TRF nega pedido de novo julgamento para absolvidos no caso Manoel Mattos

Solicitação foi feita pelo MPF sob o argumento de que existem provas suficientes contra eles.

Em decisão unânime, a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) negou, nesta quinta-feira (10), às apelações do Ministério Público Federal (MPF) e da defesa dos acusados pelo assassinato do advogado e ativista dos direitos humanos Manoel Mattos. Ele foi morto em janeiro de 2009, na praia de Pitimbu, Litoral paraibano. As partes apelaram contra sentença da 36ª Vara Federal de Pernambuco que, após júri popular realizado em abril de 2015, condenou José da Silva Martins e Flávio Inácio Pereira pelo crime, e absolveu outros três réus. O MPF queria que os absolvidos fossem submetidos a um novo julgamento.

Os advogados de José da Silva Martins e Flávio Inácio Pereira pediram a anulação da sentença porque, segundo eles, houve violação de diversos artigos do Código de Processo Penal (CPP). Eles sustentaram, entre outros argumentos, que a relação dos jurados só foi publicada um mês antes do julgamento e que suas respectivas profissões só foram conhecidas na hora do júri. Além disso, questionaram a dosimetria da pena, pedindo uma reforma na aplicação da pena-base para o mínimo legal. Mas nenhum dos argumentos foi acolhido pela Turma. De acordo com o desembargador federal Fernando Braga, relator do processo, a magistrada do primeiro grau obedeceu ao devido processo legal.

“O assassinato representou não apenas a morte de alguém, mas uma grave violação material aos Direitos Humanos. As circunstâncias da culpabilidade, dos maus antecedentes e das consequências do crime revelam-se suficientes a manter a exasperação da pena-base realizada pelo Juízo de primeiro grau”, afirmou o relator, em seu voto. 

Com isso, foram mantidas as penas de 26 e 25 anos, respectivamente, para o sargento reformado da Polícia Militar da Paraíba Flávio Inácio Pereira (considerado o mentor do crime) e José da Silva Martins (autor dos disparos). Ambos estão presos em regime fechado por homicídio duplamente qualificado com dois agravantes (motivo torpe e sem chances de defesa da vítima). Após o julgamento desta quinta-feira, os advogados Harley Cordeiro e Adailton Raulino informaram que vão interpor recurso especial junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Acusação

O MPF requereu que fosse anulado o julgamento realizado pelo Conselho de Sentença, quanto à absolvição de Cláudio Roberto Borges e José Nilson Borges, para submetê-los a novo julgamento. De acordo com a procuradora da República Isabel Guimarães, foi proferida decisão manifestamente contrária à prova dos autos, porquanto existem provas de que José Nilson Borges foi responsável pelo fornecimento da arma usada no crime e que Cláudio Roberto Borges foi um dos mandantes do crime, tendo participado de uma reunião, na véspera do delito.

O desembargador federal Fernando Braga ressaltou que a própria acusação optou pela prova de menor qualidade, consistindo estas, em sua maior parte, em "testemunhos documentados" que alicerçaram a acusação, deixando de produzir, por outro lado, a prova testemunhal na sessão de julgamento, impedindo que os jurados tivessem contato direto com as testemunhas, o que fragilizou sua credibilidade.

Ao rejeitar os pedidos do MPF, Braga destacou o princípio da soberania do veredicto do Júri Popular, inscrito no inciso 38 do artigo 5º da Constituição Federal. “Assim, é porque não se pode considerar afastada a possibilidade dos jurados não terem atribuído (tanta) credibilidade à prova que a acusação produziu, o que já impede que se conclua que a absolvição está (completamente) dissociada do conjunto probatório ou que a decisão dos jurados é manifestamente contrária à prova dos autos. Neste sentido, havendo duas versões acerca dos fatos e estando elas sustentadas – ainda que minimamente – nas provas dos autos, deve prevalecer a soberania do veredicto do corpo de jurados”.

Relembre o caso

O advogado Manoel Bezerra de Mattos Neto foi morto a tiros de espingarda calibre 12 quando estava em uma casa de praia, em Pitimbu (PB), em 24 de janeiro de 2009. Mattos integrava a Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil em Pernambuco (OAB-PE) e ficou conhecido por denunciar grupos de extermínio, com a participação de policiais militares e civis, na divisa entre Paraíba e Pernambuco, região denominada como "Fronteira do Medo". 

Em outubro de 2010, o julgamento do crime foi federalizado sob o fundamento da existência de grave violação aos Direitos Humanos. O processo tramitava na Justiça Estadual da Paraíba, mas foi transferido para a 2ª Vara Federal da Seção Judiciária da Paraíba. Depois, a pedido dos familiares da vítima e por razões de ordem pública, o TRF5 determinou o desaforamento (transferência de jurisdição) para a Justiça Federal de Pernambuco. Este foi o primeiro caso de Incidente de Deslocamento de Competência (IDC) julgado no Brasil pelo STJ.