CULTURA
'Soar diferente é evoluir'
Com grupo renovado, Nação Zumbi lança novo trabalho, que sai sete anos depois de 'Fome de Tudo' e vem cheio de canções de amor.
Publicado em 14/05/2014 às 6:00 | Atualizado em 29/01/2024 às 13:06
Exatos 20 anos depois de estrear em disco ao lado do saudoso Chico Science (1966-1997) e 7 depois de Fome de Tudo, a Nação Zumbi está de disco novo nas prateleiras, físicas e virtuais. Patrocinado pela Natura Musical, Nação Zumbi (Slap/Som Livre) mostra um grupo renovado, que abre espaço ao amor em nova sequência de onze faixas inéditas.
Se não fossem pelos integrantes - os mesmos que resolveram seguir com a banda após a morte de Chico, em 1997 -, seria um time completamente novo. Desde a estreia na Som Livre até os novos produtores – Kassin e Berna Ceppas -, o que a Nação Zumbi busca é a renovação.
“Acho um disco bem maduro, de modo geral, uma sequência do que foi, melodicamente falando, o Fome de Tudo (2007), só que bem mais assobiável, bem mais solar”, conta o vocalista Jorge DuPeixe, por telefone.
Para ele, essa maturidade é perceptível nas harmonias das canções, que investem em sintetizadores e guitarras, sem abandonar o peso dos tambores. “O disco é maduro em vários aspectos. As métricas são diferentes. A gente gosta de trazer um frescor a cada disco, soar diferente mesmo. A diferença é a evolução natural”, conceitua.
As músicas do novo Nação Zumbi (os integrantes também batizaram o disco de 2002 com o nome da banda) começaram a ser formuladas em 2011 na casa do guitarrista Lúcio Maia. Em 2012, Jorge, Lúcio, Dengue (baixo), Puppilo (bateria), Toca Ogan e Gilmar Bola 8 (percussão) entraram em estúdio para registrar o repertório, sob a produção de dois dos produtores mais requisitados do momento.
Kassin e Ceppas (que, juntos, já gravaram discos de Jorge Mautner e Autoramas) investiram numa sonoridade eletrônica vintage repleta de texturas. Também atuaram como músicos de apoio, gravando órgãos, sintetizadores e até cravos eletrônicos, e trazendo a guitarra para o primeiro plano, junto com outros instrumentos plugados.
“Isso também é o momento de maturidade”, justifica Jorge. “Você percebe que o tambor tá só num refrão, ou numa outra parte da estrofe. Isso é evolução!”, comenta a respeito da presença da percussão, que já foi mais onipresente em discos antigos. “A maneira de pensar passa pela mudança também. E o som possibilita isso, ouvir canções das mais diversas maneiras. Se você pode levar (a música) a diversos lugares, então por que ir a um lugar só?”
“As pessoas perguntam cadê o maracatu? Tá tudo ali!”, prossegue o vocalista. “Se você ouvir inteligentemente esse disco, vai ouvir as nuances, os detalhes. Ninguém ouve disco em computador! Ouvir música em computador, com aqueles fones que vêm nos smartphones, não é ouvir música. Não ouve graves, textura, sintetizador, as frequências... É preciso ouvir (o disco) num som decente”.
Ao time de músicos pernambucanos juntou-se à cantora Marisa Monte, que no ano passado contou com Lúcio, Dengue e Pupillo em sua banda. “Um dia, em São Paulo, eu fui ao camarim depois do show dela, falar com os caras, e acabei fazendo o convite: ‘Marisa, eu tenho uma ciranda que caberia na sua voz’. Ela disse: ‘Eu me amarro em cirandas, já cantei com Lia de Itamaracá!’.
Mandamos pra ela, e ela pirou”, narra Jorge sobre como ela foi parar em ‘A melhor hora da praia’, na qual divide os vocais com ele.
Nação Zumbi ainda registra outras duas participações femininas - as cantoras Lula Lyra (filha de Chico Science) e Laya Lopes - e o retorno do tecladista americano Money Mark (em ‘Defeito perfeito’), que havia tocado em Fome de Tudo e chegou ao grupo pelas mãos de Mário Caldato Jr., que novamente masterizou um álbum da banda.
'BALADAS SANGRENTAS'
Nação Zumbi 2014 está recheado de canções de amor, mas são canções de amor da Nação Zumbi, repleta de metáforas e numa pegada, como o próprio vocalista admite, inspirada no universo de Nelson Rodrigues (1912-1980). As influências, revela DuPeixe, passam por Serge Gainsbourg e as “baladas sangrentas” de Nick Cave. “Então existem maneiras e maneiras de se fazer baladas”, acrescenta.
“Romântico e romantismo são diferentes”, pondera.
“Romantismo, de certa forma, é meio obscuro, meio nelsonrodriguiano. ‘Foi de amor’ (uma das novas músicas) é mais ou menos isso: (cantarolando a letra) 'Foi de amor, droga mais que legal / Quando não mata, aleija”. 'Pegando fogo' também remete a isso, traz uma metáfora de João Cabral (de Melo Neto)”, revela o vocalista, autor de todas as letras do repertório.
Canções como 'Cicatriz’ e ‘Bala perdida’ surgem como crônicas – Jorge chegou a comparar cada faixa com capítulos de um livro: “Um livro não seria interessante se um capítulo fosse interessante e outro, não”, fala.
“Esse disco é no mesmo esquema de uma crônica, onde o amor passa um pouco disso, a ideia de contar uma historia em três minutos”, comenta. “Às vezes, (a letra) é muito metafórica! É legal deixar a critério do ouvinte do que se trata, mas a ideia é contar uma historia mesmo”, conclui.
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