Zeca Baleiro faz releitura da obra de Zé Ramalho em novo trabalho

Maranhense conta ao JORNAL DA PARAÍBA como recriou o universo particular do homenageado em um show lírico.

Zé Ramalho já cantou Luiz Gonzaga, Raul Seixas, Beatles e Bob Dylan. Agora chegou a vez de ser “cantado”. Coube a Zeca Baleiro trazer para seu jeito cool, o universo particular do trovador paraibano ao recriar 20 canções “ramalheanas”, distribuídas em um DVD, com o registro integral dos 20 números (sendo 17 no show principal, e os outros três nos extras). Zeca Baleiro Canta Zé Ramalho – Chão de Giz (Som Livre, de 24,90 a R$ 29,90) também sai em CD, com 14 músicas desse repertório.

O show surgiu através do projeto BB Covers, do Banco do Brasil. O convite de Monique Gardenberg, curadora do projeto e diretora do DVD, foi direto: você topa cantar Zé Ramalho? “Ainda discutimos sobre alguns nomes que também gosto, como Walter Franco, Martinho da Vila, Tom Zé, Sergio Sampaio, Belchior etc. Mas gostei muito do nome do Zé, porque conheço sua obra profundamente. O cara é um autor incrível! Me senti desafiado a reler sua música do meu jeito, com liberdade, reverência e uma dose de veneno também, claro (risos). É uma obra rica, poética, enigmática e intensa”, sintetiza Zeca, em entrevista ao JORNAL DA PARAÍBA.

Segundo ele, Zé Ramalho integra o rol de artistas nordestinos da safra 70 que influenciaram o músico maranhense. “O início da carreira do Zé foi arrasador e coincidiu com o momento em que eu começava a aprender violão, a me interessar mais por música, a tirar canções no instrumento etc.”, explica, admitindo Zé não foi o único paraibano a participar dessa formação, mas também Vital Farias e Cátia de França, além de Belchior, Fagner, Ednardo, Geraldo Azevedo, Alceu Valença, Lula Côrtes etc.
A relação de admiração já rendeu frutos. Juntos, Zé Ramalho e Zeca Baleiro já escreveram uma música, ‘O rei do rock’, que o paraibano gravou em Parceria dos Viajantes (2007) e Zeca retomou neste ao vivo. A letra foi escrita por este, que diz ter se inspirado na persona artística do paraibano – “Esse misto de caubói, profeta, justiceiro, visionário”, detalha o parceiro.

“Ele musicou e gravou (a canção) numa onda meio ‘rock cigano’. Mas refiz o arranjo e o rock ganhou uma pitada de rap”, explica Zeca Baleiro, que guarda uma segunda parceria com o ídolo, ainda inédita: ‘Repente cruel’, que da mesma forma, traz letra de Zeca e música de Zé Ramalho. “Um dia pretendo gravá-la”, avisa.

No show gravado em 24 de maio do ano passado no teatro Castro Alves, em Salvador (e ainda inédito na Paraíba), Zeca Baleiro trata a música de Zé Ramalho com deferência e lirismo, mais pelo caminho aberto por Líricas (2000) do que por Vô Imbolá (1999), que tem roupagem urbana, moderna e pop.
“Tinha que achar um bom caminho, e esse viés do lirismo aconteceu”, explica Zeca, sobre a direção musical do trabalho. “Sobre os arranjos, pensei: não posso mexer nos arranjos a ponto de descaracterizar as músicas completamente. Acho que é necessário um pouco de ‘sabedoria’ pra fazer um bom cover, um meio passo entre a reverência ao homenageado e um pouco de ‘personalismo’. Quanto ao canto, tentei me afastar o máximo da dicção profética do Zé, e cantar do meu jeito, naturalmente”.

‘Ave de prata’, que Zé gravou em A Terceira Lâmina (1981), dois anos depois de Elba Ramalho lançá-la em seu disco de estreia, com muito sucesso, abre o repertório. É a música que Zeca Baleiro anuncia à reportagem como sendo sua favorita. Para ele, a que melhor define o parceiro paraibano e seu legado é ‘Avôhai’.

O repertório traz os sucessos mais estrondosos de Zé Ramalho (‘Chão de giz’, ‘Garoto de aluguel’, ‘Taxi lunar’, ‘Admirável gado novo’), mas também abre espaço para canções “lado B”, como ‘Desejo de mouro’ (colada a ‘Kamikaze’ em um potpourri), ‘Um pequeno xote’ e ‘A dança das borboletas’, que lançada no homônimo Zé Ramalho (1978), alçoou voo em 2003, quando saiu a regravação de Zé com a banda Sepultura para o filme Lisbela e o Prisioneiro.

“Eu tive toda a liberdade na escolha do repertório, mas acho que tinha que contemplar seus sucessos, isso me parece óbvio, do mesmo modo como fazer um show só com os hits também seria tedioso e acomodado”, pontua Zeca, antes de ponderar: “Considero um bom retrato da trajetória do Zé. Naturalmente, canções incríveis como ‘Meninas de Albarã’ e ‘Galope rasante’ ficaram de fora. Mas algo teria de ficar (risos)”.

Quase ficam de fora ‘Pelo vinho e pelo pão’, ‘Entre a serpente e a estrela’ e ‘Frevo mulher’ – mas as três podem ser vistas nos extras do DVD, assim como o clipe de ‘Garoto de aluguel’, que rola no telão durante o show.