 1930 com a famosa peça de Shakespeare, Hamlet, foi o escritor W. J Solha. Ao ler Hamlet e o Complexo de Édipo, de Ernest Jones, Solha encontrou a inspiração para escrever um ensaio “com estrutura de romance policial” intitulado Zé Américo Foi Princeso no Trono da Monarquia, em que estabelecia conexões entre os fatos sangrentos da história da Paraíba, a peça do Bardo inglês, mas o romance A Bagaceira e alguns livros de memória, escritos por José Américo.

“Falar sobre 30 desperta paixões na Paraíba, sim”, observa Solha. No final dos anos 70, o escritor partiu para a casa de José Américo munido dos originais. A recepção não foi das melhores. “Ele (José Américo) me recebeu aos gritos, proferidos entre dentes cerrados - como era de seu jeito - quando fui ler os originais para ele, no terraço daquela que hoje é a sede da Fundação Casa de José Américo. Sabendo que seria recebido assim, tomei um tranquilizante ao sair para lá, pois não queria - sob hipótese alguma - também perder a calma”, historia. Solha lembra bem daquele encontro. “Baixinho, cabelos ralos, paletó bastante usado, com o forro de seda saindo um pouco das mangas, avançou para mim de dedo para o alto: ‘Quem foi que lhe meteu na cabeça essa ideia louca de que eu queria a morte de João Pessoa?!!!’”.
Mas o que o irritara, mesmo, recorda Solha, fora a conclusão do autor do ensaio de que a causa de sua trama era o complexo de Édipo, contexto de que Américo tomara conhecimento através de Gonzaga Rodrigues, “que articulara - a meu pedido - esse encontro, e que conhecia meu livro, que eu pretendia publicar pela editora Acauã, que ele tinha com o Nathanael Alves. Gonzaga era - e ainda deve ser - dedicadíssimo ao ‘Ministro’, e se revoltara com isso tanto quanto - presumo - o próprio Velho”, recorda Solha.

Ainda na casa de José Américo, W.J. Solha informa que o anfitrião não permitiu que ele lesse os originais. “Não tenho tempo pra isso, pois enquanto aqui me atacam, vou receber uma homenagem em Manaus!”. Ao ouvir isto, Solha respondeu: “Não estou atacando o senhor - eu disse. Não sou paraibano, nasci onze anos depois da revolução de 1930, não tenho nenhum envolvimento emocional com nada disso. Estou aqui apenas por pura curiosidade intelectual”.

Ainda matutando sobre as ligações entre Shakespeare e José Américo, Solha informa que publicou em A União um artigo com o título “Existe algo de podre no reino do Marzagão” - Marzagão é a fazenda de Dagoberto e Lúcio - “e eu soube, por um colega do BB, onde eu trabalhava, cujo pai era o do círculo próximo do escritor, que o Homem se revoltara com o texto: ‘Está me acusando de plágio!!!’ Mas não era isso que eu dizia. Tratava-se, evidentemente, de um caso de intertextualidade”.

Para participar do documentário O Homem de Areia, de Vladimir Carvalho, Solha releu O Ano do Nego, de José Américo. “Tive um alumbramento: Ele foi mais hamletiano na vida real do que na ficção, e literalmente dentro de um palácio, o da Redenção!!!”A partir daí, Solha juntou A Bagaceira e O Ano do Nego com Hamlet e o Complexo de Édipo, mais um livro de memórias da infância de Zé Américo - Antes Que me Esqueça.

Para Solha, A Bagaceira, romance publicado em 1928, prefigura a eclosão do conflito armado de 30, na Paraíba. “João Pessoa acolheu como seu Secretário da Segurança um homem que era um perigoso alter ego de Lúcio Marçau”, avalia. “Por sinal, entre as muitas ligações de Lúcio com Hamlet está esse seu nome. A história de Hamlet tem por base um episódio igualmente revolucionário de Roma: aquele em que, vendo o rei, seu pai, assassinado, Lucius Junus se finge de doido para poder escapar com vida e poder vingá-lo. Lúcio Marçau também é visto com sinais de loucura no Marzagão. E Zé Américo conta, em O Ano do Nego, que... ao ver que João Pessoa não queria nem pensar numa revolução, diz : ‘Ai de mim. Tive, então, de afivelar uma máscara no rosto’...”

Na opinião do escritor, um dos momentos mais emocionantes dessa história toda foi aquele em que, trabalhando na agência centro do Banco do Brasil, viu, por trás dos vidros, José Américo, em pessoa, saindo do elevador com Lourdinha. “Ele se sentou num banco ao lado da porta, ela veio falar comigo. Foi com lágrimas correndo no rosto que me disse: - Ele quer que você publique seu livro enquanto está vivo, para que possa responder tudo, tintim por tintim”.

Devido a um atraso com a Civilização brasileira, que prometera editar o livro, Solha resolveu, antes de lançar o livro, publicar a obra em capítulos no jornal semanário O Momento. “Zé Américo, porém, não me revidou, como seria de se esperar”.

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Jornal da Paraíba

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