VIDA URBANA
Com mais de 3.800 logradouros, apenas 438 ruas de CG têm nome de mulher
Malvinas é o bairro que possui mais vias com nome feminino: são 44 do total de 232 na localidade.
Publicado em 27/03/2016 às 8:00
A história vem provando como a força das mulheres tem sido decisiva para o desenvolvimento. São profissionais, pesquisadoras, ativistas e estão presentes também na política. Muitas delas protagonizaram episódios marcantes na história de Campina Grande ao longo dos anos, entretanto, apesar de 'construtoras da cidade', poucas foram escolhidas para dar nome às ruas onde hoje caminham outras mulheres com igual ou maior importância social.
É só circular por Campina Grande, com um olhar curioso para as placas das vias para perceber isso. Aquelas que estão dedicadas a alguma pessoa concreta, referem-se, em ampla maioria, a homens. São 3.861 logradouros na cidade e só 438 têm nomes de mulher. Ou seja, 11,3% do total. Desse tímido percentual, 17 ruas referem-se a religiosas, e possuem as denominações de Virgem, Nossa Senhora ou Santa, sendo a maior parte no bairro da Liberdade.
O bairro mais populoso da cidade, as Malvinas, com 38.713 habitantes, é também o que possui mais ruas com nomes de mulheres, 44 de um total de 232. Lá, até a rua principal leva um nome feminino: Jamila Abraão Jorge. No entanto, mesmo que seja a rua principal, os moradores do local desconhecem quem foi Jamila. “Moro aqui há 30 anos e não sei quem é, mas gostaria de saber da história de quem deu o nome à rua que moro há tanto tempo e que é tão presente na minha vida”, disse o aposentado e morador Antônio Inácio Tavares.
A nossa reportagem andou de um canto a outro da rua e constatou o mesmo desconhecimento também por parte de outros moradores, mesmo sendo Jamila uma das maiores homenageadas do bairro. Mas, para quem não sabe, Jamila nasceu em Israel e depois se mudou com seus pais para Campina Grande, onde era doméstica. Uma breve descrição de sua vida está presente no livro Memorial Urbano de Campina Grande'. Consta na obra que mesmo depois de 50 anos no Brasil, Jamila ainda tinha dificuldades com a língua, possuía muitos amigos e era conhecida por 'Comadre Caú'.
Organizador do livro, o memorialista José Edmilson Rodrigues, confirma o desequilíbrio. “Dentre os nomes e histórias das ruas catalogadas, cerca de 1.500, são realmente poucas as homenagens às mulheres que tiveram papel relevante na cidade ou no bairro onde residiam. Sem falar que nesses casos muitas vezes a mulher foi homenageada dada à condição de ter algum parentesco ou relação com homens que eram líderes, personalidades políticas, por exemplo”, comentou. Ainda segundo Edmilson, quase nenhuma das vias com nome de mulher corresponde a avenidas, centros de atividade, de comércio ou locais históricos da cidade, e sim a espaços 'menos visíveis'.
Para a antropóloga Elizabeth Lima, este fato demonstra que a presença das mulheres, a nível simbólico, é desproporcional e simboliza os reflexos de uma sociedade machista. “Essa invisibilidade da presença da mulher no espaço público é algo histórico no Brasil, não somente em Campina Grande. As mulheres sempre tiveram uma contribuição na sociedade, mas seus nomes foram ocultados. Os nomes de homens predominam porque a mulher costumava ser destinada ao espaço do privado. Ela era educada para ser esposa e mãe. Essa ausência de nomes femininos que tiveram destaque é um fato extremamente visto em todo o país e se deve muito a essa divisão de gênero que sempre foi tão forte”, comentou.
Câmara de vereadores
Os nomes das ruas de uma cidade são definidos pela Câmara dos Vereadores, mas a decisão dos nomes, embora seja dos vereadores, nem sempre parte deles. A comunidade pode fazer esta sugestão levando em conta o nome de uma pessoa que foi importante para aquela comunidade e agora eles desejam prestar uma homenagem póstuma e manter a memória das pessoas com o nome de alguém que teve importância para a comunidade. Um detalhe importante é que na maioria das cidades brasileiras, os nomes de ruas só podem ser atribuídos a pessoas já falecidas.
- DEZ BAIRROS COM MAIS RUAS EM CG:
Malvinas - 232 ruas;
Serrotão - 134 ruas;
Catolé - 125 ruas;
Três Irmãs - 124 ruas;
Bodocongó - 105 ruas;
Velame - 102 ruas;
Cruzeiro - 92 ruas;
Jardim Paulistano - 92 ruas;
Presidente Médici - 74 ruas;
José Pinheiro - 73 ruas.
- DEZ BAIRROS COM MAIS NOME DE MULHERES:
Malvinas - 44;
Serrotão - 24;
Velame - 23;
Bodocongó - 22;
Três Irmãs - 21;
Dinamérica - 20;
Cruzeiro - 17;
Catolé - 16;
Nova Brasília - 15;
Sandra Cavalcante - 15.
Conheça a história de algumas mulheres que dão nomes às ruas de Campina Grande:
Alaíde de Araújo Medeiros – Santa Rosa.
Nasceu em Campina Grande em 1921 e faleceu em 1985. Prestou serviço como enfermeira à comunidade local.
Alice Gaudêncio – Santo Antônio.
Nasceu em 1926, filha de Álvaro Gaudêncio Correia de Queiroz e Quitéria Lucas Gaudêncio. Faleceu em 1959.
Ana Paula de Medeiros – Bodocongó.
Natural de Campina Grande, nasceu em 1969. Foi assassinada aos 18 anos, em Recife, Pernambuco, enquanto era estudante universitária.
Joana D'Arc Ferreira Arruda – José Pinheiro.
Nasceu em 1926, filha de Protásio Ferreira da Silva e Araci Gomes Ferreira, primeira-dama da cidade (1964) e faleceu em 1967. Casada com o ex-prefeito e professor Willams de Sousa Arruda, com quem teve dois filhos.
Tereza Nicola Cavalcante - Bodocongó.
Natural da cidade de Esperança, ela chegou a Campina Grande aos 10 anos, tornando-se uma grande desportista pelo Treze Futebol Clube.
Terezinha Nogueira Arruda – Catolé.
Nasceu em 1943 em Campina Grande. Ela foi doméstica e marcou profundamente aqueles que a admiravam pelo seu jeito simples de ser.
Fonte: Livro Memorial Urbano de Campina Grande.
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