ECONOMIA
Assédio contribui para endividamento
Assédio ao idoso é uma das práticas que mais contribuem para a manutenção do endividamento dos aposentados.
Publicado em 31/08/2014 às 8:00 | Atualizado em 11/03/2024 às 15:48
“Fiz uma vez só e me arrependi”, conta a aposentada Judite Guedes, 65. Conservadora nos investimentos, ela dá aulas de reforço escolar que rendem um faturamento mensal superior ao próprio benefício. Mesmo assim, emprestou o nome para o filho fazer um empréstimo. O resultado foram dois anos presa à dívida, que era descontada diretamente no valor do benefício.
“Na hora que o dinheiro chega, eu gosto de ter ele lá. Não quero ficar devendo. Tenho uma amiga que quando falta seis meses para terminar um empréstimo, ela já entra em outro para pagar o anterior e ter mais dinheiro. Isso é uma doença”, fala. A família não voltou a pedir empréstimos em seu nome, mas ela ressalta que os telefonemas de instituições financeiras oferecendo novas linhas de crédito para desconto na folha são frequentes. “Quase todo dia ligam. Hoje mesmo já ligaram”.
O assédio ao idoso é uma das práticas que mais contribuem para a manutenção do endividamento dos aposentados. Porto revela que não é raro funcionários conhecidos como “pastinhas” abordarem os idosos e pedirem insistentemente para que eles façam empréstimos. “O assédio é tão forte que muitas vezes os idosos acabam cedendo, mesmo sem ter a necessidade de um empréstimo”.
Em casos mais graves, os próprios familiares exercem coerção psicológica ou até mesmo física para que os aposentados cedam cartões de crédito ou assumam um empréstimo. De acordo com a Secretaria de Direitos Humanos (SDH) da Presidência da República, em 2013 o serviço de denúncias Disque 100 recebeu 38.976 delações, 65,7% a mais do que em 2012. Somente as queixas contra abusos financeiros somaram 16.796, ou 43% dos casos. O fato também é decorrente da dependência que muitos idosos têm de que filhos ou netos administrem suas finanças, tornando-os ainda mais vulneráveis.
“Isso é muito comum no Brasil”, sugere a economista-chefe do SPC Brasil, Marcela Kawauti. “Muita gente acaba se endividando por causa dos outros, às vezes até por vontade de agradar. Mas isso é perigoso, porque não há como controlar o que outra pessoa vai gastar”, explica. Para ela, a família deve contribuir justamente para atenuar uma situação de endividamento ou prevenir. “Esse apoio é importante. Às vezes uma pessoa economicamente ativa ganha mais”, ressalta.
Para Porto, os bancos deveriam fazer um estudo mais detalhado da capacidade financeira do tomador ao invés de conceder o crédito sem exigências, bem como esclarecer satisfatoriamente o conteúdo do contrato. “O poder público também poderia passar a oferecer cursos e programas de educação financeira voltados exclusivamente para os idosos. O consumo nos últimos anos foi fortemente estimulado, mas não houve a contrapartida da educação para o consumo”, frisa.
"Apresentar soluções que promovam a efetiva tutela, coibindo os abusos praticados em prejuízo desse grupo social, deve, ainda, ser objeto de interesse dos diversos ramos do saber humano, pois, além do merecido respeito em razão de sua existência, o idoso representa uma população em franca expansão no Brasil", conclui.
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