Caboclos ou Caretas da Semana Santa: tradição cultural é registrada no Sertão da PB

Grupos de indivíduos utilizando máscaras e cobertos com palhas ou tecidos saem às ruas pedindo doações, os jejuns.

Foto: Divulgação/Caboclos da Serra

Todos os anos, os caboclos ou caretas da Semana Santa saem às ruas no Sertão paraibano. Indivíduos com máscaras assustadoras, cobertos com palhas ou roupas coloridas pedem doações, os “jejuns”. Em Vieirópolis, na região de Sousa, o grupo ‘Caboclos da Serra’ busca manter viva a tradição.

Sandro Régis é formado em teatro pela UFPB e integrante do grupo ‘Caboclos da Serra’ e desfila pelo segundo ano. Além disso, ele escolheu como tema de seu trabalho de conclusão de curso registrar a tradição na cidade de Vieirópolis e em Major Sales, no Rio Grande do Norte. Contudo, a relação de Sandro com os caboclos é bem mais antiga. Ele conta que desde criança costumava acompanhar o cortejo dos caboclos.

“Nossos pais, avós, tios já brincavam de caboclos. Uma coisa passada de pai para filho, de avô para neto. Não é uma turma formada para sempre. Tem ano que o caboclo brinca, tem ano que não queria brincar”, explica.

Além de Vieirópolis, há registros em cidades da Paraíba como Cajazeiras, Sousa, São José de Piranhas, Conceição, Itaporanga, Catolé do Rocha, entre outras, com nomes que podem variar. Em Cajazeiras, por exemplo, os brincantes são conhecidos como Judas ou Caretas. Fora do estado, há registros da tradição no Cariri do Ceará,  Segipe, Rio Grande do Norte e Bahia.

Origem

Em sua pesquisa, Sandro Régis encontrou relatos da presença dos caretas desde o começo do século XX. Ele explica que além da brincadeira e intuito de animar a população, os grupos eram motivados pela necessidade e falta de alimentos.

“Tem registros desde o começo do século XX, dos anos 1900, que existe essa manifestação. Por questão também de dificuldade financeira, era uma forma de sair brincando, mascarado, fazendo a alegria do povo para arrecadar o alimento da semana santa”.

Após dias recolhendo os alimentos, na Sexta-feira da Paixão ou no Sábado de Aleluia, os caboclos ou caretas dividem os alimentos entre si ou entre a população. Há também a malhação do Judas, que consiste em bater ou derrubar um boneco, feito de pano, representando o apóstolo que traiu Jesus Cristo.

Em Vieirópolis, Sandro conta que durante algum tempo o costume era colocar o boneco do Judas no topo de um cabo grande, e a população tentava derrubá-lo atirando com arma de fogo. Quem conseguisse derrubar o boneco, ganhava boa parte dos alimentos arrecadados. A tradição mudou nas últimas décadas, levando em conta a segurança de todos os envolvidos.

Identidades secretas

Caretas da semana santa
Caretas saem às duas de Cajazeiras, em 2022.
Foto: Renata Lobo/Arquivo pessoal

Durante o desfile dos caboclos, a identidade deles não pode ser revelada. Para isso, além das máscaras, mudam até o tom de voz. Vez ou outra, algum corajoso tenta puxar as máscaras dos caretas, arriscando ser atingido por um chicote ou belota, nome dado a um instrumento que eles carregam, feito de ligas, pedras e sacos, revestido por uma meia em forma de bola e amarrado por um cordão a um bastão.

As roupas podem ser feitas de tiras de tecido, palhas ou sacos de estopa. Já para receber doações em dinheiro, os caboclos carregam latas vazias ou cabaças de coco. Os desfiles são acompanhados por chocalhos de vacas e instrumentos como triângulos. Além do barulho da população curiosa e das criancinhas chorando, divididas entre o medo e a curiosidade pela expressão popular que continua viva ano após ano.

O grupo Caboclos da Serra, por exemplo, é uma das atrações da Virada Cultural de Sousa, e se apresenta neste sábado (16), às 8h, na Feira do Guanabara.