POLÍTICA
Ouvidor quer tolerância zero com maus policiais
Mário Júnior volta ao cargo de ouvidor depois de quatro anos.
Publicado em 18/05/2014 às 13:00
Sob o protesto do Conselho Estadual dos Direitos Humanos, o governador Ricardo Coutinho nomeou o advogado Mário Junior para o cargo de Ouvidor de Polícia. Seu nome não constava da lista tríplice enviada pelo órgão. “A contestação do Conselho Estadual sobre minha nomeação se restringe à forma da nomeação e não contra minha pessoa”, disse Mário em entrevista exclusiva ao JORNAL DA PARAÍBA. Segundo ele, a Lei nº 8.574 de 10/06/2008, que criou a Ouvidoria, não cita em nenhum momento a formação de uma lista tríplice. Na entrevista, ele revelou que cerca de 170 policiais estão envolvidos em procedimentos dentro da Ouvidoria.
JORNAL DA PARAÍBA - O papel da polícia é reprimir a violência e investigar crimes, mas sabemos que, como em todos os meios, há policiais corruptos, alguns, inclusive, ficam no mesmo patamar dos bandidos. Exemplo disso foi a operação Squadre, através da qual foram presos policiais civis e militares suspeitos de participação em grupos de extermínio. Como o senhor analisa essa situação? Como confiar em uma polícia com esse histórico?
ENTREVISTADO - Fui ouvidor de 2009 a 2010, onde fiz denúncia de grupos de extermínio no Estado da Paraíba, uma herança que já existia de muitos anos, exemplo do caso Paulo Brandão. A gente não está numa ilha, vivemos em um contexto mundial que as polícias da Inglaterra, a polícia do Haiti têm práticas deste tipo, umas mais e outras menos. Estamos trabalhando com tolerância zero, mas para isso necessitamos que a população denuncie. A Operação Squadre deu início depois dessas denúncias de 2009, onde o então secretário Gustavo Ferraz Gominho abriu inquérito que, na época, pelos meios de comunicação, já diziam que tinha de coronel a soldado envolvidos nesta prática. Hoje temos uma polícia técnica, qualificada, gerenciada, vigiada, rastreada e rigorosamente operada em todos os fatos que envolvam o nome polícia. Isso não evita que existam maus policiais. A Ouvidoria existe para ouvir da sociedade o clamor das injustiças, do serviço mal prestado, do abuso de autoridade e poder encaminhar e cobrar das autoridades uma resposta para o povo.
JP - A sua nomeação para o cargo de ouvidor não foi bem aceita pelos membros do Conselho Estadual dos Direitos Humanos. Como está hoje a sua relação com o órgão?
ENTREVISTADO - A contestação do Conselho Estadual sobre minha nomeação se restringe à forma da nomeação e não contra minha pessoa. Porém, quero lembrar e ressaltar que a Lei nº 8.574 de 10/06/2008 não cita em nenhum momento a lista tríplice. Em relação ao Conselho Estadual e qualquer outra entidade da sociedade civil organizada, esta Ouvidoria encontra-se de portas abertas para receber denúncias, parcerias e caminhar juntos em prol de uma Paraíba unida pela paz.
JP - A ouvidora anterior, Valdênia Paulino, criticou a falta de apoio por parte do governo do Estado para o bom funcionamento da Ouvidoria de Polícia. Segundo ela, o órgão atualmente não tem carro e o celular foi retirado. O senhor confirma essa situação?
ENTREVISTADO - Se ela prestou essa informação, ela prestou equivocadamente, haja vista que a Ouvidoria sempre possuiu carro e telefone celular, e sempre contou e conta com o apoio do secretário Cláudio Lima e do governador Ricardo Coutinho.
JP - Como o senhor pretende acompanhar as denúncias de excessos cometidos pelos policiais? (Há relatos de situações de policiais que chegam nas comunidades invadindo casas, destratando as pessoas, etc).
ENTREVISTADO - A forma como este ouvidor vai tratar essas denúncias será como sempre tratei, de forma técnica, usando os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Sobre maus-tratos e excessos, essa prática existe desde a Scotland Yard, considerada a melhor polícia do mundo, podendo citar o exemplo do brasileiro Jean Charles, que morreu de forma truculenta por aquela polícia. Porém, essa Ouvidoria vai trabalhar incessantemente com a tolerância zero de abusos praticados por policiais. Esse é o meu compromisso.
JP - O senhor está preparado para as possíveis ameaças que pode receber? Por que aceitou o cargo? Não tem medo?
ENTREVISTADO - Eu me disponibilizei para o cargo sabendo de todos os desafios. O cargo já exerci, e nunca tive ameaças. Se um dia as tiver ,pensarei como agir.
JP - Como o senhor analisa a relação entre as polícias e a Justiça?
ENTREVISTADO - Existe um fato interessante entre a polícia e a Justiça. Muitos jovens advogados exerceram cargos dentro do Judiciário, não só no Ministério Público e no Tribunal de Justiça, mas como advogados. Isso facilitou um elo maior entre o Judiciário e a polícia. Posso garantir que essa relação nunca esteve tão bem. E a prova é o índice de prisões ocorridas nos últimos tempos no nosso Estado. Exemplo da Delegacia de Entorpecentes e a de Homicídios.
JP - A polícia trata o bandido pobre de determinada forma, mas por outro lado concede alguns privilégios ao bandido rico. É possível mudar essa realidade e ter um tratamento isonômico?
ENTREVISTADO - Claro que sim, há um princípio constitucional - o da isonomia - que está embutido não só neste ouvidor, como no corregedor-geral Aristóteles, e também no secretário de Estado Cláudio Lima. Estaremos vigilantes a todos esses aspectos. A sociedade pode nos ajudar denunciando.
JP - O senhor admite que muitos policiais torturam para arrancar confissões de suspeitos?
ENTREVISTADO - Se um caso desse tipo chegar na Ouvidoria, pedimos o exame de corpo delito através da nossa delegada, encaminhamos também ao secretário, e, de imediato, através da Corregedoria-Geral, abrimos procedimento para investigar toda sua extensão.
JP - A população tem conhecimento do papel da Ouvidoria? Como melhorar essa relação?
ENTREVISTADO - A população a cada dia que passa fica sabendo através dos seus pares da existência e do trabalho que a Ouvidoria vem fazendo para a sociedade, aumentando a sua credibilidade, que por sua vez vai aumentar o conhecimento da existência da Ouvidoria. Já conversamos sobre esse aspecto com o secretário Cláudio Lima e afinamos algumas estratégias para divulgar a Ouvidoria.
JP - Quantos policiais estão sendo investigados atualmente e quantos estão afastados de suas atividades por condutas irregulares?
ENTREVISTADO - Cerca de 170 policiais de todo o Estado estão envolvidos em procedimentos dentro da Ouvidoria. E aí você me pergunta: como assim? O procedimento é desde a queixa até uma resposta concreta dada à parte denunciante do encaminhamento. Estamos colocando esses processos em dia, colhendo informações e remetendo as respostas de denúncias identificadas através de carta registrada.
JP - Quais as denúncias mais frequentes recebidas pela ouvidoria?
ENTREVISTADO - Em geral é uma mescla entre abuso de autoridade e abordagens truculentas, que por mais que haja treinamentos e cobranças dos comandantes das unidades, alguns indivíduos pontualmente as cometem. Porém, nunca, em momento algum, deixamos de apurar toda e qualquer queixa.
JP - Qual a principal carência da polícia da Paraíba atualmente?
ENTREVISTADO - O programa Paraíba Unida pela Paz, que trabalha sob a ótica da integração das polícias, tem o objetivo de enxergar o projeto de segurança como um todo e não como ilhas, como acontece em vários Estados do Brasil. O que significa pensar segurança de forma estratégica, com foco conjunto na redução da criminalidade e também pensar nos problemas, nos gargalhos e buscar soluções no que precisa ser corrigido. A Paraíba hoje tem trabalhado nesse sentido.
JP - Como dizer a um policial que ele não deve fazer 'bicos' para aumentar a renda, se o salário que ele recebe não dá condições de ter uma vida confortável com a família? Como é lidar com essa questão?
ENTREVISTADO - Hoje, no nosso Estado, existem dois tipos de escalas para os policiais: plantonista e de expediente. Ou seja, quando os policiais podem, eles fazem seus plantões, recebendo assim seus extras. Vale ressaltar que são bem remunerados. Os demais, se você conhece, me informe para que eu tome as providências cabíveis.
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