COTIDIANO
Violência deixa carteiros com medo de trabalhar
Assaltos, agressões físicas e até ameaça de morte estão na 'rotina' desses profissionais
Publicado em 22/02/2015 às 8:00 | Atualizado em 21/02/2024 às 16:15
“Dois adolescentes em uma motocicleta cinquentinha se aproximaram, muito agressivos, e colocaram o veículo por cima de mim e com uma arma me ameaçaram e levaram meu celular. Por pouco não aconteceu o pior. É revoltante”. A declaração é de um carteiro que preferiu manter a identidade em sigilo por temer represálias. A experiência desse profissional já foi vivida por outros da mesma categoria na Paraíba. O Sindicato dos Trabalhadores dos Correios na Paraíba (Sintect-PB) denuncia as violências contra os carteiros.
Para preservar a verdadeira identidade do carteiro que foi vítima de assalto, usaremos o nome fictício 'João'. Ele, que trabalha em João Pessoa, lembrou com revolta o dia em que viu a morte passar à sua frente. “Eu estava entregando as correspondências próximo à avenida Minas Gerais, no bairro dos Estados, quando percebi a moto se aproximando com os suspeitos e arma em punho, mas eu não tinha o que fazer, nem para onde correr”, relatou o crime ocorrido em novembro passado.
“A gente fica à mercê da violência, se sente impotente diante dessa realidade. Na hora só pensei na família e em minha esposa, que poderia ficar desamparada, dependendo do que poderia acontecer comigo. Deus me livrou do pior, mas fiquei com trauma e sempre que estou em uma rua sem movimento e ouço o barulho de uma moto, tudo me volta à memória, como se fosse um filme ruim”, completou.
Outro carteiro, 'José' (nome fictício), também já viu a morte à sua frente nas ruas da capital. Era uma manhã de dezembro do ano passado, quando ele pegou a mochila, cheia de correspondências, na unidade operacional que está lotado e saiu para fazer as entregas, como um dia normal. Não sabia José que sua rotina seria quebrada por dois moradores de uma casa, que se queixaram da demora da entrega.
“Já havia deixado algumas correspondências, mas quando ia colocar a entrega em uma certa casa, dois homens, moradores da casa, saíram do imóvel falando alto e me xingando. Temi o pior e não esbocei reação alguma. Apenas entreguei as correspondências e saí andando para continuar meu trabalho, foi quando senti um tapa nas costas, seguidos da pergunta: 'Ei, mané. Está tirando a gente de otário? Estou falando com você!', pensei que ali seria o meu fim”, detalhou.
José disse que só pedia a Deus para sair dali vivo, para não deixar os três filhos sem pai. “Eu simplesmente me virei, pedi desculpa e falei que precisava fazer o restante das entregas. Os dois homens, me agrediram verbalmente, de todo tipo de nome, e ainda me empurraram, mas em pouco tempo, consegui sair. Não tive condições de continuar meu trabalho e voltei para unidade muito nervoso”, ressaltou.
Os dois carteiros, João e José, são só exemplos dos profissionais que correm risco diariamente durante a execução do trabalho. Muitos já tiveram objetos pessoais roubados, como celular, carteira e joias, outros tiveram o carro da entrega dos Correios levado por bandidos, mas ameaças, inclusive de morte, não estão fora da lista de violências cometidas contra os carteiros na Paraíba. Para a categoria, o investimento em segurança pública deve ser realizado, para evitar ocorrências desse tipo, já que as situações acontecem em diversos bairros de João Pessoa.
Segundo o diretor do Sindicato dos Trabalhadores dos Correios na Paraíba (Sintect-PB), Husman Tavares, além dos assaltos aos bens pessoais dos carteiros, estes também são vítimas de crimes contra o patrimônio dos usuários dos serviços, devido às entregas de mercadorias de valor, como celular, tablet, notebook, entre outros eletrônicos, cada vez mais frequentes.
Husman contou que os crimes não têm local nem horários para acontecer e que todos os profissionais da categoria estão sujeitos a serem vítimas dos criminosos por conta da insegurança, mas ele ressalta que a contratação de uma empresa especializada em segurança vai de encontro ao que o sindicato defende. “A violência está aí, mas se sugeríssemos a contratação de uma empresa de segurança para fazer uma escolta dos carteiros quando houvesse entregas, estaríamos apoiando a terceirização dos serviços e nós somos contra isso. Enquanto não se toma providências a respeito, as mercadorias e os carros de entrega são roubados e os carteiros vitimados pela criminalidade”, frisou.
De acordo com o presidente do Sintect-PB, o atraso de entregas também tem sido motivo para os carteiros sofrerem algum tipo de violência. “Já tivemos um caso de um carteiro que precisou ser transferido para outra Região do Estado porque recebeu ameaça de morte. O cidadão cobrava a entrega da correspondência e por estar em direto contato com a população, o carteiro acaba sofrendo todo tipo de reclamação e nele é descontado toda revolta dos usuários dos Correios, quando na verdade, o problema está mais em cima, na falta de efetivo”, observou.
O Sintect-PB não tem contabilizado o número de ocorrências contra carteiros e carros de entrega, mas garante que os casos são cada vez mais frequentes.
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