CULTURA
Livro reúne histórias por trás das gravações que marcaram o frevo
Escritor José Teles lança segundo livro sobre o ritmo, desta vez reunindo bastidores das gravações de grandes nomes do Nordeste.
Publicado em 09/02/2016 às 9:00
Foi ouvindo frevo em Campina Grande, onde nasceu, e mais tarde em Recife, para onde se mudou e mora até hoje, que o jornalista e escritor José Teles se interessou pelo ritmo, que o intrigava: “Samba era qualquer batuque de negros, o maracatu é um tipo de samba. Mas o frevo não. Surgiu só no Recife e ficou muito restrito à cidade. No Sul e Sudeste, ainda é uma música estranha”.
Teles acaba de lançar O Frevo Gravado: De 'Borboleta não é ave' a ’Passo de anjo’ (Bagaço, 305 págs.), seu segundo livro sobre o tema. O primeiro foi Frevo Rumo à Modernidade, um ensaio que tirou o primeiro lugar num concurso promovido pela Prefeitura do Recife nos 100 anos do frevo, em 2007. “Escrevo, desde 1987, artigos e matérias sobre o assunto, penso que daria um livro interessante”, afirma o autor, que pesquisa o ritmo a fundo há 15 anos.
“Tenho material para mais de um livro”, revela José Teles ao JORNAL DA PARAÍBA. “Aliás, tenho um pronto, de crônicas de viagem com a Spokfrevo Orquestra pelo exterior. Acho que deve ser publicado até abril”, acrescenta o jornalista, o principal crítico de música do Nordeste. Ele também é autor de Do Frevo ao Manguebeat.
Neste segundo livro, Teles aborda, com texto leve, didático e divertido, as histórias por trás das gravações mais conhecidas do frevo, entregando bastidores envolvendo o desenvolvimento do ritmo frente ao mercado fonográfico.
Como a contracapa imprime, a obra não tem a pretensão de ser um catálogo sobre o frevo gravado, desses que trazem data, número de série, autor e interprete. Mas as (boas) histórias sobre ele estão todas lá.
Como José Teles ensina, o frevo era a música que se tocava no carnaval de Pernambuco, mas era pouco gravado até chegar a gravadora Rozenblit, sediada em Recife. “Não que a Rozenblit tenha gravado tanto frevo assim”, pondera o autor. “Ela lançava um suplemento básico, de alguns 78 rotações, e um álbum, o Capital do Frevo, coletânea de frevos de rua e frevos-canção. Somente em 1959, para o carnaval de 1960, foi que lançou, além do catálogo habitual, dois LPs fundamentais: o Capiba 25 anos de Frevo, com música de Capiba, e O Que eu Fiz e Você Gostou, com músicas de Nelson Ferreira”.
Ambos estouram no Nordeste inteiro. Até hoje, Capiba 25 anos de Frevo pode ser encontrado nas melhores lojas do ramo. “Deve ser o recordista brasileiro, com 57 anos em catálogo”, pondera José Teles. “Estes discos também revelaram Claudionor Germano, que até então não era cantor de frevos”.
A PB no passo do frevo
O frevo é um ritmo autenticamente recifense, atesta José Teles, autor de O Frevo Gravado. “Não apenas é recifense, como é uma das poucas músicas populares no Brasil que não vem do folclore”, acrescenta o autor.
“Tampouco surgiu de ritmos trazidos da África. É um amálgama de polca, maxixe, galope e dobrado, surgido das bandas de música no final do século 19. Também não veio do povo. O repertório inicial foi composto por maestros, da camada mais humilde da população, mas gente que sabia ler e escrever música”.
Da capital pernambucana, o frevo se espalhou pelo Nordeste, alcançando Itabaiana, aqui na Paraíba, onde o jovem Severino Dias de Oliveira, o Sivuca, conheceu o ritmo. “Quando ele veio morar em Recife, como músico da Rádio Jornal do Commercio, virou um mestre no gênero”, anuncia Teles.
“Sivuca foi da Orquestra Paraguary, tocando ao lado de mestres do frevo, como Luperce Miranda, Romualdo Miranda e do paraibano Jackson do Pandeiro, que também se tornou mestre em cantar frevo. Aliás, acho que a divisão de frases complexas de Jackson acontecia porque ele cantava qualquer música como se estivesse cantando frevo”, arrisca.
A Paraíba tem história com o frevo. O pernambucano Capiba, um dos grandes nomes do ritmo, saiu de Surubim e morou em Taperoá, Campina Grande e João Pessoa até meados de 1930.
Outro autor de frevo muito prestigiado, o recifense Fernando Lobo (pai de Edu Lobo), morou muito tempo em Campina Grande, enquanto o maestro Severino Araújo, embora tenha nascido em Limoeiro, foi na Paraíba que deslanchou a carreira ao criar a famosa Orquestra Tabajara.
“Um dos principais autores de frevo, Lourival Oliveira (compositor de ‘Cocada’, ‘Corisco’ e outros frevos de rua) é paraibano de Patos”, informa Teles.
ETERNO
José Teles avalia que ao longo de 100 anos (1907-2007), o frevo colecionou um grande repertório. “Na verdade bem mais de 100 anos, já que a ‘Marcha nº1’ de ‘Vassourinhas’ foi composta no final do século 19”, ressalta. “Tem músicas que vêm tocando desde os anos 30, e foram passando de geração a geração, e entrando no sangue do pernambucano”.
Para o especialista em frevo, apesar da deturpação do Carnaval, com bandas de rock, rappers e “gente que canta música que nada tem a ver com Carnaval”, o ritmo continua forte. “Toca muito nas ruas de Olinda, no Bairro do Recife. Ele não renova muito o repertório, mas renovam-se os músicos e os foliões”, responde, lembrando que nomes como a Spok Frevo Orquestra mantém viva a chama incandescente do frevo junto às novas gerações.
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